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290814 willy-toledo-pablo-iglesiasEstado espanhol - Diário Liberdade - [Guillermo "Willy" Toledo, tradução do Diário Liberdade] Oferecemos a tradução para a nossa língua do longo texto em que Willy Toledo critica as posiçons e funcionamento de Podemos, novo fenómeno político e mediático no Estado espanhol.


Porque eu não posso

Há poucos dias publiquei um tweet -malditos 140 carateres, que, como diz nosso amigo Pascual Serrano em seu livro "A comunicação jibarizada. Como a tecnologia mudou as nossas mentes". Ed Península-Atalaya, onde explica como este tipo de redes sociais serve aos interesses dos que mandam, que pretendem um mundo em que cada dia simplifiquemos mais as mensagens e, portanto, entendamos menos os conteúdos, a realidade— estabeleci uma analogia entre o "fenômeno" Podemos de nossos dias, e o PSOE de finais dos 70 e começos dos 80. Não qualifico este último de "fenômeno", pois considero que, em termos gerais, e passado o tempo, é bem mais fácil de entender e, portanto, de decifrar que o primeiro.

Considerando o dito no parágrafo anterior, penso que, para um maior entendimento —começando por mim— do conteúdo de fundo de dito tweet, acho necessário escrever este texto, com a intenção de esclarecer as coisas. Muita gente tem-mo pedido, portanto é para mim uma obrigação, mas é também um desejo. Não fui nunca de atirar a pedra e esconder a mão, portanto, aqui estão os meus argumentos.

Sou muito consciente de que uma revolução comunista libertária, na conjuntura atual, é uma utopia- que, por outra parte, como diz Eduardo Galeano, é como perseguir o horizonte, ?a cada dois passos que dá, ele se afasta mais dois, então? Pára que serve a utopia?. Serve para isso: para caminhar?- , mas se tenho claro que, as únicas opções que temos de alcançar uns mínimos de Liberdade, solidariedade, justiça social, direitos políticos e civis para tod@s, minorias várias e maiorias -as mulheres, a classe operária, l@s pobres- são abordar discursos e políticas valentes e decididas, também instructivas, enriquecedoras, que gerem consciência e por tanto militância, em torno do anticapitalismo em todas suas vertentes, —"livre" Mercado, militarismo, educação, exploração operária, cultura, patriarcado, monopólio nos meios, sobreexploração de recursos caros e finitos, destruição ecológica, imperialismo, violência, competitividade, transgênicos, Wall Street e outras sacas, especulação imobiliária e alimentária, trata de mulheres, maus tratos e torturas policiais, exploração infantil, privatizações do público, dos recursos estratégicos, banca privada predadora e usurera, portas giratórias, corrupção... etc.

A minha analogia entre Podemos e o PSOE —como diz meu amigo Diego Cañamero: está a Telefônica, está a Repsol, está a PESOE— sem ser literal, e não se devendo tomar como tal —malditos 140 carateres— sim opino que têm muitos elementos que os tornam similares.

O povo trabalhador explorado -não tudo- cansado de suportar anos de exploração e falta de justiça -37 anos em ambos casos, Ditadura-Democracia- , de redução, quando não agressão, a seus direitos coletivos e individuais, de repressão, de observar como a oligarquia capitalista vontade sempre a costa do suor e o trabalho da classe operária, harto de que as classes privilegiadas os tomem por imbecis em suas próprias caras e em suas próprias casas através do televisor, decidem que já está bem, que toca lutar, que há que tomar partido, que toca uma mudança radical, onde as estruturas de poder dêem um giro de 180ou e caiam em mãos da maioria social, dos trabalhadores. E chegou a "Transição".

