1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (2 Votos)

310113 arabeEstado espanhol - Diagonal - [Jaime Giménez, tradução do Diário Liberdade] É a língua maioritária dos alunos e alunas, e os especialistas vinculam o alto fracasso escolar em Ceuta, entre outras causas, à resistência das autoridades a incluir o árabe ceuti nas escolas.


A complexa situação do ensino em Ceuta pode ser resumido em dois dados. Ceuta é, junto a Melilha, a região sob administração espanhola com maior índice de insucesso escolar: até 40% dos alunos abandonam o sistema educativo antes de tempo. Em Ceuta, por outro lado, três em cada quatro estudantes de infantil e primária têm o árabe ceuti como língua nativa. No entanto, este código linguístico não tem cabimento nas escolas.

Há quem veja relação direta entre ambas realidades. E há quem não. De um lado, filólogos como o professor da Universidade Autônoma de Madri Francisco Moscoso advogam pelo reconhecimento do árabe ceutí ou dariya como língua cooficial. De outro, responsáveis políticos como o delegado do Governo em Ceuta, Francisco González, negam-lhe sequer a condição de idioma.

A especialista em árabe ceuti e professora de secundária na cidade autônoma Verónica Rivera acha que o primeiro passo para a solução do problema educativo seria o atendimento à diversidade linguística. "Todos os meus alunos, exceto dois, têm o árabe como língua nativa, utilizam o árabe tanto em casa como com os amigos. Mas, paradoxalmente, não se atende adequadamente a essa diversidade", assegura.

Dos 80.000 habitantes que habitam Ceuta, 38% é de origem árabe e fala dariya quotidianamente. Possuem a nacionalidade espanhola e são, por tanto, cidadãos de pleno direito. Fala­mos, pois, de espanhóis bilingües, que manejam tanto o castelhano como o árabe ceuti. A esta circunstância alude Moscoso para reivindicar a cooficialidade. O artigo 3 da Constituição declara que as "línguas espanholas serão também oficiais nas respetivas comunidades autóno­mas". Portanto, segundo o filólogo, "se quase 40% da população espanhola em Ceuta tem como língua nativa o dariya, a Cons­tituição garante o direito dos espanhóis bilingües ceutis a que sua língua nativa seja reconhecida como cooficial".

As autoridades competentes, não obstante, têm uma visão diferente. Há uns dias, o delegado do Governo negava radicalmente a possibilidade de incluir o árabe ceuti nos planos educativos. "Nem sequer é um idioma", manifestou ao Faro de Ceuta. "Para que um idioma seja tal, têm que se cumprir duas condições: a fonética e a sintaxe. O primeiro tem-no, mas o segundo não, não se escreve", acrescentou. As concorrências em matéria educativa não estão transferidas, pelo qual é a Direção Provincial, dependente de Madri, e não o Governo ceuti, que tem a potestade sobre a política linguística.

Xenofobia institucional

As declarações de González não passaram despercibidas na comunidade acadêmica. Para Rivera, que exerceu de assessora no Centro de Professores e Recursos de Ceuta até a chegada do PP ao poder, "existe o mito de que a língua que não se escreve não tem entidade de língua e então não pode ser estudado na escola. É o argumento de sempre, não só agora com o Governo do PP, mas também antes com o PSOE. No mundo existem 6.000 idiomas e, embora a maioria deles não se escrevam, não por isso deixam de ser códigos com que se poder expressar tanto um pensamento complexo como qualquer ordem habitual da rua".

Moscoso, que na atualidade trabalha na adaptação do dariya ao Quadro Comum Europeu de Referência para as Línguas, vai para além. "A atitude do delegado do Governo não revela o racismo e a xenofobia instalados nos órgãos de poder, os quais não são mais que a máscara que cobre a ignorância e um etnocentrismo espanhol que foi construído em oposição a todo o que soasse a árabe", sentença.

A questão identitaria é chave para compreender o problema. A juízo de Ángeles Vicente, professora de Estudos Árabes na Uni­versidade de Saragoça, "a permeabilidade da fronteira entre Espanha e Marrocos provocou que muitos cidadãos ceutis achem que estão ameaçados por esta outra identidade linguística, cultural e religiosa que convive tanto com eles como ao outro dessa fronteira".

Este medo ao "outro" marroquino repercutiu na educação de várias gerações de ceutis. Mohamed Mustafá, nascido em Ceuta há 34 anos, sofreu em pessoa as consequências da falta de atenção à sua cultura. "Lembro com bastante clareza as proibições taxativas de utilizarmos a nossa língua e o fato de que passasse absolutamente inadvertida na escola". Na atualidade, é seu filho que estuda em um colégio público ceuti, fazendo parte de um sistema educativo que, em sua opinião, "não teve praticamente nenhuma evolução". Mustafá trabalha como assessor da Coligação Caballas que, com quatro deputados dos 25 que compõem a Assembleia, é o único grupo político que apoia o reconhecimento institucional do árabe ceuti.

Os três especialistas consultados por DIAGONAL, Moscoso, Rivera e Vicente, coincidem em que a solução ao problema do insucesso escolar em Ceuta passaria pelo ensino do espanhol como segunda língua para os alunos que tenham o dariya como língua nativa. Vários estudos de campo, como o de Rafael Jiménez, professor da Universidade de Cádiz, ratificam esta teoria. No entanto, isso implicaria a aceitação do árabe na escola, facto que o Governo espanhol não parece disposto a permitir. "Há um desconheciminto muito grande da cultura, isto gera preconceitos e estereótipos. Em Ceuta vivemos juntos, mas vivemos de costas uns a outros", conclui Rivera.

Uma língua menosprezada por todos

O dariya ou árabe ceuti é o código linguístico utilizado na zona norte de Marrocos e em Ceuta. Trata-se de uma língua sem prestígio, menosprezada. Sua presença remonta à segunda metade do século XIX. É uma língua oral, sem escrita padrão, como quase todas as da família árabe. O fosha ou árabe clássico, língua sagrada do Alcorão, é a única que se utiliza para escrever. Não é reconhecida nem pelo Estado espanhol nem pelo marroquino. Em Ceuta, sofre um duplo sometimento: ante o castelhano, ao não estar amparada pela lei, e ante o fosha, pelas reticências da própria elite árabe-muçulmana. Excluído tanto da escola como dos outros espaços institucionais, permanece ignorado pelos órgãos de poder da cidade autônoma. Seus cerca de 30.000 hablantes vêem na manutenção de seu menosprezado idioma uma maneira de reafirmar sua identidade cultural e religiosa.


Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.