1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (0 Votos)

170713 feminismoEscreva Lola escreva - [Patricia Valoy] O querido Flávio Moreira encontrou este texto recente num blog americano, fez questão de traduzi-lo, e o enviou pra mim. 


O texto é de uma mulher latina (a engenheira civil e radialista Patricia Valoy) que vive e trabalha em Nova York. Vale a pena ser lido (a maior parte das ilustrações são referentes ao ChicanaFeminism, o feminimo latino).

Feminismo é uma palavra polarizada.
 
Ou você o abraça integralmente como forma de vida ou não quer saber de nada com ele.
Pessoalmente, sempre tive um estilo de vida feminista. Mas até recentemente eu normalmente começava uma conversa sobre direitos das mulheres com a pavorosa frase “Não sou feminista, mas...”
 
Por que eu hesitava tanto em me afirmar feminista?
 
A verdade é que eu simplesmente não entendia o que era o feminismo, muito menos quão libertador ele era.
 
Eu tinha concepções erradas, como a de que o feminismo queria usurpar o poder dos homens e dominá-los.
 
Eu realmente acreditava que, por ser uma garota, eu precisava de proteção contra danos, e que eu deveria estar satisfeita por existirem homens que poderiam me oferecer essa segurança.
Mas, mais importante, eu não achava que eu, como mulher, fosse oprimida.
Por exemplo, uma família na qual meu pai era o patriarca era a regra. Quando minhas irmãs e eu queríamos ir a algum lugar fora de nossa vizinhança meu pai protestava e dizia que não era seguro.
 
Mas não apenas meu pai.
 
Minha mãe e outros parentes femininos, todas diziam a mesma coisa.
 
“É perigoso para uma garota”, nos diziam. “Você estará mais segura aqui”.
 
É claro que eu queria estar segura e protegida. Quem não quer? E eu sentia que tudo o que minha família fazia por mim era porque eles sabiam o que era melhor para mim.
 
Nunca me ocorreu que parte disso era resultado de sexismo. E com certeza nunca me ocorreu que parte disso era resultado do sexismo internalizado das mulheres.
 
Vivíamos sob papéis de gênero estritos, e era assim que as coisas eram, simplesmente.
Foi só depois de começar a ler sobre feminismo por curiosidade que entendi como muito da minha criação era, na verdade, fruto de um mundo patriarcal.
 
Mas mesmo depois dessa compreensão de que eu poderia questionar essas normas, eu ainda achava que o feminismo não era para mim.
 
Eu queria me libertar de papéis de gênero limitadores, claro — exacerbados por parentes que estavam insatisfeitos porque eu estava estudando engenharia, uma profissão dita “masculina”— mas eu também queria ser amada.
 
O feminismo prega igualdade entre os gêneros, mas porque vivemos em uma sociedade que relaciona qualidades femininas com fraqueza e docilidade, isso parece um extremismo.
 
Mas na época, embora eu concordasse sinceramente com o feminismo, ele parecia radical e revolucionário.
 
O que percebo hoje é que eu estava com medo do rótulo, não do que ele representava.
Mas isso me impediu de abraçar o feminismo integralmente como modo de vida até que eu estivesse com idade suficiente para buscar informações por mim mesma.
 
Todo o meu conhecimento sobre o feminismo, como muitas de nós, consistia em uma palestra de um dia no colégio sobre a Declaração de Seneca Falls. Assim, por toda a minha vida pensei que o feminismo fosse um movimento criado por e para mulheres brancas americanas. E esse era um movimento do qual eu não queria fazer parte.
Mas então…
 
Num esforço para me reconectar com minhas raízes dominicanas [Rep. Dominicana], li o livro No Tempo das Borboletas, de Julia Álvarez. O livro é um relato ficcional sobre quatro mulheres, as irmãs Mirabal, na República Dominicana, que lutam pela liberdade enquanto o país é governado por um ditador tirânico.
 
Quando vi o quanto compartilhávamos a mesma história, cultura e modo de vida, suas histórias de coragem e força serviram como alicerce para o meu feminismo.
 
