No seu dia, ilustrando o mesmo com o filme do chinês Yimou "O caminho para casa", dediquei um artigo a este tão valioso tema na minha série de "As Aulas no Cinema", no qual propunha a realização de um plano de atividades didáticas com os nossos estudantes dos diferentes níveis educativos. O Dia dos Namorados ou Dia de São Valentim é uma data especial e comemorativa na qual se celebra a união amorosa entre casais, e também entre noivos e namorados, sendo comum a troca de cartões e presentes com simbolismo de mesmo intuito, tais como as tradicionais caixas de bombons. Em Portugal, assim como em muitos outros países, comemora-se no dia 14 de Fevereiro. No Brasil, a data é comemorada no dia 12 de junho, véspera do dia de Santo António, também conhecido pela fama de "casamenteiro".
A história do Dia de São Valentim remonta a um obscuro dia de jejum tido em homenagem a São Valentim. A associação com o amor romântico chega depois do final da Idade Média, durante o qual o conceito de amor romântico foi formulado. O bispo Valentim lutou contra as ordens do imperadorCláudio II, que tinha proibido o casamento durante as guerras acreditando que os solteiros eram melhores combatentes. Além de continuar celebrando casamentos, ele casou secretamente, apesar da proibição do imperador. A prática foi descoberta e Valentim foi preso e condenado à morte. Enquanto estava preso, muitos jovens lhe enviavam flores e bilhetes dizendo que ainda acreditavam no amor. Enquanto aguardava na prisão o cumprimento da sua sentença, ele apaixonou-se pela filha cega de um carcereiro e, milagrosamente, devolveu-lhe a visão. Antes da execução, Valentim escreveu uma mensagem de adeus para ela, na qual assinava como "Seu Namorado" ou "De seu Valentim".
Considerado mártir pela Igreja Católica, a data de sua morte – 14 de fevereiro – também marca a véspera de lupercais, festas anuais celebradas na Roma antiga em honra de Juno (deusa da mulher e do matrimónio) e de Pã (deus da natureza). Um dos rituais desse festival era a passeata dafertilidade, em que os sacerdotes caminhavam pela cidade batendo em todas as mulheres com correias de coiro de cabra para assegurar a fecundidade. Outra versão diz que no século XVII, ingleses e franceses passaram a celebrar o Dia de São Valentim como a união do Dia dos Namorados. A data foi adotada um século depois nos Estados Unidos, tornando-se o The Valentine's Day. E na Idade Média, dizia-se que o dia 14 de fevereiro era o primeiro dia de acasalamento dos pássaros. Por isso, os namorados da Idade Média usavam esta ocasião para deixar mensagens de amor na soleira da porta do amado ou amada.
Atualmente, o dia é principalmente associado à troca mútua de recados de amor em forma de objetos simbólicos. Símbolos modernos incluem a silhueta de um coração e a figura de um Cupido com asas. Iniciada no século XIX, a prática de recados manuscritos deu lugar à troca de cartões de felicitação produzidos em massa. E também em Portugal aos famosos e lindos lenços de namorados, tema sobre o que no seu dia Isaac Estraviz dirigiu uma tese de doutoramento. O dia de São Valentim era até há algumas décadas uma festa comemorada principalmente em países anglo-saxões, mas ao longo do século XX o hábito estendeu-se a muitos outros países. No Brasil, a data é comemorada no dia 12 de Junho por ser véspera do 13 de Junho, Dia de Santo António, santo português com tradição de casamenteiro. Para o presente artigo escolhi desta vez um lindo filme, em que se apresenta com grande sensibilidade o amor na adolescência e o amor na ancianidade. Sob o título de "Do rosa ao amarelo", foi dirigido em 1963 pelo diretor Manuel Summers, já desaparecido.
Ficha técnica do filme:
Título original: Del rosa al amarillo (Do rosa ao amarelo).
Diretor: Manuel Summers (Espanha, 1963, 87 min., preto e branco).