A "Transição" não começou, como nos conta o relato oficial, em 1975, à morte do Ditador. Tudo começou muito antes, em meados dos 60, quando os oligarcas do capital, os EUA, e a socialdemocracia europeia puseram seus olhos —suas garras, antes— Na Península Ibérica, com o objetivo de pilotar, e adaptar a seus próprios interesses, nos anos vindouros depois da morte dos ditadores Franco e Salazar. Todo devia ficar "atado e bem atado" para dirigir a partir de fora, com a conivencia rasteira e traidora de políticos vendidos no interior, e a cumplicidade e colaboração interessada da plutocracia nacional, para que ambos Estados, Espanha e Portugal, se submetessem às políticas econômicas, financeiras e militaristas dos interesses transnacionais. Devíamos ser uma "Democracia homologable", como dizem agora, às do resto do mundo Ocidental, osea, a Democracia real —sem o JÁ, faz favor —, quanto mais longe, melhor. As consequências estão aqui, vemo-las, sofremo-las todos os dias. Também é no final dos 60 quando começam as greves, as lutas dos operários e as estudantes, o espírito da Rebelião, os anseios de uma sociedade livre.

A "modélica" e "pacífica" Transição, que se cobrou a vida de centos de homens e mulheres que optaram por dar a batalha para uma ruptura total com o regime fascista do Generalísimo.

Quem não caiu, sofreu a repressão, a perseguição, as torturas e o cárcere. Essa "Transição" que supôs, basicamente, a lavagem de cara de todas as instituições da ditadura —Banca, exército, policial (Brigada Político Social-Brigada de Informação), imprensa (J.L Cebrián RTVE-El País), tribunais (TOP-Audiência Nacional), Igreja Católica Apostólica Pederasta e Romana, políticos colaboracionistas (Fraga, Suárez)- e converteu-as, a todas e a todos, em democratas de toda a vida.

Teve um momento, e bem que o sabiam as classes privilegiadas, de dentro e fora do estado, no que o ambiente político começou a adquirir um caráter pré-revolucionário. Os sindicatos de classe do momento —CNT E CC.OO sobretudo, no âmbito estatal— tinham mais força que nunca desde a II República — o C.N.T convocou uma mitin multitudinario em Barcelona, o 2 de Julio de 1977, ao que assistiram 1.500.000 de militantes, que em uns meses mais tarde terminou como terminou— greves, manifestações, milhares de militantes conscientizados e politizados que se jogavam à rua dispostos a deixar a vida por criar uma autêntica mudança rupturista, e a Revolução dos Cravos em Portugal, de caráter claramente comunista em seu princípio, que assustou muito as social-democracias europeias e aos mandarins do Império, e deu fôlego, forças e ilusão a todas as revolucionárias ibéricas. Isto tinha que o parar.

E a reação encontrou sua solução.

Na Transição-transação, surgiu um partido político da noite para o dia, da nada mais absoluta, no que todos cabiam, pois ninguém era, que se teve que rechear com milhares de homens e mulheres de todos os recantos, de todos os pensamentos, de todas as ideologias, de centemas de carreiristas que, ao cheiro dos milhares de milhões de pesetas a repartir, provenientes da social-democracia capitalista e otanista alemã —Fundação Ebert— lhes proporcionaria um futuro mais que cômodo nos também milhares de cargos a rechear, a repartir. O PSOE do interior. Inexistente até esse momento, pois os líderes históricos do partido encontravam-se todos no exílio. Teria que dizer, que repetir, que quem se trabalharam a luta no interior, quem sofreu a perseguição, as detenções, as torturas e o cárcere, que foram assassinados durante os 37 anos de ditadura, foram os militantes do PCE, e das diferentes Organizações anarquistas. Carrillo? Nem esteve, nem o esperavam.
Até que voltou, e assim nos foi.

Surgiu um líder, —Felipe González, alias "Isidoro"—, para se armar em valente militante clandestino que jamais foi também do nada, um messias, um jovem bonito e carismático, um
advogado burguês, um "intelectual" que tudo sabia. Que tudo o resolveria, que desprezava profundamente à classe operária e que, com a condescendência habitual nos tipos da sua ralé, —não sem antes assinar todos os contratos que o capitalismo internacional lhe pôs sobre a mesa: a monarquia —a sua, eu não tenho nem deuses, nem reis, nem amos—, a NATO, a UE, a desindustrialización, as ETTs, a venda, em fim, a traição à classe trabalhadora de quem se diziam Socialistas e Operários ? olhando acima do ombro, dizia-nos: "deixem-me a mim, que eu seja". Articulou um discurso vazio e cheio de palavras sem transfundo, de mentiras: "Há que falar assim às pessoas, para elas entenderem". Enfim, isto, e o resto, já é história, história conhecida.

