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lisboadiagrisPortugal - JVC / DL - Um relato do português Júlio Vaz de Carvalho para publicação pelo Diário Liberdade


Poderia ser qualquer um...

Serpenteia com os olhos pelos desenhos da calçada em que caminha nesta Lisboa que, cada vez mais, lhe é madrasta, que o fustiga com uma fria chuva, miudinha e que o amarelado das luzes da rua teima em despejar sobre a sua indiferença. Pensa nos dias que viveu e o balanço tarda em ser conclusivo. É tudo uma merda. O futuro fecha-se a cada esquina que dobra com a esperança de ver o caminho novo pelo que anseia. Tudo ruiu como um castelo de cartas em tão pouco tempo!... Anos de sonhos e anseios, de espectativas e planos com os que foi construindo as bases renovadas a cada dia, a cada hora, a cada minuto. Trilhou sonhos acordado, enquanto lhe foi permitido sonhar, planeou futuros enquanto o presente lhe permitiu e agora... agora, chegou a uma das piores encruzilhadas que poderia ter encontrado na sua vida. Agora o escuro breu da incerteza abate-se sobre o seu horizonte e não consegue vislumbrar o rumo certo para retomar o caminho, rumo a bom porto. O que deseja no imediato mistura-se numa amálgama de medos e dúvidas com as incertezas e a indiferença com que os "amanhãs" se manifestam perante aqueles que se perderam quando julgavam estar no caminho certo... e o que é o caminho certo?

Falta-lhe o Amor... e Amar. Amor e Amar, não só como simples palavras, mas como sentimentos profundos, reais genuínos, verdadeiros. À falta de quem o partilhe consigo resta a angústia da solidão que sente quando parte para longe daqueles, poucos, que talvez o compreendam ou então estejam incondicionalmente, sempre a seu lado, porque sabem que ele faria o mesmo. Pequeno tesouro que tem e relembra porque preza a Amizade, as recordações que cimentaram nobres valores de solidariedade, amizade, fraternidade e lealdade. E não é preciso partir para longe. Sente essa solidão quando acorda pela manhã, no regresso do turbilhão infernal em que se transformaram os seus sonhos, ou à noite, quando luta contra os suplícos das insónias acumuladas anos a fio.

Não se gosta de alguém só por gostar. Um misto de empatia, tantas vezes inexplicável, a partilha de viveres e experiência, levam-no a sentir a necessidade permanente de interacção com aqueles que, tantas vezes por um acaso (ou talvez não), um dia se cruzaram na sua vida; são eles que o ensinam a ter Amor por si próprio e por isso sobrevive, tenta erguer a cabeça perante as adversidades que o assaltam em vagas constantes, a um ritmo constante e frenético. Sente tantas vezes o Mundo contra si. A cada vitória, sucedem-se incontáveis recuos; a cada avanço, um retrocesso. As portas das soluções trancam-se mesmo antes de poder espreitar essas soluções. As espectativas passam rapidamente a ilusões... parece que todos fogem de dele, como se um proscrito fosse, como um leproso que entra num local público. Parece-lhe tantas vezes que o olham com pena ou então que o evitam porque transporta a sina da infelicidade. E ele que sempre tentou fazer felizes tudo e todos à sua volta!... mas falhou tantas vezes!...

Continua a caminhada. Pela enésima vez olha o visor do telefone que permanece escuro... não há mensagem... a resposta tarda... Raios, como pode querer respostas se não fez perguntas, ou se as fez, não foram as perguntas certas... só lançou lamentos disfarçados de poesia entrecortados com larachas e lugares-comuns. Falta-lhe a coragem, tantas vezes, para ser directo, para usar de objectividade e quase sempre, por essa razão, mais tem perdido que alcançado. Medos do outro lado do éter como os que ele sente dentro de si?... Como ansiava que os seus medos, os seus desejos se entrecruzassem e os partilhsse com o outro lado da linha, fazendo a purga desses medos e receios e deixar que comungassem ambos os desejos fazendo deles um só querer, uma só certeza.

Continua a errar pelo serpenteado da calçada, ora branca, ora negra, às vezes cinzenta, pontilhada de falhas. Olha para ela e revê um mapa do que pode ser uma vida. Momentos brancos, luminosos, claros e belos, entrecortados com momentos de escuridão que se sucedem entre os cinzentos das encruzilhadas. Sente-se nesse cinzento, quase indefinido, onde a imperceptibilidade é raínha, toldando-se-lhe a vontade. Os transeuntes, alguns tantos iguais a ele, partilham os seus olhares com a chuva e a calçada. Olham-no de soslaio, por cima do ombro, quando se cruzam com ele, naquele vegetar de passos errantes, com olhares de medo, indignação, terror, tristeza... solidão. Como pode haver tanta solidão no frenesim que é esta cidade à noite!? Não há almas gémeas que se entrecruzam nestes caminhares erráticos, sem rumo certo, neste andar, só por andar, como se ao fazê-lo esperem encontrar algo, alguém que desconheçam, os "quês", quem, como e porquê. Só andam, sozinhos, perdidos, à procura do que talvez não saibam, perante solitários errantes.

Sente-se um entre os seus pares. Poderias ser tu... Poderia ser, qualquer um de nós...

...continua só...

JVC

Foto do Diário Liberdade - Lisboa num dia gris.


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