Roteiro: Manuel Summers. Fotografia: Francisco Fraile. Música: Antonio Pérez Olea.
Produtoras: Impala S. A. e Eco Films S. A.
Atores: Cristina Galbó (Margarita), Pedro Díez del Corral (Guilhermo), José Vicente Cerrudo (Valentim), Lina Onesti (Josefa), Maria Jesus Corchero, Valentín de Miguel, Pilar Gómez Ferrer, Maria Hevia, Celia Mendoza e Antonio Alfonso Vidal.
Prémios: Concha de Prata e Melhor Filme de Fala Castelhana no Festival de Donostia (1963).
Argumento: O filme está composto de duas histórias consecutivas e independentes entre si. O único nexo entre ambas é o amor nos dous extremos da vida de uma pessoa: a adolescência e a madurez. Na primeira história, que se apresenta sob a epígrafe de "Do Rosa...", Guilhermo, de doze anos, está perdidamente apaixonado pela Margarita, de treze. Ambos pertencem ao mesmo grupo de crianças e adolescentes dum bairro abastado de Madrid. Guilhermo sabe pelas suas pequenas amigas que a Margarita também gosta dele, e o confirma jogando às prendas quando recebe um beijo da Margarita na sua bochecha, que tinha sido desafiada a beijar o rapaz de que mais gostasse. Guilhermo passa o dia a imaginar histórias românticas em que impressiona a Margarita, descurando os seus estudos. Está muito preocupado por ser pequeno e reza para crescer depressa e converter-se logo num homem robusto e peludo digno de ser o namorado da Margarita. Ao chegar o verão tem de se separar porque a Margarita vai com os seus pais para a praia e a ele o mandam a um acampamento. O Guilhermo não esquece a Margarita durante este período, continua a passar o dia a pensar nela e escreve-lhe cartas de amor. A Margarita, porém, conhece um moço de 18 anos e faz-se namorada dele. A Margarita parte o coração ao Guilhermo quando lho diz e devolve-lhe a pulseira que este lhe tinha oferecido. Sem consolo Guilhermo risca o nome da Margarita do coração que tinha desenhado no seu livro de matemática, mas de imediato o volta a pôr, porque apesar de tudo continua a amá-la.
A segunda história, sob a epígrafe "...ao Amarelo", trata de um casal de anciãos, Valentim e Josefa, que moram num lar de idosos, situado em Toledo. Amam-se em segredo, mandando-se cartas de amor às escondidas para que as freiras que regem o asilo não se deem conta. Um dia Valentim decide escapar do lar e viver uma nova vida e pede à Josefa que o acompanhe, mas a Josefa tem medo, e diz-lhe que é uma loucura e que não irá com ele. Valentim comenta que ele não pode viver assim e que há de esperar até a uma da madrugada para o caso de mudar de opinião. Josefa sente-se incapaz de o acompanhar e chora a perda do seu amor, mas na manhã seguinte comprova com alegria que Valentim não a abandonou e que ficou por ela, ao vê-lo sentado no banco de sempre no pátio.
Filme que amostra que o amor não tem idade:
Estamos perante uma obra-mestra do nosso cinema, um dos filmes mais intimistas e pessoais da cinematografia do país na sua história, uma obra que brota do imaginário de uma personalidade única da arte espanhola, o muitas vezes subvalorizado Summers, um autor maldito que exerceu a sua mestria tanto no universo cinematográfico como no do humor gráfico. Descendente de uma família irlandesa instalada na Andaluzia, onubense de coração e madrileno de adoção, foi este o cineasta com menor apoio no seu momento por parte da crítica, dentro da geração de realizadores fílmicos que configuraram o denominado Novo Cinema Espanhol, e entre eles, Saura, Camus, Martín Patino, Regueiro ou Picazo.
