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Amy Goodman

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Democracy now!

EUA: É hora de pôr fim à epidemia de abusos sexuais nas forças armadas

Amy Goodman - Publicado: Segunda, 27 Mai 2013 15:25

O problema da violação esteve esta semana* no centro do debate, depois do dramático resgate de três mulheres que tinham passado quase dez anos encerradas numa casa localizada numa tranquila rua de Cleveland.


O suspeito, Ariel Castro, foi acusado de sequestro e violação. Esta terrível história comoveu o país, e é fundamental que se leve a cabo uma investigação exaustiva e se condene os culpados.
 
Também nesta semana, o Pentágono publicou um novo relatório sobre violação e abuso sexual nas forças armadas dos Estados Unidos. Os resultados são chocantes. Segundo os últimos dados disponíveis, são cometidos cerca de 70 abusos sexuais por dia nas forças armadas dos Estados Unidos, o que equivale a 26.000 por ano. O número de denúncias de casos de abuso sexual em 2012 foi de mais de 3.374. Desse montante, apenas 190 casos foram submetidos a conselho de guerra.
 
Há uma crescente epidemia de violações e agressões sexuais nas forças armadas dos Estados Unidos, perpetradas contra mulheres e homens, praticamente com absoluta impunidade.
 
A situação estourou esta semana quando o próprio diretor da Unidade de Prevenção de Abusos Sexuais da Força Aérea dos Estados Unidos foi preso por abuso sexual. O Tenente Coronel Jeff Krusinksi, de 41 anos, foi acusado de ter abusado sexualmente de uma mulher num estacionamento em frente a um clube nudista em Arlington, Virginia. A notícia surgiu após um caso recente em que um alto comando militar anulou a condenação por abuso sexual ditada por um conselho de guerra contra um oficial, que estava sob seu comando. O Tenente Coronel James Wilkerson foi acusado de abusar sexualmente de Kimberly Hanks na Base Aérea de Aviano em Itália. Foi considerado culpado por um tribunal militar, condenado a um ano de prisão e destituído das forças armadas. O Tenente Geral Craig Franklin anulou a condenação. O que mais indigna é que Wilkerson foi transferido para a base da Força Aérea em Tucson, Arizona, onde vivem muitos familiares de Hank. Acompanhados de cerca de 50 pessoas, os familiares da vítima esperaram-no em frente à base para protestar contra a anulação da sua condenação e contra a sua transferência para aquela localidade. Exigem que se restitua a sentença pela qual foi condenado e que seja destituído das forças armadas, e que Franklin seja despedido.
O Presidente Obama falou a respeito da epidemia de violações numa conferência de imprensa realizada esta semana: “A conclusão é que não toleraremos este tipo de comportamento. Comuniquei ao Secretário de Defesa. Vamos comunicá-la novamente a todos os funcionários de toda a cadeia de comando e espero que haja sanções. Não quero que haja mais discursos e programas de sensibilização ou de capacitação, e que, em definitivo, os responsáveis assumam a responsabilidade. Se descobrirmos que alguém está envolvido em atos deste tipo, será responsabilizado. Será processado, destituído do cargo, submetido a conselho de guerra, despedido ou afastado das forças armadas por conduta desonrosa. Ponto. Não é aceitável”.
 
Anu Bhagwati é uma ex capitã do Corpo de Marines dos Estados Unidos que esteve em atividade de 1999 a 2004. Atualmente é a diretora executiva e cofundadora da Rede de Ação de Mulheres das Forças Armadas (SWAN, na sigla em inglês). A organização luta por erradicar a discriminação, os maus tratos e os abusos da cultura militar e por melhorar as compensações das veteranas de guerra que sofreram abusos. Bhagwati declarou numa audiência do Senado no mês de março: “A violência sexual nas forças armadas é um tema que me toca muito de perto. Durante os cinco anos em que fui oficial de marinha sofri discriminação e assédio sexual diariamente. Estive exposta a uma cultura extremamente sexista, em que pululavam as graçolas sobre violações, a pornografia e a exploração sexual de mulheres e raparigas, tanto nos Estados Unidos como no estrangeiro”.
Ela conta-me o que aconteceu quando apresentou queixa contra outro oficial, o que determinou o fim da carreira militar de Bhagwati: “O oficial que estava no comando deu-me a ordem de não falar do tema e emitiram uma ordem de proteção militar para o oficial em questão. Vivia com temor das represálias e de sofrer violência tanto por parte do meu agressor, como da minha própria cadeia de comando. Depois observei horrorizada como não só promoveram o meu agressor, como além disse o puseram ao comando da minha companhia”.
 
Anu Bhagwati explicou-me que o tipo de procedimento judicial que as forças armadas estabelecem para estes casos implica um conflito de interesses que compromete a possibilidade de haver condenações: “Os oficiais que estão no comando controlam o julgamento de princípio a fim. Determinam se o caso avança ou não, se o arguido passará por um conselho de guerra ou não. É ali que ocorre grande parte da intimidação. É ali onde muitas vítimas sentem medo. Não recebem apoio, nem podem acompanhar os seus próprios casos”.
 
Para além da mobilização da SWAN e de outros grupos, a campanha para pôr fim ao abuso sexual nas forças armadas dos Estados Unidos atraiu grande atenção da bancada feminina do Congresso dos Estados Unidos, que atualmente é a mais numerosa da história. A congressista democrata da Califórnia Jackie Speier encabeçou esta luta na Câmara de Representantes desde há muito tempo. O Comité de Serviços Armados do Senado tem agora sete mulheres, um número histórico. Esta semana, numa audiência do comité, a senadora democrata de Nova York Kirsten Gillibrand interrogou de forma persistente o Secretário da Força Aérea Michael Donley e o Chefe do Estado Maior da Força Aérea, General Mark Welsh. Juntamente com Gillibrand estava a senadora democrata de Missouri Claire McCaskill, que conseguiu adiar a confirmação da Tenente General Susan Helms como vice-comandante do Comando Espacial da Força Aérea, porque Helms anulou o processo ao capitão da Força Aérea Vandenberg por acusação de abuso sexual.
 
A atenção pública centrou-se, com razão, nos terríveis crimes de Cleveland. É hora da epidemia de violações e abusos sexuais nas forças armadas também ter a atenção que merece, especialmente porque se trata de um problema institucional. Em cada dia são cometidos 70 abusos sexuais contra mulheres e homens nas forças armadas. O Comandante em Chefe Obama deve adotar medidas contundentes de imediato. Um primeiro passo é tirar as investigações e os processos do âmbito militar, uma medida necessária para pôr fim a esta cultura de violação sistémica a que preside o Pentágono.
 
*Artigo publicado originalmente em 10 de maio de 2013. Denis Moynihan colaborou na produção jornalística desta coluna. Texto em inglês traduzido por Mercedes Camps para espanhol. Tradução para português de Carlos Santos/Esquerda.

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