Sem ser o intuito deste artigo ao atender a justiça de uma linha ou outra, tentaremos fazer uma breve análise sobre o surgimento desses movimentos, da ótica materialista e dialéctica.
A sua origem mais direta situa-se, na época moderna, nos movimentos burgueses que surgem nas diferentes nações oprimidas no século XIX. Estes eram a amostra de uma contradição entre o carácter cada vez mais centralizado da produção e as diferentes camadas sociais que saíam perdendo na consequente centralização do poder político no Estado (de camadas concretas da burguesia a setores ameaçados da velha sociedade feudal).
Aquelas nações que não tinham uma burguesia o bastante forte como para poder construir um Estado próprio, viram-se submetidas à unificação forçosa dos grandes Estados imperiais. À burguesía destas nações só lhes restam duas saídas: ou apelar o povo e levar a sua luta até o final: a independência; ou bem se integrar na classe dominante e utilizar os aparelhos estatais da nação opressora contra o proletariado da nação oprimida.
Será nas primeiras décadas do século XX, e especialmente na segunda metade do século, quando as que optem pela primeira via atinjam movimentos verdadeiramente de massas, arrastando trás de sim a boa parte do proletariado consciente (o que nunca deixaria de ser uma contradição dentro do próprio movimento[1]).
Chegados a isso cabe debulhar vários fatores que permitiram que na etapa imperialista, cuja lei é a concentração, encontremos esta tendência ao invés, à disgregação:
1. Em primeiro lugar, ao entrar na etapa imperialista, o capitalismo concentrou ainda mais a produção em cada Estado, criando monopólios, e acentuando a contradição que assinalava-mos na etapa anterior.
2. Ainda, a criação do chamado "Estado do Bem-estar", que graças aos benefícios obtidos pelo imperialismo criou uma extensa aristocracia operária, e em última instância, permitiu relegar a contradição capital/trabalho deixando que contradições secundárias (como a nacional) saltassem à palestra no plano subjetivo.
3. Por outro lado, há que assinalar o começo de uma etapa de refluxo no movimento revolucionário mundial, que já Lenin intuía na derrota espartaquista, e que terminaria por assentar depois da Segunda Grande Guerra, quando a burguesia conseguiu remontar a sua taxa de lucro. A divisão do Movimento Comunista Internacional e a perda do carácter de vanguarda dos seus principais referentes, junto com a intensa campanha anticomunista, deixaram um oco no movimento revolucionário, coberto em parte por estes movimentos.
4. O sucesso atingido pelas revoluções que, após a Segunda Grande Guerra tomaram o carácter de antiimperialistas e de libertação nacional (China, Cuba, Vietnã...), cuja influência ideológica deixou-se sentir também no seio dos países imperialistas [2]. (Isto terá importância para o proletariado na medida em que o levaram muitas vezes a caraterizar a "burguesía nacional" como revolucionária e aliada temporária).
5. O intenso esforço dos governos por exaltar o patriotismo centralista, como meio de garantir o apoio da população às guerras imperialistas e ao pacto social gerou um efeito de ação-reação que, mediante uma maior opressão nacional, potenciou a resistência do povo face a ela.
6. "O erro da esquerda centralista reside no fato de que por temor a fazer-lhe o jogo ao nacionalismo burgués das nações oprimidas beneficiou não só ao nacionalismo burguês, senão também o nacionalismo ultrarreacionário da nação opressora"[3]. Este erro, já enunciado por Lenin, não deixou de ser repetido por boa parte da esquerda estatal, que muitas vezes por incomprenssão e ate traição deixou de lado as reivindicações das nações oprimidas. [No caso do Estado espanhol, por exemplo] a aceitação do "Estado das Autonomias" e a renúncia à autodeterminação por parte do PCE na transição (entre outras infámias) facilitou o rompimento dos projetos estatais.
Até aqui alguns dos fatos que, no nosso parecer, possibilitaram o surgimento destes movimentos. A respeito do futuro, cabe assinalar brevemente que algumas destas tendências que assinalamos encontram-se agora virando ao invé, o que repercutirá também no tema que nos ocupa.
Porém, a conquista dos direitos democráticos pelas nações oprimidas continua sendo, como objetivo estratégico, tarefa pendente e de plena vigência. A luta pela sua consecução haverá de atender as mudanças que se produirem no seu contexto, e muito especialmente a perda do caráter revolucionário das respectivas "burguesias nacionais", que terminam por optar pela primeira via que mos assinalava (a integração no bloco oligárquico-burguês), como fica visto no caso basco e irlandês. Isto implica que só as classes trabalhadoras poderão agora atingir estes objetivos. Como dizia Marx:
"Para que os povos possam unificar-se realmente, os seus interesses devem ser comuns. Para que os seus interesses possam ser comuns, é mester abolir as actuais relações de propriedade, pois estas condicionam a exploração dos povos entre sim; a abolição das actuais relações de propriedade é interesse exclusivo da classe operária. Também é a única que possui os meio para isso. A vitória do proletariado sobre a burguesía é, à vez, a vitória sobre os conflitos nacionais e industriais que enfrontan hostilmente entre si, hoje em dia, aos diversos povos. Por isso, o triunfo do proletariado sobre a burguesia é, ao mesmo tempo, a sinal para a libertação de todas as nações oprimidas"[4].
[1] Como amostra, temos as lutas que se deram no seio do Partido Galeguista entre os sectores progressistas, com Suárez Picallo de ideias socialistas, e a reacção encabeçada por Vicente Risco.
[2] Deitando outra olhadela para a terra, cabe assinalar a pegada que deixou o maoísmo na Galiza, na UPG.
[3] ?Sobre o internacionalismo proletario? V. I. Lenin.
[4] ?Discurso sobre Polónia?, Karl Marx.
Foto: CIG