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Reformas e reformismo

191111_reformasvenezuelaAmérica Latina - Comitê Bolivariano de São Paulo - [Cláudio de Lima] Lutar por reformas significa reformismo? Pode ser, pode não ser.


Se a luta por reformas se dá como um fim em si mesmo, claro, trata-se de uma prática reformista, não contribuindo para o ataque às causas estruturais, ao sistema capitalista, que se caracteriza pela opressão e exploração do ser humano pelo ser humano. Agora, se a busca de reformas, por alguma melhora na vida política, cultural ou econômica das pessoas, ocorre como um meio, como um passo tático a ser dado, num processo em que não se abre mão do trabalho de conscientização para a luta pelo socialismo, fica evidente que não é o caso de reformismo. Reformismo, por exemplo, é o caso de um dirigente sindical defender junto aos seus liderados que a única luta que deve ser travada é a econômica, achando que a classe trabalhadora não tem outro caminho senão o da lógica de mercado, limitando-se apenas a vender a sua força de trabalho pelo salário possível. Alternativa que, no processo de luta de classes, leva a classe capitalista a ter uma reação diferente da que teria, caso notasse que os trabalhadores se dispõem, não só a reivindicar melhores salários, mas também se conscientizam de que devem agir pelas transformações políticas e sócio-econômicas que lhes convêm. O capitalista sabe muito bem que uma coisa é uma greve econômica, por melhora de salário, e que outra coisa é uma greve política. É nesta que ele se vê ameaçado como classe. Percebe, pela sua própria experiência de séculos, que toda classe, quando se politiza, age politicamente segundo os seus interesses, que, por conseguinte, a tendência da classe trabalhadora, ao tomar consciência das causas de sua situação econômico-social vigente, é lutar contra o sistema econômico e político que a oprime e explora.

Como não existe capitalista ingênuo, todo burguês compreende que as massas trabalhadoras, ao adquirirem consciência política, acabam por concluir que sua única opção válida, sem ilusão de classe, é a tomada do poder político, como fez a burguesia na sua luta contra o feudalismo. É isso que faz o capitalista ser um tanto tolerante com os reformistas – mesmo que tenha de fazer alguma concessão –, e total intolerância em relação a lideranças e movimentos sociais que percebem que é necessário derrotar o sistema atual.

EQUÍVOCOS DE CERTAS ESQUERDAS

Esta questão da diferença entre reformas e reformismo, há tempo, tem merecido a atenção de pensadores socialistas, revolucionários: Rosa Luxemburgo dá o devido trato ao tema, no momento em que ataca as idéias reformistas de Bernstein. O que mais importa é que não compreender a diferença entre reformas e reformismo acarreta consequências graves às lutas contra o capitalismo. E este tem sido o equívoco de certos setores de esquerda, de não lutarem por reformas, por conquistas imediatas, por acharem que essa prática é reformista, não percebendo que a marcha para a construção de uma nova sociedade é um processo, de passos. Fato que os leva a isolarem-se das massas que, no seu dia a dia, na luta pela vida, não abrem mão de reivindicações constantes. E o resultado inevitável é que o movimento social fica nas mãos das forças reformistas, nos sindicatos, nas associações de moradores etc.

Tais esquerdas, anti-reformas, em nome do anti-reformismo, defendem, na verdade, uma revolução sem sujeito, já que quem faz a revolução é o povo em estágio de consciência da necessidade de mudança, do qual elas se afastam.

Para esses setores que, na prática, não vêem a luta como processo, quem luta por reformas em quaisquer circunstâncias não é revolucionário. Não entendem que a luta por reformas e a luta pelo socialismo não se excluem necessariamente. Podem andar juntas ou separadas: se a luta por reformas acontece dentro de uma visão reformista, é claro que uma exclui a outra, opõem-se. Contudo, para quem luta por reformas e vê nestas apenas umas das batalhas da classe trabalhadora, não renunciando à luta pelo socialismo, percebendo que a ação por conquistas imediatas pode contribuir para isso, a citada dicotomia não se dá.