A não menos "modélica democracia" posterior, cobrou, e continua a cobrar a vida –Lasa e Zabala, por pôr só um exemplo– nas esquadras das Forças de Segurança do Estado capitalista e plutocrata de centenass de operári@s empurrados de suas varandas pela Máfia bancária, @s juízes e as referidas "Forças de Segurança", de milhares de trabalhadores nesses "efeitos colaterais" que são os "acidentes" laborais, de dezenas de milhares de trabalhadoras migrantes incapazes de contornar esses muros invisíveis da vergonha que são suas fronteiras –que não minhas– e o Estreito de Gibraltar. Está-se cobrando o direito à digna existência de centenas de milhares de despejados, jovens sem futuro, assalariadas com salários de miséria, explorados, perseguidas e presos políticos –Otegi, Alfon, grevistas e centenas mais– trabalhadores migrantes e um longuíssimo et cetera que já todas conhecemos.

O povo explorado, humilhado, farto de ser sempre o perdedor desta guerra de classes interminável, começa de novo, após anos abducido pelo discurso do "Espanha vai bem" do senhor Aznar, e o "jogamos na champions league da economia mundial" do senhor Zapatero, tomando consciência de que as mensagens cínicas e hipócritas, falsas, dos políticos no poder não se correspondiam com a sua própria realidade, começam também a protestar, a se organizar –não como massa explorada, como povo humilhado, mas a nível setorial, manipulados pelas cúpulas dos sindicatos vendidos ao patronato (CCOO, UGT), um erro grosso, em minha opinião, tão grave que nos dirigia para o caminho da derrota– e a sair à rua. A tomada de consciência ..em demasiados casos da perda individual de seus direitos, como sujeitos, e não como massas, o que impede a unidade e, portanto, diminui notavelmente as possibilidades de vitória– deu passagem à indignação, e isto à mobilização.

E surge um partido político, de nome Podemos ("Yes we can", Seleção espanhola de futebol). Um partido que levo meses analisando, e cujas conclusões, a risco de me equivocar, seguramente equivocado, são as seguintes:

Os postulados "políticos" de maior profundidade surgidos do 15-M: "não somos de esquerda nem de direita", "não nos representam", "todos os políticos são iguais", "somos os de baixo, e lutamos contra os de cima", "socialismo e comunismo são termos obsoletos", "nem bandeiras de partidos, nem seus representantes e militantes", "no hay pan para tanto chorizo", "a violência está muito muito feia, e deslegitima a luta", "se a polícia vier, tirem as uvas e dissmulem", DRY, bailes, batucadas, caras pintadas do arco íris, mãos para o ar enquanto a polícia nos corre à porrada, o triste, altivo, prepotente e ignorante desprezo a todas e todos os militantes anteriores ao maio de 2011, dia em que começou a "autêntica e única luta política onde antes nunca nada houve", em que "começaram a correr os relógios"... esse movimento em que todos cabiam, onde se celebravam "assembleias" cujas decisões, ou são adotadas por maioria absoluta, por "consenso", ou são desprezadas... enfim, esse íman para manipuladores, direitistas, populistas, ignorantes políticos, infiltrados policiais, etc, etc; esse movimento que, em minha opinião, foi, salvo exceções, tão prejudicial para a luta de classes, para a tomada de verdadeira consciência política da classe operária, para que sejamos capazes de identificar os nossos autênticos inimigos. Esse falso assemblearismo, essa "horizontalidade", esse claro e destrutivo interclassismo, serviu, e foi utilizado, em grande parte, pelo partido Podemos.