Essas mulheres viveram em uma época em que não era permitido a elas ultrapassar limites. As consequências das discordâncias eram mais do que tornarem-se párias da sociedade: elas eram mortas por suas ações.
 
A história das irmãs Mirabal incitaram o espírito revolucionário em mim. Eu vi sua história como uma forma de lutar pelas liberdades civis com foco nas mulheres e meninas.
 
Mas sua história me ensinou que também poderia ser perigoso ser feminista.
 
Assim como as irmãs Mirabal foram assassinadas por lutar contra um ditador cruel, em alguns lugares mulheres que confrontam e tentam mudar normas sociais se colocam em risco de serem alienadas por suas famílias e pares ou mesmo encarar retaliação do governo.
 
No México, Lydia Cacho -– feminista, defensora dos direitos humanos, e jornalista– foi ameaçada de estupro e assassinato por manifestar-se pelos direitos das mulheres.
 
No Afeganistão, dois assassinos de aluguel mataram Najia Seddiqui, líder do Women’s Affairs Department (algo como Departamento de Assuntos das Mulheres) e incansável defensora do avanço feminino em seu país. Sua antecessora, Hanifa Safi, também foi morta quando detonaram explosivos instalados em seu carro.

Em todo o mundo existem histórias de mulheres que são punidas por se manifestarem a favor das mulheres. Ainda assim, mesmo para aquelas de nós que possuem a sorte de viver em um país em que não sofremos perseguições por sermos feministas, existem vários obstáculos para se tornar uma feminista.
 
Diferentemente das irmãs Mirabal, de Lydia Cacho, Najia Seddiqui e Hanifa Safi, nenhuma de nós corremos perigo físico por nos afirmarmos feministas.
 
Mas entendo que identificar-se como feminista nem sempre é fácil ou viável.
 
Algumas mulheres tentam abraçar o feminismo, mas sentem-se desconectadas do movimento.
 
O feminismo predominante tem a tendência de se concentrar desproporcionalmente nos problemas de mulheres brancas, cis [não trans], de classe média.
 
Não é prático focar em questões como se as mulheres deveriam trocar de nome no casamento quando não se tem dinheiro suficiente para sustentar a família.
 
Algumas mulheres não podem abandonar seus empregos para juntar-se a um comício feminista, porque isso poderia significar que sua família poderia ficar com fome.
 
Mulheres pobres, mães solteiras e imigrantes são muitas vezes as mesmas mulheres que não possuem os meios de se organizar e protestar devido à falta de fundos, tempo ou barreiras linguísticas.
 
Mas essas são também as mulheres que mais precisam do feminismo.
 
O patriarcado tem dado duro para convencer as mulheres de que o feminismo não é mais necessário. A afirmação de que “já somos todos iguais” é falsa.
 
A realidade é que enquanto homens e mulheres brancas atingiram alguns níveis de igualdade na nossa sociedade, o mesmo não ocorre em todas as partes do mundo.
 
Mesmo nos EUA, as mulheres ainda ganham menos do que os homens, fazendo o mesmo trabalho. Ainda se espera que nulheres casem e tenham filhos e aquelas que não estão interessadas nesse modo de vida são vistas como párias.
 
Enquanto isso, em alguns países, as mulheres podem ser mortas por seus parentes por serem estupradas ou por suposta promiscuidade. Se o feminismo, como estamos convencidas, não fosse necessário, esses problemas não existiriam.
 
Eu me afirmo feminista porque acredito no que ele representa. Mas tenho sorte de viver em uma sociedade que me permite me expressar livremente, assumir o rótulo com orgulho. Mas, no fim das contas, o objetivo do feminismo não é se vangloriar do número de mulheres que se declaram feministas. 
 
Um rótulo pode ser importante para reforçar o sentimento de comunidade, mas não será suficiente para derrubar a sociedade patriarcal. Aquelas de nós que possuem os meios de melhorar a vida das mulheres precisam demonstrar empatia e trabalhar pelas mulheres que não têm voz – mesmo se sua causa não for a nossa causa.
 
Mais importante do que dizer “Sou feminista!” é fazer o trabalho necessário para o progresso das mulheres, e isso é o que nos torna verdadeiramente feministas. E não vejo nada de assustador nisso.

Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.