O filme de Summers é um dos que melhor soube expressar o maravilhoso e por vezes doloroso que é o amor, o que faz de uma forma genial, sem apostar pela virulência nem o fatalismo, senão escolhendo a ironia, o bom humor e a nostalgia como armas, para construir um poema em verso cinematográfico que escapa do pessimismo e das atitudes negativas, para falar de um dos temas que mais pessimismo e infelicidade gerou no ser humano ao longo da existência, isto é, o desamor, o desengano e o amor em geral. A fita é uma das mais belas poesias que se escreveram sobre o amor entendido como um ato devastador da inocência que mora nos nossos corações, a qual depois da chegada das artes de Cupido, é dinamitada uma vez descoberta a amargura que vive no mundo dominado pelos adultos. No processo de industrialização e mudança após os diferentes Planos de desenvolvimento iniciados em 1959, o cinema inicia uma tíbia crítica ao regime franquista, e Summers tomou um caminho diferente ao dos seus companheiros de geração com este seu filme. Provavelmente porque Summers sempre foi uma grande criança, que se negava a que o desencanto se apoderasse da sua vida, e isto fica refletido nesta sua primeira obra fílmica. Na qual aparece uma forte crítica construída a partir do humor contra a hipocrisia e o puritanismo mal-entendido, sobretudo através do uso da caricatura burlesca para retratar a personalidade dos adultos que aparecem na trama, desde os professores, passando a padres, freiras, cuidadores e pais das crianças, que carecem da sensibilidade necessária para entender e transformar o mundo que os rodeia.
Uma ideia fascinante que aparece no filme é a de emparentar, através de dous episódios independentes, mas intimamente relacionados, as duas épocas vitais em que a inocência ganha a partida à madurez, que não são outras que a infância pré-adolescente e a solitária velhice, dous universos paralelos separados só pelos anos de experiência. E esta conexão está elaborada de forma magistral através do uso de uma linguagem cinematográfica próxima em que prima a singeleza, a autenticidade, o vitalismo e a (des)ilusão, tudo condimentado com as adequadas gotas de morrinha, que é relembrada através dos magníficos boleros de outrora, como "Mirando al mar" de Jorge Sepúlveda, "Por qué te conocí?" de Ricardo Gabi,"Toda una vida" de Antonio Machín, e uma especial menção para os nostálgicos com os acordes de "Yo soy aquel negrito" do anúncio famoso do Colacao.
Summers desenha uma emocionante viagem desde O Rosa, com a miragem da juventude e a descoberta do misterioso primeiro amor e os seus narcóticos efeitos, no decorrer da vida dum travesso e curioso pré-adolescente, ao Amarelo, a idade adulta, o crepúsculo da vida e dos sonhos que igualmente é um terreno propício em que tem cabimento o achádego do namoramento tardio e entusiasmante longe dos convencionalismos sociais que desterram os nossos idosos a tristes asilos e lares de idosos, em que morrem em vida, esperando a chegada da morte, estruturando o roteiro por meio de dous episódios que refletem perfeitamente a atmosfera descrita. No primeiro, Guilhermo experimentará o nascimento do primeiro amor, mas também há ser testemunha direta do seu primeiro desengano vital, aquele que nos descobre que a vida não é o caminho de rosas que a infância oculta aos nossos olhos inocentes. Com estilo quase autobiográfico o realizador relata em belas imagens as primeiras brincadeiras infantis que dão lugar ao primeiro amor. São muito belas as sequências em que o rapaz fica fascinado ao descobrir as axilas com pelo da Margarita, que geram muitas perguntas a fazer ao seu irmão sobre o que viu, ao não deixar de pensar nem por um minuto no seu amor. E também aquela em que, com a sua namorada ausente na praia, ele imagina o seu reencontro, ao lado do mar que lhe descreve ela nas suas cartas, escutando ao mesmo tempo a cantiga Mirando ao mar.
