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euroUnião Europeia - Resistir - [Alexandre Abreu] O euro é um desafio ostensivo às lições da História, e não se desafia a História sem pagar um preço.


Na era contemporânea e até à data, houve três grandes experiências de fixação da paridade cambial entre grupos significativos de economias distintas: o padrão-ouro do final do século XIX e início do século XX; o sistema de Bretton Woods, que vigorou entre o final da 2ª Guerra Mundial e o início da década de 1970; e o Euro.

Em todos estes casos, a introdução de um sistema de câmbios fixos visou eliminar o risco cambial e, por essa via, facilitar os fluxos de investimento e comércio internacional. No plano político, a intenção declarada era a da promoção da integração económica, da interdependência e, pelo menos no plano das proclamações, da paz e harmonia entre as nações.

Em todos estes casos, a integração cambial (que, na medida da maior ou menor liberdade de circulação de capitais, é também na prática unificação monetária, tal como nos diz o chamado trilema da economia internacional ) não se fez acompanhar por uma integração fiscal ou orçamental susceptível de contrariar a divergência gradual das várias economias em relação aos parâmetros iniciais em função dos quais fora fixada a paridade cambial.

Em todos estes casos, também, o período inicial de relativa estabilidade e sucesso do sistema de câmbios fixos durou apenas até à crise sistémica seguinte. O padrão-ouro do início do século XX durou até à Grande Depressão da década de 1930, no decurso da qual todas as principais divisas abandonaram a paridade estabelecida. É aliás um facto bem conhecido da história económica do século XX que as economias que abandonaram o regime de câmbios fixos mais cedo (o chamado "sterling block", que incluía o Reino Unido e diversos países nórdicos e que saíu do padrão-ouro em 1931) começaram a recuperação da Grande Depressão muito mais cedo do que as que insistiram na permanência no sistema durante mais tempo (como a França, Bélgica e Suiça, que resistiram até 1935-36).

Por sua vez, o sistema de convertibilidade divisas-dólar-ouro, ou sistema de Bretton Woods, durou até à chamada crise da década de 1970. A causa próxima foi a sobrevalorização implícita do dólar e o seu impacto nas contas externas norte-americanas , mas tal ocorreu no contexto de uma crise sistémica mais profunda, que aliás começara a declarar-se já no final da década de 1960.

E o euro, ou pelo menos a fase triunfal do euro, durou até à eclosão em 2007 da crise sistémica seguinte: aquela em que ainda nos encontramos e que, no contexto europeu, veio expor decisivamente a insustentabilidade da paridade cambial subjacente, especialmente em resultado da adopção pela Alemanha de uma política mercantilista assente na compressão salarial, que provocou uma divergência dos níveis de inflação logo desde o início do euro.

Só que o regime de câmbios fixos do euro é um regime especial, que não corresponde apenas ao estabelecimento de uma paridade fixa entre moedas distintas controladas por soberanos distintos. O euro é o primeiro sistema em que economias distintas, mantendo a autonomia nos planos fiscal e orçamental e a ausência de coordenação distributiva significativa, eliminaram as divisas pre-existentes e adoptaram uma moeda única. Isso faz com que seja um sistema muito mais difícil, custoso e imprevisível de desmontar do que sucedeu nos dois casos anteriores. Mas nem por isso é mais viável.

No fundo, o euro é um desafio ostensivo à História, em que ainda por cima se subiu a parada. Só que como estamos e vamos continuar a assistir, não se desafia a História sem pagar um preço.

Alexandre Abreu é Economista, co-autor do blog Ladrões de Bicicletas.


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