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Mário Maestri

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Espanha: a sombra do caudilho

Mário Maestri - Publicado: Sábado, 04 Agosto 2012 02:19

Em novembro de 2011, o Partido Popular (centro-direita) obteve seu melhor escore eleitoral em relação ao PSOE (centro-esquerda). Mariano Rajoy assumiu o governo de rosto circunspecto, que procurava expressar a grave situação do país.


Dissera pouco durante a campanha: prometera, sobretudo, governo sério e não aumentar os impostos. Iniciou sem delongas cortadeira geral nos gastos e nos salários públicos; nas pensões e nos direitos trabalhistas; nos feriados e nas férias; nos subsídios sociais etc. Uma política social de terra arrasada. Tudo sob os olhos complacentes dos socialistas, dedicados à oposição responsável, já que haviam inaugurado a política de austeridade. Segundo Rajoy, as medidas eram amargas mas tirariam o país da crise.

A fuga de capitais contribuiu para a insolvência do sistema bancário, duramente comprometido desde a crise de 2009, quando da explosão da bolha imobiliária. Rajoy pegou o pires e foi a Bruxelas implorar recursos para recapitalizar os bancos, sempre à custa da população espanhola. Concederam-lhe o dinheiro pedido para os bancos, uns cem bilhões de euros, em troca de corte de 65 bilhões de euros, algo sem paralelo na Espanha pós-franquista. Obediente às exigências, Rajoy aprovou subida do ICMS para até 21%; suspensão do décimo terceiro dos funcionários; redução no salário desemprego, já magríssimo; mais impostos sobre a moradia etc. Tudo prometendo tirar o país da crise.

Mas, na crise, o país afundou. Após meio ano de governo conservador, todos os índices despencaram. Os juros da dívida soberana dobraram: os investidores internacionais exigem agora 5,8%, para empréstimos a dois anos; 6,9%, para cinco anos; 7,3%, para dez anos! E seguiram subindo nesta segunda-feira! Isso em uma Europa que teme a deflação! As receitas espanholas encolheram, com o aprofundamento da recessão; a dívida pública, que devia recuar, explodiu, mais de 9%, em 2013. Espera-se, agora, talvez até um ponto negativo no PIB do país, em 2013! O desemprego superou os 25%; entre os jovens, ultrapassa, em algumas regiões, os 50%. A bolsa espanhola despencou em dez por cento, desde sexta-feira – no cômputo anual, é a pior no mundo, após a do Chipre!

E a situação seguiu deteriorando-se: seis das 17 comunidades autônomas espanholas encontram-se já insolventes, necessitando recorrer ao governo central, que passará a intervir em suas administrações, pondo fim aos direitos autonômicos, cedidos após o fim do franquismo. Algo quase insustentável, politicamente. Para fazer frente às necessidades das províncias, o governo espanhol deverá inapelavelmente pedir a compra de sua dívida soberana pelo Fundo de Resgate europeu. O que transformará a Espanha, oficialmente, em uma espécie de semi-colônia do grande capital europeu, sob a direção atual de Ângela Merkel, capo dessa espécie de colonização sem panzer da Europa pobre.

Em Portugal, na Itália, na Grécia e na Espanha, os governos que impõem as terríveis políticas de austeridade acusam os grandes investidores como responsáveis pela total inocuidade das mesmas. Dizem que eles não atentam para as iniciativas saneadoras impostas às populações dos respectivos países, baixando gentilmente o custo do dinheiro que lhes pedem. Mas por que raios poriam fim ao ótimo negócio?

Por sua vez, o Banco Central Europeu, sob o controle do capital hegemônico do Velho Mundo, não quer simplesmente falar de um bônus solidário, garantido por toda a União Europeia. Ele permitiria aos países em quase agonia se financiarem a taxas não escorchantes. Mas porque os governos da Alemanha, da Holanda etc. encerrariam situação que permite financiarem as suas dívidas soberanas a taxas já quase negativas, pois tidas como refúgio pelos grandes aplicadores!

Na quinta-feira passada, após a aprovação do maxi-corte de Rajoy, a população espanhola ocupou as ruas: centenas de milhares de trabalhadores, funcionários, bombeiros, médicos, estudantes, desempregados, policiais e muitos jovens. E o governo sequer pode criticar os manifestantes. Eram socialistas, governistas, sem partidos. Era a população dizendo que não aguenta mais. E, como na Argentina, apareceram os primeiros piqueteiros, cortando ruas e avenidas. Agora, as grandes confederações sindicais, igualmente acuadas, propõem a discussão de eventual greve geral. Rajoy anda de cara assustada.

Não há, entretanto, proposta de alternativa política, por parte da esquerda sindical e política espanhola, engolida ideologicamente pelos longos anos de milagre econômico espanhol. Todos querem, de um modo ou outro, mais ou menos, reformar o capitalismo, ressuscitar cadáver em adiantado estado de putrefação. Espanha e grande parte da Europa se defrontarão em médio prazo com questão crucial. A ordem democrática tradicional não corresponde mais à nova situação de destruição estrutural das condições de existência de enorme parte da população. É impossível manter na miséria legiões de cidadãos e chamá-los periodicamente a se pronunciarem sobre a sorte do país. Mui cedo pode se levantar sobre a Espanha e a Europa a sombra do Caudillo.


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