No segundo episódio, de duração mais breve, mas igualmente brilhante, o diretor plasma a breve história de amor de dous solitários velhos que malvivem num asilo sem nenhum contacto humano que forneça o carinho de que a inocente terceira idade precisa para respirar. A vida reduz-se a olhar como o tempo transcorre, fechados entre as paredes do lar de idosos, sendo a assistência a missa o único momento que permite escapar ao enclausuramento residencial. No entanto, o ambiente tedioso e triste que mora no asilo é vencido pelos protagonistas por meio do nascimento de um pícaro e proibido amor forjado através do envio de românticas cartas, em que se declaram o seu amor incondicional. Infelizmente o absurdo, rígido e estrito controlo que ali impera, impede culminar definitivamente o relacionamento amoroso. Daí que Valentim elabore o projeto de fuga, finalmente frustrado, com a sua Josefa, do cárcere vital em que ambos moram, impondo-se o realismo da namorada. As cenas destes momentos são muito belas, apresentando uma formosa história de amor crepuscular, na qual a idade e a vinda de uma morte certa não são obstáculos para continuar a acreditar no amor e na felicidade para além do incerto futuro, fazendo um apelo ao amor sem idade nem fronteiras. Estamos perante um filme, este de Summers, e nunca melhor dito, enormemente fresco, moderno ainda hoje e magnético como desde o primeiro dia, uma linda metáfora hipnótica e deliciosa sobre os misteriosos recantos e encantos que percorrem os corações dos humanos, como os dos protagonistas da fita, adolescentes e adultos.
Temas para refletir e elaborar:
Depois de ver o filme, utilizando a técnica de dinâmica de grupos do "cinema-fórum", debater sobre os aspetos fílmicos do mesmo, o roteiro e a linguagem cinematográfica utilizada por Summers, os planos, os movimentos de câmara, o uso do tempo e do espaço e outros recursos fílmicos que aparecem nesta interessante obra cinematográfica. Também sobre as interpretações dos diferentes protagonistas, a fotografia, a representação do presente e do passado, as cenas mais conseguidas, o uso dos recursos fílmicos em cada momento e a música.
Elaborar um grande mural, com fotos, textos, frases, poemas e legendas sobre o Amor e o Dia dos namorados. Na elaboração devem participar os alunos e os seus professores, fornecendo ideias e trabalhos. O trabalho pode completar-se elaborando os estudantes monografias em grupos, seguindo a técnica freinetiana da Biblioteca do Trabalho, que depois podem ser editadas ou policopiadas. E mesmo se pode editar uma revista monográfica sobre tão interessante tema e a sua importância ao longo do tempo.
Podia ser muito lindo organizar um certame poético sobre o Amor entre os estudantes e também recitais poéticos de poemas dedicados ao amor por grandes literatos, como os que a seguir se resenham em anexo.
Anexo: Poemas de Amor:
Sinto que te amei, por R. Tagore
Sinto que te amei
em inumeráveis formas,
em inumeráveis épocas,
vida após vida,
era após era, sempre.
O meu coração enfeitiçado
fez e refez
o colar de canções
que aceitaste como prenda,
que usas ao pescoço
nas tuas muitas formas,
vida após vida
era após era,
para sempre.
Sempre que ouço antigas
histórias de amor,
a sua dor sem idade,
o antigo conto da separação
e do reencontro,
quanto mais penso no passado,
no fim, eis que tu emerges
envolta na luz
de uma estrela polar,
penetrando a escuridão dos tempos:
tornas-te uma imagem
do que é para sempre recordado.
Poema de Camões sobre o amor:
Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que se ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade
É servir a quem vence o vencedor,
É ter com quem nos mata lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade;
Se tão contrário a si é o mesmo amor?O AMOR, por Fernando PESSOA :
O AMOR, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.
Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente...
Cala: parece esquecer...
Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
P'ra saber que a estão a amar!
Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!
Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...José Paz Rodrigues é académico da AGLP, Didata e Pedagogo Tagoreano.