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Dos tempos sombrios de ontem que perduram hoje

Matheus Rodrigues Gonçalves

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Não passarão!

Dos tempos sombrios de ontem que perduram hoje

Matheus Rodrigues Gonçalves - Publicado: Domingo, 01 Abril 2012 02:00

Matheus Rodrigues Gonçalves

Em 1º de abril de 1964 o Brasil imergiu em sombras das quais ainda não saiu por completo. A partir de 1º de abril de 1964 ingressamos em uma grande mentir nacional que até hoje deixa rastros, notadamente entre as camadas mais vulneráveis da população: as torturas nas prisões, as execuções sumárias e os desaparecimentos forçados eram corriqueiros no período ditatorial e continuam a sê-lo ainda hoje.


Este texto faz parte da 5ª Blogagem Coletiva #desarquivandoBR, que se realiza de 28 de março a 02 de abril de 2012.

A ditadura civil-militar (é sempre pertinente ressaltar a participação civil, que foi de suma importância para os militares, inclusive financiando-os) castrou sonhos, interrompeu projetos e destroçou vidas. Extremamente imaginativo quando se tratava de inventar novos meios de tortura, o aparato repressivo pretendia eliminar, antes de tudo, toda e qualquer forma de dignidade da pessoa humana. Pra tanto, utilizou-se do “pau-de-arara”, de choques elétricos, da “pimentinha”, do afogamento, da “cadeira do dragão”, da “geladeira”, além das diversas outras formas de torturas físicas e psicológicas. Isso sem falar nas execuções sumárias e, principalmente, nos desaparecimentos forçados (torpe figura inventada pela ditadura brasileira e exportada para suas co-irmãs latino-americanas), que estendia e perpetuava a tortura psicológica no seio das famílias dos presos políticos.

“Mas só era perseguido, preso e torturado quem tinha participação política”, dizem alguns, como se isso tornasse válidos, justificáveis ou menos graves as arbitrariedades perpetradas pela ditadura. Equivocado está aquele que defende tal tese: a tortura, sob qualquer forma e contra quem quer que seja, deve ser peremptoriamente rejeitada, visto que tem por objetivo vilipendiar a própria dignidade humana e, com isso, afetar — e aterrorizar — não apenas a pessoa torturada, mas todo o corpo social.

Ademais, é importante ressaltar que o militante de esquerda não era o único a ser vitimado. Muitas vezes membros de sua família, amigos e vizinhos sem nenhum envolvimento com a luta contra a ditadura eram presos e torturados para revelar informações ou pressionar o militante para que as revelasse. Há inclusive diversos relatos de torturas contra crianças nos porões do autoritarismo brasileiro.

Concomitantemente, para além de derrubar um governo democrático, os golpistas cassaram mandatos políticos daqueles que se colocavam contra o golpe, atropelando a vontade popular que os havia posto em seus cargos. Junto a isso podemos citar a demissão de mais de treze mil funcionários públicos pela simples suspeita de participarem de movimentos contrários à ideologia ditatorial, as vinte e cinco mil pessoas que passaram em algum momento pelos cárceres ditatoriais e as cerca de dez mil que foram forçadas a partir para o exílio.

“Mas pelo menos na ditadura havia segurança e não havia corrupção” é outro argumento que volta e meia aparece no ventre de uma conversa ou discussão. Que não resiste a uma análise minimamente acurada. A “segurança” era garantida pela perda quase integral das liberdades. Não se podia reunir determinado número de pessoas, não se podia ir a determinados lugares, comprar determinados livros, falar determinadas palavras... E mesmo essa suposta segurança deve ser relativizada, pois, assim como hoje, tratava-se de dar proteção às classes dominantes enquanto os pobres padeciam a barbárie inaugurada pelo Golpe de 1964 e intensificada em 1968 com o Ato Institucional Cinco.

No quesito “corrupção” os governos ditatoriais também eram especialistas. Alguns dos casos conhecidos são as construções da Transamazônica e da Ponte Rio-Niterói, a Poupança Delfim, o caso Capemi, o escândalo da Mandioca e o escândalo das Esmeraldas. Entretanto, para falar de corrupção é preciso lembrar, além dos corruptos, os corruptores. E nesse segundo grupo entram os empresários nacionais e estrangeiros que, como representantes do capital financeiro, apoiaram e financiaram o golpe e a ditadura, para que depois fossem beneficiados pelas ofensivas privatistas dos generais, notadamente no caso da saúde e da educação. É plenamente compreensível que esses escândalos não tenham vindo à tona à época do regime militar, visto que, além de um Legislativo subtraído de suas funções, havia uma mídia que, quando não era calada pela censura, fazia-se conivente ou até mesmo apoiadora declarada dos militares. “E por que não vieram à tona com o fim da ditadura?” Ora, é difícil averiguar fatos quando grande parte dos documentos sobre os períodos estão trancados a sete chaves. Abram-se os arquivos, e teremos notícias de muitos outros casos que exemplificam o conluio dos generais corruptos com os setores privados corruptores.

Mesmo com todos esses crimes de lesa-humanidade perpetrados com verbas públicas por agentes do Estado e dos casos de corrupção que comprovam que a ditadura não era honesta há, ainda hoje, quarenta e oito anos depois, militares de várias idades que celebram a “Revolução Democrática de 1964”. E, nesse espírito provocador, executam atos de comemoração do Golpe, mesmo após a proibição da Presidência da República. Dentre os principais fatores que permitem desse e de outros escárnios está a não responsabilização dos crimes praticados pelo Estado entre 1964 e 1985. a mensagem é a mesma, tanto para os agentes públicos que hoje perpetram as mesmas barbaridades do passado como para os militares que celebram o Golpe: “Vá em frente, continue fazendo. Pode torturar, matar, desaparecer com os corpos e comemorar depois. Nada lhe acontecerá”. Levantemo-nos contra isso. Nenhum passo atrás na luta pela Memória, pela Verdade e pela Justiça!

Matheus Rodrigues Gonçalves, natural de Niterói, RJ, é graduando de Direito na Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), membro do Núcleo Frei Tito de Direitos Humanos, Comunicação e Cultura do PSOL e da equipe do Instituto de Defensores de Direitos Humanos (DDH).


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