Repassemos primeiro o discurso:

É evidente que as "coincidências" são mais que visíveis com a atitude "na boa" de "comeflores", antipolítico, vazio e para todos os públicos do 15M, só que, neste caso, elaborado a fundo nesse laboratório de intelectuais, professores e alunos universitários de CCPP -que não CCCP- (onde estava a classe operária?) da UCM, "pensando" esse passo à frente chamada "Operação 'Coleta' - Totó" (personalismo nenhum), ao refúgio do recente e inesperado "ao menos para mim, cujo discurso imediatamente anterior era decididamente de esquerda, embora no seu programa, La Tuerka, se empenhasse em demonstrar "pluralidade" convidando sujeitos da ultradireita sem nada para enriquecer o debate- auge mediático do senhor Iglesias. Este é, mas não só, seu discurso : "nem de esquerda, nem de direita" (social-democracia? tenho claro que não são de direitas), "a gente" (também diretores de banco ladrões, empresários exploradores, anti-motins ultraviolentos?) , a "cidadania", (também Botim, a Duquesa de Alva, Lara, Amancio Ortega, Koplovitch...), os "democratas", (Rajoi, Solana, González, Sáenz de Santamaría, Zapatero dizem-se democratas, então, a que "democratas" é que se dirigem?), "uma nova Transição", (medo não, pavor), "Keynesianismo", (capitalismo "humano"?), "país sério", (Rajoy dixit, dixit e mais dixit), "dação em pagamento", ( sem dívidas, fruto de um assalto à mão armada, que bom!, mas todas à puta rua, que os bancos mandam, e não há casas vazias construídas com dinheiro público. Ou privado), e, acima de todos eles, o inigualável, o único, a máxima incontestável, repetido até a saciedade, até o cansaço, até o vómito, o grande achado das mentes superiores do grande Concílio de pensadores; senhoras e senhores, com todas vocês... A CASTA!. Sim, essa que tudo o explica, a que para tudo serve, aquela contra a que, se lutarmos, trará a solução, a felicidade, a Democracia.

O problema, em minha opinião, das organizações nascidas da "casta" -ouça, que eu também sei dizer o intelectual, burguês, universitário, que pouco pisaram a rua, que pouco viram de primeira mão as consequências do capitalismo: miséria, exploração, falta de água, de eletricidade, bairros de lata, analfabetismo, etc... criadas totalmente à margem da classe operária, - sim senhores, sim, A CLASSE OPERÁRIA, a maioria da população, embora muitos ainda não o saibam, ou deixaram do saber graças ao "milagre espanhol"- é que termina lutando por seus próprios interesses de classe, e, finalmente, dos das classes dominantes que os colocaram na celebridade mediática, sem cuja projeção, voltariam ao silêncio, ao anonimato. Isso, num partido onde "todos cabem", interclassista, é o destino final inexorável. Exemplos sobram. Nem uma só palavra, no seu discurso, sobre a propriedade dos meios de produção, a entrega dos mesmos a quem parte as costas para sair adiante, a reforma agrária, -expropiarão as terras baldias da Duquesa de Alva, e outros latifundiários, para entregar às jornaleras e camponeses?. A socialização, a proibição da banca privada que tudo o manda, a saída da NATO, a UE, o Euro, a expulsão imediata de agentes chantgistas e criminosas do FMI, do BM, a OMC,?

Em minha opinião, a armadilha mortal e sem saída que a oligarquia capitalista internacional nos colcou, onde, dentro de suas estruturas, é impossível uma saída à Democracia, à justiça social -os 70.000 presos em seus cárceres para pobres- (não aos cárceres do estado assassino, não mais esconder os erros do sistema de A Polla Records), os presos políticos, -não são quase todos os presos, presos políticos- nem palavra das torturas, da limpeza de sádicos fascistas nas filas da policial, -que, aliás, também estão convidados a Podemos. A polícia, digo, sádicos ou não -, silêncio absoluto, e covarde do senhor Iglesias quando, adiante das suas trombas, nos seus muitos "debates" televisivos, se ataca e mente de maneira descarada e desprezível sobre a Venezuela, sobre Cuba, Bolívia. Não seria muito simples, e instrutivo, bem mais justo para com nossos irmãos latino-americanos, em vez de ajudar a perpetuar as mentiras sobre estes processos que, é mais que evidente, transformaram suas sociedades e melhorado de maneira inimaginável há 15 anos as condições de vida das classes exploradas, sem extremismo nenhum, simples, com os dados na mão, defender tais processos? Não. Resta votos. "As pessoas" não entendem. Nem palavra sobre a imediata paralisação de todos o É injustificados, condenações, e só condenações, muito sentidas, isso sim, ao genocídio palestino -expulsarão, se chegam ao poder, a toda a representação sionista no Estado, ou se limitarão, como até hoje, a um genuflexo puxãozinho de orelhas? -.

