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Lucas Morais

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Crítica radical

Os desafios da esquerda anticapitalista após as eleições

Lucas Morais - Publicado: Domingo, 31 Outubro 2010 22:41

Lucas Morais

Passadas as eleições e consolidada a hegemonia do bloco do PT-PMDB, sob a liderança de Dilma Rousseff e assegurado por Lula, a esquerda anticapitalista carrega pesados fardos para os próximos cenários.


Os partidos da esquerda socialista erraram rotundamente nestas eleições. Todos, sem exceção, deixaram de lado a construção de uma frente de esquerda, mesmo que oportunamente unida para o fortalecimento do campo anticapitalista eleitoralmente, e privilegiaram as construções de candidaturas próprias, para o fortalecimento do aparato partidário. Mais uma vez o interesse partidário se sobrepôs ao interesse do conjunto do movimento anticapitalista.

Uma frente de esquerda que colocasse a reforma agrária, a democratização das comunicações e a reestatização das empresas privatizadas (Vale, Embraer, telefônicas, etc) como eixo de campanha certamente politizaria e inclusive brindaria para amplos setores da esquerda, até mesmo as identificadas com o reformismo ou o etapismo, com um debate que poderia mobilizar amplos setores descontentes com os recuos e compromissos do PT.

Entretanto, o prognóstico do erro não anula o futuro que os anticapitalistas tem diante de si. Estas bandeiras podem aglutinar os movimentos sociais, partidos anticapitalistas e reformistas, organizações das mais diversas, em torno de uma oposição programática, que tenha bandeiras concretas e respostas concretas aos desafios reais que estão postos.

É importante a esquerda esclarecer aos trabalhadores que o Governo Dilma não é um governo classista, que tenha compromissos políticos com as lutas emancipatórias dos trabalhadores, e sim um governo de conciliação de classes, assentado no pacto político do PT e do PMDB e no compromisso destes com o mercado financeiro. Contrapor este governo não significa fazer uma oposição automática, mas sim programática, e discutida e constituída com políticas concretas, que respondam objetivamente os equívocos do governo e as contradições imanentes do capitalismo.

Em cada uma das bandeiras mencionadas acima a posição do Governo é recuada e compactua com os interesses dos oligopólios e transnacionais. Isto deve ser atacado frontalmente pelos anticapitalistas em geral, mas com programas – e não palavras de ordem sem fundamento político – que dialoguem imediatamente com a classe trabalhadora. A formação da consciência de classe dos trabalhadores só pode se dar assim, com críticas que apontem alternativas viáveis que oriente a luta para além da democracia liberal e do capitalismo.

A derrota de José Serra, representante da extrema direita e do entreguismo neoliberal a serviço das diretrizes de Washington, sem dúvida representa um grande avanço para o movimento dos trabalhadores e para a esquerda brasileira. Como ressaltei em trabalhos anteriores, a eleição de Dilma garante um compromisso com as instituições da democracia liberal e o diálogo com os movimentos sociais, que alguns setores do anticapitalismo identificam automaticamente como cooptação, mas vale ressaltar que ainda que haja cooptação, para a construção de um movimento para além do capital, um governo de caráter socialdemocrata (ou social-liberal) dá condições melhores para a construção do movimento socialista, o que seria certamente diferente com um representante que não hesitou em agredir barbaramente professores, estudantes, policiais civis e que defende um campo "sem bonés do MST". A criminalização da luta dos trabalhadores e dos camponeses seria uma derrota inimaginável. Neste sentido, defendi o voto crítico em Dilma. Crítico, aqui, significa fazer todas as críticas ativas, práticas, que oriente a luta a uma prática para além do capital em um novo Governo do PT e PMDB. Portanto eu discordei abertamente dos setores da esquerda que advogaram pelo voto nulo, voto que não dialoga com os trabalhadores (82% de aprovação do Gov. Lula) e, querendo ou não, lava as mãos em relação aos projetos postos pelo PT e PSDB. Os movimentos sociais estão votando em Dilma, mas não com ilusões de que o governo dela atenda às demandas de suas lutas, mas sim porque este governo promoveria condições de liberdade de protesto, organização, expressão, reunião, direitos esses sistematicamente atacados pela direita. Votar nulo, na minha opinião, é fechar os olhos para questões fundamentais que estão postas para os movimentos sociais, isto em favor de uma isenção em relação ao reformismo. Do ponto de vista dos trabalhadores e do processo de integração da América Latina, Dilma pode não ser o avanço que atenda aos interesses postos, mas Serra seria uma derrota que comprometeria inclusive a construção do movimento anticapitalista.

Daqui em diante a esquerda anticapitalista deve se aproximar programaticamente em torno das bandeiras dos trabalhadores e dos movimentos sociais, para, na medida em que as bandeiras não são atendidas pelo governo, aí sim, uma oposição cabível, necessária, urgente e que deve ser travada com unidade em todo o espectro da esquerda. Questões como a reforma agrária, redução da jornada de trabalho, reestatização das empresas estatais vendidas, democratização da comunicação, retirada das tropas brasileiras do Haiti, etc, devem ser eixos de unidade para uma luta cotidiana, que tenha como eixo maior a construção de um movimento de massas para além do capital, socialista e libertário.

A frente de esquerda, unida pelas bases (e não pelas urnas), é a perspectiva mais promissora para os anticapitalistas. Só a unidade prática e programática pode criar um bloco social anticapitalista que se apresente nos próximos anos como uma alternativa não governamental, mas sistêmica, de luta pela socialização dos meios de produção, pelo controle dos trabalhadores em cada local de trabalho, em defesa da democracia socialista (rotação de cargos, controle de representantes pela assembleia, como nas experiências da Comuna de Paris, conselhos [sovietes] russos, espanhóis, etc) contra o poder das burocracias (sindicais, partidárias, dos movimentos sociais). O inimigo da emancipação dos trabalhadores não é somente a direita, mas também setores que conservam e isolam as bases do poder, que são as burocracias.

Há que combater a direita, há que combater o reformismo, há que combater as burocracias da esquerda. E, mais que combater, é preciso construir programas e plataformas políticas unitárias, que transcendam os interesses imediatos dos aparatos políticos e tracejem uma atuação republicana, suprapartidária, em torno da construção do socialismo e das liberdades. São esses os desafios que estão postos para a esquerda anticapitalista no próximo cenário. E só uma unidade programática e pelas bases poderá iniciar um movimento que coloque alternativas socialistas efetivas e viáveis, que contraponha não só o governo, mas o sistema do capital em seu conjunto, sua democracia liberal, seus aparatos de repressão e os ataques do imperialismo.


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