O filme, dirigido por Mariana Pamplona, conta a história de Iara Iavelberg, uma jovem paulista que durante os anos 60 ingressa na luta armada contra o regime militar brasileiro. Esta poderia ser a biografia de outras tantas mulheres, não fosse um detalhe: Iara era companheira do líder guerrilheiro Carlos Lamarca, assassinado pouco depois dela. O documentário tem como tema central a polêmica morte da jovem, que segundo a versão oficial, teria se suicidado numa emboscada da polícia. Porém, a família e outras testemunhas defendem que foi a polícia a responsável pelo tiro que atingiu Iara.
Em sua totalidade, trata-se de um bom filme, que mesmo dirigido pela sobrinha da protagonista não apela para sentimentalismos e não deixa a desejar na qualidade. Sem desmerecer a temática principal já citada, o filme me proporcionou outras inquietações, que vou expor nos próximos parágrafos.
Lamarca, companheiro de Iara, é considerado um dos heróis da resistência a ditadura. Nas aulas de história do Brasil, seu nome é citado ao lado de figuras como Carlos Marighella e comparado ao já citado Che e Luís Carlos Prestes, outro ícone da esquerda brasileira. Em contrapartida, o nome de Iara é quase desconhecido, ficando restrito a meios específicos, como grupos de ex-presos políticos. A situação não é muito diferente com Aleida March e Clara Charf, respectivamente esposas de Guevara e Marighella, também integrantes da causa revolucionária. Olga Benário, esposa de Prestes é desconhecido na Alemanh, a sua terra natal. E fica a dúvida se sua fama no Brasil teria crescido sem a biografia escrita por Fernando Morais. Sua segunda esposa, Maria, só é conhecida em um círculo restrito.
O que se constata é o machismo dentro da própria esquerda. Assim como os homens que tinham ao seu lado, estas cinco mulheres arriscaram suas vidas, abriram mão de seu conforto e segurança e mesmo assim permanecem ignoradas. Algumas viram seus companheiros morrerem ou sofrerem as piores torturas, isso quando não eram elas mesmas as vítimas. Apesar disso, não desistiram.
Como disse Che Guevara, é preciso uma grande sentimento de amor para ser um revolucionário. Foi o amor de revolucionária, unido ao de mulher que as tornou mais fortes do que muitos homens. Em determinado trecho do filme, é dito que a ditadura vendia a imagem de Iara como uma moça fútil, uma burguesinha metida a intelectual e rebelde. Não é difícil imaginar que muitos membros da guerrilha a enxergavam do mesmo modo.
Quando se fala de memória resgatada, é também dessas mulheres invisíveis de que falamos. É preciso combater o machismo como um todo, inclusive dentro da própria esquerda, que se diz libertária, mas trata a luta das mulheres como menor e desnecessária. Entretanto, enquanto as mulheres continuarem sendo vistas como um mero adereço de seus companheiros, não teremos uma revolução de fato.