Toda luta decorre de um mínimo de consciência da necessidade, inclusive a que acontece por reformas, e pode mostrar aos seus participantes que, só unidos coletivamente, têm possibilidade de vitória; e, se isso vale, por exemplo, para a conquista de melhorias num bairro, tal lógica serve, por extensão, para lutas maiores, históricas, de libertação. O primeiro passo para que a população tome consciência da necessidade de um projeto de futuro, de transformação sócio-econômica ocorre, em geral, quando as pessoas se juntam na defesa de objetivos comuns, por mais simples que sejam.

REFORMA OU LUTA PELO SOCIALISMO NA VENEZUELA?

Não há dúvida. Não houve uma revolução na Venezuela. O país é capitalista. Seu Estado é capitalista. Então – conclui determinada esquerda – o que ocorre na Venezuela, sob a liderança de Chávez, são apenas reformas, portanto, reformismo puro, nada de luta pelo socialismo. É certo. O que acontece na Venezuela são reformas, mas isso não quer dizer reformismo. O caminho que o governo e o conjunto de bolivarianos revolucionários do país perseguem é o socialismo. Para isso, implementam um processo revolucionário, realizando as mudanças possíveis, de acordo com as circunstâncias dadas, numa situação em que as forças populares ainda não tomaram o poder político, apenas conquistaram o governo. Nesta luta, as reformas são feitas como meio, na dinâmica de acumular forças para próximos passos ou saltos. E isso não é reformismo. O que não evita ainda – é sabido – que, por dentro de tal processo, de tais forças, não circulem pessoas de posição reformista, principalmente entre setores da burocracia estatal.

Na verdade, o que está em jogo na Venezuela é se as reformas avançam ou não. Do seu desenvolvimento depende o fortalecimento das forças necessárias para que o processo revolucionário em andamento vingue, derrotando politicamente a burguesia, levando o povo ao poder.

Reformas estão acontecendo também em Cuba. Pode-se afirmar, com isso, que os revolucionários e o povo cubano, como um todo, abriram mão do socialismo, que optaram pelo reformismo rumo ao retorno ao capitalismo? Fosse reformismo o caminho político-ideológico adotado por Chávez e seus liderados na Venezuela, as forças oligárquicas venezuelanas não seriam tão hostis ao governo bolivariano e ao Partido Socialista Unificado da Venezuela (PSUV), como têm sido. Não obstante estar quase intacta a estrutura econômica da Venezuela, com o capital privado representando ainda em torno de 70% da economia, com apenas 2% das propriedades produtivas em poder de empresas sociais ou socialistas, os setores de direita não dão trégua, acionando seus meios de comunicação de massa noite e dia, recebendo apoio material e ideológico de potências estrangeiras, mormente do imperialismo norte-americano.

Fosse Chávez reformista, essas forças provavelmente agiriam contra ele – é verdade – mas não com a mesma ênfase e golpismo que desenvolvem nas suas ações constantes. Haja vista à forma como direitistas como elas agem, em oposição a governos de centro ou de centro-esquerda da América, como o de Lula, de Cristina e outros da mesma linha: atacam-nos, mas, com a certeza de que o "perigo" contra seus interesses é bem menor, ou não existe; não recorrem tanto à violência e ao golpismo como têm feito na Venezuela, assim como na Bolívia e Equador.

Não se pode ter ideias fixas sobre processos de luta, revolucionários. Numa situação de tomada de poder, reformas, como medidas constantes, tendem a desaparecer e as transformações, tanto econômicas como ideológicas, em regra, ocorrem com maior rapidez. O que não se dá numa conjuntura em que a tomada de poder político ainda não se deu. Os ritmos revolucionários variam de situação para situação, de país para país.

Não há uma fórmula única na marcha para a conquista do socialismo. Os caminhos se diversificam e os ritmos não se repetem. O que não diversifica é o objetivo final.

Cláudio de Lima é membro do Comitê Bolivariano de São Paulo.


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