Talvez me engane, mas nunca lhes escutei falar disto: em caso de não entregar os meios de produção, que assino já que nunca farão, aos operários e operárias, estabelecerão um topo salarial em TODAS as empresas, públicas ou privadas, proibindo de imediato que nenhum executivo possa cobrar mais de, digamos, quando muito, o dobro que o resto de trabalhadoras?. São tantas e tantas questões sobre as que não se pronunciam, tantas, que a mim me confunde, me inquieta, e me faz suspeitar. Duvidar. Não confiar.

O argumento de Pablo Iglesias para não adotar este tipo de políticas, ou não fazer sequer menção, no suposto caso de que estivesse de acordo com elas, é que, primeiro: demasiada radicalidade no discurso restaria votos, com o que gosta se gabar ele de que "vêm senhoras que sempre votaram no PP, e dizem-me que, agora, votarão em mim".

Outro argumento é que "precisamos transmitir um discurso que "as pessoas possam entender". Aqui já não sei bem o que pensar. Não suporto essa condescendência e suposta "superioridade intelectual" daqueles que tomam "os cidadãos" por estúpidos, que acham que eles sabem algo que as outras ignoram, que não entenderiam e, portanto, que devem utilizar mensagens o mais simples, que não singelos, possíveis. O discurso vazio. A ausência de ideologia de esquerda, claramente de esquerda, de conteúdos.

Escutei até a náusea, em suas próprias palavras, o "impressionante currículum acadêmico" de Pablo Iglesias. Fico muito contente por isso e dou-lhe a parabéns. Eu, ignorante de mim, não terminei o B.U.P. Falta-me, e precisaria conhecer, um currículum, ao menos tão impressionante, de militância de rua, de trabalhar, junto a outros, olhos nos olhos, pelos direitos dos oprimidos, de tomar partido decidido, militante, nesta luta de classes que, como disse Warren Buffet, um dos homens mais nojentamente ricos do mundo, vão ganhando eles. Eu acrescentaria que por goleada.

Desconfio também de qualquer "líder político" alçado à fama pelos meios de desinformação propriedade, e ao serviço da oligarquia capitalista. Se o fazem é que não temem o seu discurso. Se não temem seu discurso, é que sabem que não supõe perigo nenhum para os seus interesses e a mim, isso, faz-me tremer. Iglesias soltou pérolas como, "depois da queda do muro de Berlim, a dicotomia esquerda-direita ficou obsoleta". Em psicanálise, um "lapsus" é aquele pensamento profundo, essa convicção inconfessável que, sem querer, verbalizas num momento determinado. A Iglesias escapou-lhe um que me pôs os cabelos em pé: "vieram uns tipos, gentalha de classe bem mais baixa que a nossa que?" Alguém que pretende ter de assessor um senhor como Jorge Vestringe, que se reúne, inclusive para negociar, com os neofascistas do Partido X, que compadreia com o PSOE, inclusive com Esperanza Aguirre, que aceita o convite dos empresários exploradores da pior ralé a se reunir com eles nos nefastos pequenos-almoços do Ritz, não merece a minha confiança. Quantas militantes de Podemos tiveram alguma vez a possibilidade de entrar no Ritz? Talvez mais dos que pensamos. O último inquérito do CIS, diz-nos que Podemos desfruta do primeiro posto em intenção de voto nas classes alta e meia-alta. Em profissionais, em servidoras públicas de nível superior e em altos executivos.

