1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (1 Votos)

150814 lossPalestina - Desacato - [Sharmine Narwani] A expressão «direito de existir» entrou na minha consciência nos anos 90, assim como o conceito de uma solução de los dos Estados entrou no vocabulário coletivo.


Em cada debate na universidade, quando um sionista ficava sem argumentos invocavam estas três palavras mágicas para interromper a conversa com um indignado « Vocês estão dizendo que Israel não tem direito de existir?».

Fica claro, você não pode questionar o direito de Israel de existir -seria como negar o direito fundamental dos judeus de ter... direitos, e a culpabilidade toda do holocausto será jogada contra você.

Salvo que eu não tenho nada a ver com o holocausto -e os palestinos tampouco. O programa europeu de metódica limpeza étnica contra sua população judia foi usado, de maneira totalmente cínica e oportunista, para justificar a limpeza étnica da nação árabe palestina, assunto que me deixai indiferente. Já estou cansada demais de levantar os olhos para o céu sempre que ouço na mesma frase as palavras holocausto e Israel.

O que me perturba nesta era posterior à «solução de dois Estados», é a própria audácia da existência de Israel.

Que ideia tão fantástica, esta noção de que um grupo de estrangeiros de outro continente possa se apropriar de uma nação existente e habitada e convencer a «comunidade internacional» de que isto é justamente o que devia ser feito. Seria para eu rir de tanta desfaçatez se não fosse tão grave.

Mais grave é a limpeza étnica em massa da população palestina indígena efetuada pelos judeus perseguidos, apenas recuperados da sua própria experiência de limpeza étnica.

Mas o mais terrível é a manipulação psicológica das massas que acreditam que os palestinos são «terroristas» perigosos determinados a «jogar os judeus pro mar». Eu trabalho com as palavras e o uso da linguagem na criação de percepções me intriga. Esta prática -muitas vezes chamada «diplomacia pública»- tem se tornado ferramenta indispensável no mundo da geopolítica. As palavras, a final, são blocos de construção da nossa psicologia.

Consideremos, por exemplo, a forma em que chegamos a perceber o «litígio» palestino-israelense e todas as resoluções deste conflito que continua. Vou utilizar ideias já expressadas em outros artigos.

Os Estados Unidos e Israel têm determinado o discurso mundial sobre esta questão, definindo seus estritos parâmetros que limitam cada vez mais o conteúdo e a orientação do debate. Até faz pouco tempo, qualquer discussão fora destes parâmetros, era considerada como irreal, improdutiva e inclusive subversiva.

A participação no debate está reservada aos que aderem a estes grandes princípios: aceitação de Israel, sua hegemonia regional e sua superioridade militar; aceitação da lógica duvidosa sobre a que se funda a reivindicação da Palestina pelo Estado judeu; e aceitação de quem são os interlocutores, movimentos e governos aceitáveis ou não em qualquier solução ao conflito.

Palavras como pomba, falcão, militante, radical, moderado, terrorista, islamo-fascista, negacionista, ameaça existencial, mulá louco, determinam a participação na solução e são capazes de excluir outras instantaneamente.

Depois, há a linguagem que preserva «o direito de Israel de existir» sem que ninguém faça nenhuma pergunta: todos os que invocam o Holocausto, o antissemitismo e os mitos sobre os direitos históricos dos judeus à terra legada pelo Todo-Poderoso –como se Deus fosse um agente imobiliário. Esta linguagem não tenta somente impedir qualquer tipo de contestação à conexão judaica com a Palestina, senão que também procura especialmente punir e marginar os que atacam a legitimidade desta experiência colonial moderna.

Mas este pensamento coletivo não chega a lugar nenhum, não faz mais do que ocultar, distrair, desviar, esquivar e diminuir e não nos encontramos mais perto de uma solução satisfatória... porque a premissa é falsa.

Não há solução para este problema. É o tipo de crise na qual você constata o fracasso, vê os erros e os corrige. O problema é Israel. É a última experiência colonial dos tempos modernos, uma experiência praticada no exato momento en que esses projetos afundavam no resto do mundo.

Não há «conflito palestino-israelense» pois isto daria a entender que há certa igualdade no poder, o sofrimento e os elementos concretos a serem negociados. Mas não existe a mais mínima simetria nesta equação. Israel é o ocupante e o opressor. Os palestinos são os ocupados e os oprimidos.

