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Iñaki Gil de San Vicente

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A força material do simbólico

Iñaki Gil de San Vicente - Publicado: Sábado, 02 Março 2013 21:45

Existe a opiniom generalizada entre os historiadores de que o imperador Moctezuma foi repudiado e apedrejado polo seu povo quando claudicou perante a invasom espanhola. Isso foi no verao de 1520. Apesar dos seus inestimáveis serviços, foi assassinado polo ocupante.


Em 1814 o mestiço W. McIntosh dirigiu um grupo de índios que luitavam às ordens ianques contra os seus irmaos índios, derrotando-os e obrigando-os a ceder enormes territórios da atual Alabama, alguns poucos dos quais fôrom entregues a maos dos chefes colaboracionistas, sendo despojados deles ao cabo do tempo polos ocupantes em aplicaçom da máxima de que Roma nom paga traidores; mas em 1825 o chefe índio Manawa executou W. McIntosh por ter assinado um pacto secreto com os ianques. Quando em 1795 o povo haitiano, maioritariamente de origem africana, conquistou a sua independência abolindo a escravatura, recuperou oficialmente o nome aborígene da Ilha, Haiti, apesar de que os seus originários habitantes tinham sido exterminados. Para 1957 o exército venezuelano tinha no seu interior grupos organizados que simpatizavam com as guerrilhas; em 1964 publicou-se clandestinamente o decisivo documento «De militares para militares» no que se explicava por que Venezuela devia emancipar-se nacionalmente da tutela ianque com umha política socialmente progressista; apesar das repressons, o movimento ajudou a acelerar a revoluçom bolivariana.

Que tenhem a ver estes exemplos com o título do artigo? Pois todo, se por simbologia entendemos a totalidade de referentes linguístico-culturais, identitários, sociais, religiosos, etc., que tem um povo, ou se se quer, o que se denomina «imaginário coletivo», «cultura popular», ou outras formas de falar do «papel do fator subjetivo na história». É óbvio que a ideologia e a cultura da classe dominante dominam no mundo simbólico, mas o seu poder nom é tam omnipotente como para destruir toda a raiz de luita, rebeldia e justiça no seio da cultura popular. A razom há que a procurar em algo tam elementar e decisivo como é o facto de que a cultura, no seu sentido antropogénico, nom é outra cousa que a produçom e distribuiçom horizontal e democrática dos valores de uso. Por isto, quando a cultura popular se desenvolve crítica e criativamente é porque surge da propriedade coletiva, comunal, ou porque luita consciente e estrategicamente por recupera-la acabando com a propriedade privada. Por isto mesmo, tem tam decisiva força simbólica o relacionado com os bens comuns, com o excedente social produzido e acumulado coletivamente e materializado na independência do povo que o produze, o qual nos propom dous problemas unidos: a luita de classes interna pola posse do excedente e das forças produtivas, e a sua defesa frente a inimigos internos e externos. Do interior de ambas surge o que se denomina memória militar dum povo, umha de cujas primeiras expressons é o célebre discurso que Tucídides atribui a Pericles.

As massas astecas, índias, haitianas e venezuelanas sabiam que suas classes dominantes colaboravam com os invasores, e unírom o seu futuro pessoal e coletivo com o futuro do seu povo, com a sua independência. Figérom-no, entre outras cousas, transformando em força material a força simbólica dos seus imaginários coletivos, das suas tradiçons populares. Por enquanto, estes exemplos nom fôrom nem os primeiros nem serám os últimos. Há mais de 2500 anos o império persa sabia como anular a força material inserida na simbologia dos povos que subjugava: obrigava a que os seus jovens nom aprendessem o uso das armas, deste modo numha ou duas geraçons rebaixava ao nível de rebanhos assustadiços a naçons rebeldes e orgulhosas. Mas a realidade é mais complexa já que a nengumha classe dominante lhe convém ter um povo digno, capaz de defender-se, e por isso o pacifica mental e fisicamente para que se deixe explorar. Algo assim sucedeu ao império bizantino quando os otomanos cercárom Constantinopla em 1453: somente algo menos de 5% de sua populaçom estava disposta a defender a cidade, ainda sabendo o horrível futuro que lhes esperava sob a ocupaçom otomana.

Mas há que sair em defesa do islamismo otomano porque foi muito menos cruel e selvagem no saque e escravidom de Constantinopla que a extrema brutalidade praticada polos europeus ocidentais da quarta cruzada em 1203, baixo a bênçom de Roma. Dizemos isto porque a defesa à morte contra o cristianismo na sua versom latina foi umha das causas que explicam a tenaz resistência dos povos da Ásia às sucessivas agressons ocidentais, além da forte firmeza da propriedade comunal e dos chamados por Marx «sistemas nacionais de produçom pré-capitalista», e dos próprios interesses materiais das classes dominantes. Ainda considerando este último facto, a força do simbólico é inegável, como o viveu um admirado Lenine ante a heroicidade chinesa em 1900. Recordemos a resistência sudanesa no final do século XIX contra o exército anglo-egípcio, formado umha vez de que a classe rica egípcia claudicasse para manter parte de suas propriedades. A reconhecida memória militar do povo argelino foi um dos segredos da sua nunca extinta luita nacional antifrancesa, que fascinou o Engels. Quando esta memória, que em si assume e sintetiza o essencial dos valores comuns e comunitários se debilita ou desaparece, entom assistimos a espetáculos vergonhentos como ver desbandar-se e fugir as grandes manifestaçons de massas da classe trabalhadora alemá, nada mais se iniciar o ataque de pequenos grupos nazistas que copiavam os métodos das esquadras negras fascistas na década de 20 italiana.

A memória militar é umha força simbólica que se nutre das melhores virtudes e valores dos povos explorados, de sua experiência generacional transmitida apesar das censuras, mentiras e falsidades criadas pola classe dominante e/ou polo Estado que tem invadido e ocupa esse povo. Maquiavelo ofereceu umha brilhante definiçom da memória militar ao dizer que os suíços eram livres porque tinham armas. Alguém que esta no seu juízo perfeito acha que Cuba continuaria a ser independente se nom tivesse umha efetiva defesa e umha muito enraizada memória militar? E é que o pacifismo à morte, além de eticamente imoral, é a autoderrota definitiva. Por estas e mais razons, quando vemos que algumas esquerdas desvariam e se derrubam nom só no pacifismo senom na amnésia histórica, o que vem a ser o mesmo, esquecendo as liçons do passado e fechando os olhos à essencial inumanidade terrorista do capitalismo, entom compreendemos que a luz teórica, o esclarecimento político e a ativaçom ética, som mais necessárias do que nunca dantes, também em Euskal Herria.

IÑAKI GIL DE SAN VICENTE

EUSKAL HERRIA 26 de fevereiro de 2013


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