O ideário político de Podemos, segundo suas próprias palavras, extraídas de seus programas e estatutos -dos quais depois falarei- é o acatamento da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Lindo e muito poético. Lembremos que a tal Declaração foi redigida por um punhado de homens provenientes das elites burguesas capitalistas, a modo de lavagem de consciência e declaração de boas intenções, sempre incumpridas e assinada por dirigentes de países burgueses capitalistas, - salvo exceções, como Cuba- aditos ao dinheiro e ao crime.

Analisemos brevemente a tal Declaração, de modo geral muito assumível pela esquerda, mas que implica obrigações, muito respeitosas com os direitos humanos, cujo cumprimento, Podemos, dificilmente acatará. Por outro lado, obriga a verdadeiras "leis" claramente inassumíveis para nós, dirigidas a sustentar os privilégios dos capitalistas e que Podemos, sem dúvida, desta vez sim, acatará.

O artigo 14.1 de dita Declaração diz: "Em caso de perseguição, toda pessoa tem direito a buscar asilo, e a desfrutar dele, em qualquer país". Assino e defendo-a. Sem fissuras. Pretende Podemos cumprir com dito artigo, e oferecerá asilo político a todo perseguido, e cuja vida correr perigo, que o solicitar? Eu digo que não. O tempo dirá.

Artigo 15.1 e 2: "Toda pessoa tem direito a uma nacionalidade". "Ninguém será privado/a arbitrariamente da sua nacionalidade, nem do direito a mudar de nacionalidade". Assino, e defendo-a. Sem fissuras. O povo saaraui foi privado arbitrariamente da sua nacionalidade espanhola, numa manobra desprezível tecida pelo Nobel da Paz H. Kissinger, o monarca assassino Hassan II, e o sátrapa Juancar de Bourbon. Devolverá Podemos o legítimo direito à nacionalidade espanhola a todo e toda saaraui que o solicitar? Eu digo que não. O tempo dirá. Artigo 13.1: "Toda pessoa tem direito a circular livremente e a eleger sua residência no território de um Estado". Assino e defendo. Sem fissuras. Derrubará Podemos as criminosas cercas de Ceuta e Melilha, a tecnologia desumana instalada no Estreito e os controles arbitrários e racistas nos aereopuertos nacionais, e permitirá a entrada no Estado de todo ser humano que o deseje, reconhecendo seu direito a se instalar em qualquer de nossas cidades?. Eu digo que não. O tempo dirá.

Estes são alguns dos Direitos Humanos reconhecidos na Declaração Universal, e que Podemos assegura que defenderá. Eu nego que façam tal coisa. Vejamos agora os direitos do capital redigidos na Declaração, e que Podemos também diz que defenderá. E eu asseguro que, desta vez sim, o farão:

Artigo 17.1 e 2: ?Toda pessoa tem direito à propriedade, individual e coletivamente?.
"Ninguém será privado arbitrariamente de sua propriedade?. Esses a rejeição, com uma exceção: considero que todo ser humano tem direito a uma casa em propriedade, já seja pública ou privada, da que ninguém lhe possa jogar. A ver: Reconhece Podemos o direito à propriedade, individual de, por exemplo: 200 casas, habitadas ou não, 50.000 hectares de terreno, a propriedade, individual ou coletiva da água?Eu digo que se. O tempo dirá. Privará Podemos de maneira imediata à Igreja Católica de todas as propriedades roubadas ao povo durante séculos, e impedirá que o sigam fazendo, como há poucos meses nos roubaram a Mesquita de Córdoba, Patrimônio da HUMANIDADE?. Eu digo que não. O tempo dirá.

E por último, que vai sendo hora, e é suficiente brasa, passemos a analisar a suposta horizontalidad e democracia interna repasando alguns pontos de seus estatutos. No capítulo terceiro, ?Órgãos de representação, governo e administração? Encontramo-nos que:

A ASSEMBLEIA CIDADÃ: está integrada por todos os e as filiadas de Podemos. É o ÓRGÃO SOBERANO do partido e reúne-se com periodicidade bianual depois de ser convocada pelo Conselho Cidadão. . Um mas, e não menor: reúne-se a cada dois anos, mediante convocação do Conselho Cidadão.