O que deve ser negociado? Israel tem todas as cartas na sua mão. Podem devolver terras, bens, direitos, mas até isso é um absurdo –porque o que se faz com o que resta? Por que não devolver todas as terras, todos os bens e todos os direitos? Por que teriam eles o direito de conservar algo? É a apropriação de terra e bens antes de 1948 fundamentalmente diferente da apropriação de terra e bens depois da arbitrária data de 1967?

Qual é a diferença entre os colonialistas de antes de 1948 e os que colonizaram e se instalaram em terras palestinas depois de 1967?

Permitam que me corrija: os palestinos têm uma carta em suas mãos que faz Israel salivar a sua grande revindicação na mesa de negociações que parece conter todas as outras. Israel aspira ao reconhecimento de seu «direito de existir».

Mas Israel já existe, não é?

Na realidade, o que Israel teme mais do que nada é a sua «deslegitimação». Trás as aparências, existe um Estado construído sobre mitos e narrações, protegido unicamente por um gigante militar, com milhares de milhões de dólares em ajudas dos Estados Unidos e com o veto no Conselho de Segurança da ONU. Não tem mais nada entre este Estado e seu desmantelamento. Sem estas três coisas, os israelenses não morariam numa entidade que se tornou no «lugar mais perigoso do mundo para os judeus».

Retirem o discurso e o verniz da propaganda e perceberão rapidamente que Israel nem sequer tem as bases de um Estado normal. Após 64 anos não tem fronteiras. Depois de seis décadas, nunca esteve tão isolado. Depois de meio século, precisa de um exército gigantesco para impedir simplesmente que os palestinos entrem a pé a sus casas.

Israel é uma experiência fracassada. Está ligado a um aparelho que mantém seus sinais vitais estáveis. Se esses três aparelhos forem desligados do cadáver, sobreviveria unicamente na mente de alguns estrangeiros que se enganaram gravemente pensando que o roubo do século seria possível.

Tudo o que podemos fazer diante do enfoque de um só estado é nos desfazer rapidamente da velha linguagem. Mesmo assim, nada era verdade -não era mais do que a linguagem empregada num «jogo» específico.

Desenvolvamos um novo vocabulário de possibilidades. O novo estado será o nascimento de una grande reconciliação da humanidade: muçulmanos, cristãos e judeus viverão juntos na Palestina, como o fizeram anteriormente.

Os detratores podem ir embora para bem longe. A nossa paciência diminui como o pano das barracas nos campos do purgatório onde moram os palestinos faz três gerações.

Estes refugiados explorados por todos lados têm direito a belos apartamentos -como esses que têm piscina no térreo e um jardinzinho com coqueiros na entrada. Porque a indenização que devem para eles por este fracassado experimento ocidental sempre será insuficiente.

E não, ninguém odeia os judeus. Este é o argumento de último recurso que fica e com o qual nos deixam surdos –é a última barreira para proteger este Frankenstein israelense. Não me interessa para nada escrever as frases habituais para provar que não odeio os judeus. É impossível de comprovar e francamente o argumento não é mais do que um álibi. Se os judeus que não viveram o holocausto ainda sentem a dor, que se virem com os alemães. Que exijam para eles uma parte importante de terras na Alemanha -e que tenham boa sorte.

Em relação aos antissemitas que ficam com água na boca assim que veem um artigo que ataca Israel, que vão catar cocos, vocês fazem parte do problema.

Os israelenses que não quererão compartilhar a Palestina como cidadãos iguais com a população palestina indígena, aqueles que não quererão renunciar ao que teve que renunciar a população palestina faz 64 anos, que peguem seu segundo passaporte e retornem para as suas casas. Os que ficarem, o melhor que podem fazer é adotar uma atitude positiva. Os palestinos mostraram a sua capacidade de perdoar. O nível da carnificina que têm sofrido por parte dos seus opressores -sem resposta comparável- demonstra uma possibilidade de aguentar e uma fé notáveis.

Será menos a morte de um estado judeu do que a desaparição dos últimos vestígios do colonialismo moderno. Será somente um ritual de passagem, tudo vai dar certo. Neste momento em especial do século XXI, somos todos, universalmente, palestinos, e corrigir esta injustiça constituirá uma prova da nossa humanidade coletiva e ninguém tem o direito de ficar com os braços cruzados.

Israel não tem direito de existir. Rompam a barreira mental e digam: «Israel não tem direito de existir». Deleitem-se, mandem um tuite e escrevam no seu Facebook e façam tudo isso sem pensar duas vezes. A deslegitimação já está aí, não tenham medo.

Palestina será menos dolorida que Israel.

Tradução: América Latina Palavra Viva.


Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.