1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (0 Votos)

GRAMSCI1-470x260Revista Rubra - [Ivete Simionatto] Há 77 anos, em 27 de abril de 1937, morria o italiano Antonio Gramsci, um dos mais importantes pensadores do século XX.


Em seus 46 anos de vida, dos quais 11 permaneceu como preso político nas prisões do regime fascista, o marxista Gramsci destacou-se como um dos fundadores do Partido Comunista Italiano (PCI), em 1921. Condenado a mais de 20 anos de reclusão, prosseguiu sua batalha dentro do cárcere, escrevendo 33 cadernos com notas sobre temas diversos, que vieram a público somente no final dos anos 1940. Actualmente, o legado de Gramsci extrapola a história de seu país, difundido em “tempos e lugares profundamente diversos”, tornando-o, no mundo todo, um dos autores mais citados e debatidos, tanto no campo das ideias quanto no âmbito das diferentes práticas sociais[1].

É nos Cadernos do cárcere que encontramos a riquíssima herança gramsciana, “uma ciência da política” na perspectiva marxista, cujo elemento central é a relação entre governantes e governados, tendo por gênese a sociedade de classes. Em sua profícua obra encontramos elaborações inovadoras sobre temas como Estado “ampliado”, sociedade civil, hegemonia, intelectuais, nacional-popular, revolução passiva, guerra de posições, transformismo, Oriente e Ocidente, organização da cultura, americanismo e fordismo, filosofia da práxis, dentre tantas outras que se encadeiam no desvendamento da totalidade social. Sua incisiva crítica ao reducionismo económico e o forte elo que estabelece entre cultura, política e economia, permitiram repensar o papel dessas esferas no processo de transformação social, permanecendo extremamente actuais na análise da realidade contemporânea e dos fenómenos políticos em curso na presente crise estrutural do capital.

Além dos Cadernos do cárcere, a obra de Gramsci compreende os Escritos políticos, derivados das centenas de artigos para jornais e revistas, escritos quando militava junto aos operários da Turim industrial. As páginas dos cadernos e os escritos pré-carcerários, no entanto, não revelam o drama humano vivido por Gramsci na prisão. Sua lenta agonia física e moral é minuciosamente descrita nas cartas a amigos e familiares, publicadas postumamente em sua totalidade, nas quais desvenda-se um homem que soube unir pensamento e acção, razão e paixão, e, mediante ampla interlocução com a intelectualidade de seu tempo, captou com extraordinária lucidez e criatividade o legado de Marx, Engels, Lenine, Rosa Luxemburgo e dos grandes pensadores italianos.

Graças às suas reflexões inovadoras no âmbito do marxismo, o pensamento de Gramsci constitui-se, há mais de meio século, em diferentes continentes, como fonte de interlocução privilegiada no debate da política, do socialismo e da democracia. Distanciado dos modismos ideológicos que germinaram com intensidade nos anos 1990, Gramsci manteve-se e prossegue na actualidade como um dos pensadores marxistas mais requisitados no pensar e no intervir na realidade. Debruçou-se na análise da “crise orgânica” do capitalismo nas primeiras décadas do século XX, na desagregação do Estado em seu conjunto, na crise de hegemonia, “processo complexo” que colocava em xeque o conjunto das relações económicas, políticas, sociais e culturais do mundo. É da análise dessas transformações que Gramsci extrai os fundamentos da teoria da hegemonia, um dos eixos centrais da sua elaboração marxista da política.

O legado essencial de Gramsci, presente nas páginas dos Cadernos, é repleto de sugestões que permitem reflectir sobre as situações desafiadoras dos dias actuais e, se aderentes à realidade de sua época, são ricas de “universalidade e capazes de estimular interrogações do passado sobre os acontecimentos do presente”, suscitando “curiosidade e interesse”[2] a  todos aqueles abertos ao novo que ciclicamente irrompe na história e na política. As reflexões sobre a construção de um projecto de sociedade diverso do capitalismo, sonhado e perseguido por Gramsci, permanecem fundamentais para entendermos “esta época complexa de transformações histórica”[3], num movimento de continuidade/ruptura, a fim de que possa ser enriquecido e renovado a partir das novas determinações e das exigências postas pelo processo civilizatório.

Definido por Eric Hobsbawm[4] como uma das maiores expressões do movimento comunista, “um pensador marxista de extraordinária originalidade e riqueza de ideias”, Gramsci configura-se, hoje, presença obrigatória na compreensão da história do movimento operário internacional, na renovação e na defesa do socialismo e no debate sobre os rumos da política e da esquerda,  no conturbado mundo contemporâneo.

* Doutora em Serviço Social e Professora do Programa de Pós-graduação em Serviço Social da Universidade Federal de Santa Catarina – Brasil


[1] Em 1975, Valetino Gerratana organizou, através da Fondazione Istituto Gramsci, a edição crítica dos Cadernos do cárcere, traduzida e publicada em mais de 30 línguas. Em português, no Brasil, tal edição  foi publicada em seis volumes pela Civilização Brasileira, entre 1999 e 2005, organizada por Carlos Nelson Coutinho, Luiz Sérgio Henriques e Marco Aurélio Nogueira. Para ampliar os estudos do acervo categorial gramsciano, a International Gramsci Society organizou e publicou o Dizionario gramsciano, disponível no sítio http://www.internationalgramscisociety.org

[2] Baratta, G. As rosas e os cadernos  - o pensamento dialógico de Antonio Gramsci. São Paulo, Edt. UNESP, 2000.

[3] GRAMSCI, A . Cadernos do cárcere. Tradução de Carlos Nelson Coutinho com a colaboração de Luiz Sergio Henriques e Marco Aurélio Nogueira. Rio de Janeiro: Editora Civilização Brasileira, v. 5, 2002, p.33.

[4] HOBSBAWM, E. Gramsci e la teoria politica marxista. SANTUCCI, A. A. (Org.). Letture di Gramsci. Roma: Riuniti, 1987, p.183.


Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.