O CONSELHO CIDADÃO: está composto por 80 membros e organizado por Áreas de Trabalho. Reúne-se com periodicidade trimestral. Seus membros serão eleitos na Assembleia Cidadã através de listas abertas, com um sistema eleitoral maioritário a uma volta. Aqui, nada que objetar, exceto, quiçá, a convocação trimestral que, como veremos mais adiante, tem suas deficiências.

O CONSELHO DE COORDENAÇÃO: (Aqui vemos a "armadilha") é integrado por um número mínimo de dez e máximo de quinze pessoas. Reúne-se com periodicidade mensal. Seus integrantes são nomeados pelo Conselho Cidadão A PROPOSTA DA PORTAVOCÍA, (P.Iglesias). Este Conselho, (P. Iglesias e amigos), e a Porta-Voz, (P. Iglesias), são os ÓRGÃOS EXECUTIVOS de Podemos.Durante os períodos nos que não está reunido o Conselho Cidadão, corresponde ao Conselho de Coordenação, (P. Iglesias e adláteres) dar continuidade à linha política acordada nas Assembleias CIDADÃS e ADAPTAR ÀS CIRCUNSTÂNCIAS DO MOMENTO. Em poucas palavras, se a Coordenadora, (P. Iglesias e adláteres), e a Porta-Voz, (P. Iglesias), têm a potestade de ADAPTAR ÀS CIRCUNSTÂNCIAS DO MOMENTO a linha política acordada nas Assembleias Cidadãs, poderia ser dado o caso de que, por exemplo, se as Assembleias, "soberanas", decidirem que se tem de criar com urgência uma Banca Pública, a Coordenadora, (P. Iglesias e amigos, e o próprio P. Iglesias, Porta-voz), podem decidir que, neste momento, é impossível ADAPTAR ÀS CIRCUNSTÂNCIAS.

A PORTA-VOZ.( por enquanto, e tudo indica que também mais adiante e "por sempre jamais", é P. Iglesias. Trata-se de um órgão individual eleito em sufrágio livre e direto pela Assembleia Cidadã, cada dois anos, mediante um sistema maioritário. Requere-se-ia uma maioria absoluta para a eleição de o/a Porta-voz. Se não se alcançar esta maioria na primeira votação, celebrar-se-á uma segunda convocatória na qual será eleito/a Porta-voz aquele/o candidato/a que alcançar a maioria simples dos votos.

Em resumo: se a Assembleia Cidadã, cujas decisões são SOBERANAS, se reúne cada dois anos, e nesse período, muito longo em política, corresponde à Portavocía, (P. Iglesias), e à Coordenadora, (P. Iglesias e acólitos), ADAPTAR ÀS CIRCUNSTÂNCIAS, quer dizer, evitar, se assim o considerarem oportuno, as decisões da Assembleia. Isto, em minha opinião, confirma, não só a inutilidade e o poder da Assembleia Cidadã, como, e em muita maior medida, o dos Círculos. Em Podemos são, e com toda a probabilidade continuarão a ser, Pablo Iglesias e os seus amigos, os verdadeiros "capos" da organização.

Falta o famoso "direito à revogação da Porta-Voz", copiado, mas não tanto, da Constituição Bolivariana da Venezuela. Nesse país, e pela primeira vez na história constitucional, a Carta Magna oferecia a possibilidade de revogar o Presidente da República. Os requisitos para convocar o Referendo Revogatório?: conseguir as assinaturas de 20% de eleitores.

Conseguiu-se, convocou-se, votou-se e Chavez ganhou. Por pouco, mas ganhou. O caso de Podemos é bem diferente, muitíssimo mais complicado para os filiados. Isto dizem os estatutos em seu Artigo 14.7:

"O/a Porta-voz de Podemos poderá ser revogado de seu cargo através de uma Assembleia Extraordinária convocada a tal efeito. A convocação de uma Assembleia Extraordinária com tal objeto deverá ser formulado a pedido de UM NÚMERO DE FILIADOS SUPERIOR EM AO MENOS 1 AO NÚMERO DE VOTOS COM QUE FOI ELEITO/A PORTA-VOZ NA ASSEMBLEIA ORDINÁRIA QUE O/A DESIGNOU PORTA-VOZ. Um processo de tais caraterísticas não poderá ser iniciado até decorrer, ao menos, num ano natural desde a eleição de o/a Porta-voz".
Quer dizer, que se, por exemplo, Pablo Iglesias fosse eleito por, digamos, 70% dos filiados na Assembleia Cidadã, (percentagem nada de mais, vendo a adoração que o líder suscita), seria preciso 70% mais um voto! de filiados para o remover de seu cargo de Porta-voz, 50%! mais que na Venezuela. Quanto ao suposto financiamento "popular", além dos bancos, que têm partidos e sindicatos sequestrados e ao dispor dos seus interesses, repassemos o seguinte Artigo:

Artigo 18-d: "Serão recursos do partido: Os fundos procedentes dos empréstimos ou créditos que concertarem". Como assim?, mas não tínhamos dito que NADA de empréstimos ou créditos aos Bancos, ou será que pedirão os créditos ao vizinho de baixo? Acho que isto merece uma explicação, não merece?

Enfim, amigas e amigos, se isto é Democracia interna, que vinga Kropotkin e o veja.

Tenho que dizer também que, no mês escasso que fiz campanha por Podemos, em concreto por uma colega do partido, na que mantenho meu total e absoluta confiança, tive a fortuna de conhecer a muitos e muitas militantes de um valor político e de luta incalculáveis.

Gente digna, valente, com anos de luta a suas costas, ou jovens bem formados intelectual e politicamente, motivados e dispostas a trabalhar duro para conseguir que esta sociedade possa ser, num futuro, uma sociedade livre. Operárias, sindicalistas de classe, estudantes, trabalhadores migrantes, mulheres e homens dispostos a dar a batalha desde dentro de uma Organização que esperam seja, a sério, uma ferramenta de transformação, de gerar debate, mudança, fraternidade... uma ferramenta poderosa contra o inimigo comum: o capital e os seus agentes.

Espero de todo coração que o consigam.

Em linhas gerais, estes são meus argumentos, não para abandonar Podemos, pois nunca fiz parte da Organização, mas para expressar por que não considero que Podemos, por eles mesmos, sejam alternativa alguma ao sistema capitalista que nos oprime. É também um chamado de atenção a todos e todas aquelas militantes convencidas, motivadas e muito bem intencionadas que confiam em Podemos como ferramenta real de mudança, de transformação democrática. Tenho a sensação de que, uma nova deceção, uma mais de tantas, seria brutal para as expectativas de tantos, uma nova deceção que sumiria a maioria, a classe operária, numa profunda depressão da que, quiçá, já nunca nos consigamos recuperar.

Falta a pergunta definitiva, que eu mesmo me faço: e então, que? Não sei, não tenho a resposta. A unidade de TODA a esquerda?, sim, mas, quem são a esquerda? Isso pergunto eu a mim próprio. Somos muitos, somos muitas, isso seguro, mas não os suficientes. Falta consciência, falta educação política, não necessariamente académica, falta... sei lá. Não tenho resposta, mas gostava. Continuo a procurar, a tentar, a lutar, aqui e lá, com uns e com outras. Numas lutas, e nas outras. Isso se o sei, há que continuar, ganhar batalhas parciais que, talvez, nos tragam a vitória final. O inimigo é enorme, poderoso, está por toda a parte, também na classe operária. A coisa está, como sempre, muito difícil, embora ache que vivemos dias motivadores, de mudança talvez. Insisto, não sei.

Não acredito no "capitalismo amável". Não acredito no "capitalismo de rosto humano". Não acredito no "capitalismo democrático". Acho que o capitalismo é inimigo da Democracia, da natureza, do planeta, dos animais, dos seres humanos e seus direitos.

Desprezo sem paliativos à socialdemocracia, que tanto nos mentiu, que tanto dor e sofrimento nos impôs.Obrigado por me lerem. Obrigado por me escutarem.

Saúde, amor e revolução para todos e todas, camaradas

Até a vitória sempre!

Guillermo "Willy" Toledo

 


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