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trancredo advogadoBrasil - AND - [Patrick Granja] Na tarde do dia 26 de janeiro, o jornal A Nova Democracia entrevistou o advogado João Tancredo (foto), presidente do Instituto dos Defensores dos Direitos Humanos, o DDH, conhecido por defender causas em favor do povo e contra os desmandos dos gerenciamentos de turno contra as populações pobres. Entre os casos defendidos por João Tancredo estão o assassinato do ajudante de pedreiro Amarildo de Souza no morro da Rocinha, a chacina da Baixada Fluminense em 2005 e a prisão do morador de rua Rafael Braga, preso com produtos de limpeza em uma manifestação no Rio e condenado a 5 anos de prisão por porte de material explosivo.


A Nova Democracia: Por que a situação nos presídios é tão precária?

João Tancredo: Temos quase 600 mil presos e temos evidências absurdas do tratamento desumano que é dado a esses presos. E agora qual foi a ideia genial que empresários e governos tiveram? Privatizar os presídios. Cria-se esse sentimento de que o encarceramento é a solução para os nossos problemas para preparar terreno para uma privatização. No USA, os índices de crimes crescem a cada dia e mais de 1 milhão de pessoas estão presas. A maior população carcerária do mundo. Sempre tem alguém faturando por trás. O USA deu 300 milhões de dólares para o combate ao narcotráfico na Colômbia. Mas o governo colombiano consumiu somente 30. Porque o resto foi usado para comprar armas, aeronaves e mísseis de indústrias bélicas do USA.

AND: O que acha desse atual clamor pela pena de morte no Brasil?

JT: A única coisa que a pena de morte comprova é a nossa incompetência. Nós temos competência para lidar com essa questão e a solução é matar nosso semelhante. E a classe média oportunista está preocupada com o seu bairro, com a sua praça, com o seu condomínio e não entende que não é possível se criar uma ilha da fantasia onde todos viverão bem, que, enquanto não combatermos as desigualdades sociais, viveremos assim: só há segurança para quem mora em condomínios fechados, cercados e vigiados, assim como só tem saúde para quem tem plano de saúde e pode pagar.

AND: E qual é a solução?

JT: Nós temos uma massa carcerária negra, pobre, jovem e originária das favelas. E são altíssimos os índices de reincidência. Essas pessoas já nascem e crescem na miséria. Você não pode exigir que algumas dessas pessoas que nunca foram socializadas, em primeiro lugar, não recorram à marginalidade para sobreviver. Se não combatermos essas desigualdades, nunca vamos resolver o problema da segurança do qual essa classe média tanto reclama. Esse negócio de que o Estado promove projetos como a UPP para tratar dessa questão é puro oportunismo. Todos sabemos que esse projeto faliu. As favelas conhecem polícia há muito tempo. O que a favela não conhece são direitos. Depois das UPPs você não tem mais a criação de escolas, hospitais, creches nas favelas. Ou seja, a UPP é a solução de todos os problemas.

AND: E o que a polícia pensa sobre a questão?

JT: Têm policiais que são contra a pena de morte porque dizem que seria uma lei que viria para burocratizar a pena de morte. Isso porque, no Brasil, esses agentes já executam incontáveis penas de morte contra pobres. Apreendem, julgam e executam a pena capital. O número de execuções extrajudiciais no Brasil é maior do que o somatório das penas de morte aplicadas nos países onde essa medida é adotada pelo Estado.

AND: Esses crimes não são elucidados?

JT: O laudo do DG apontou recentemente que ele foi morto com um tiro disparado pela arma de um policial pelas costas. Porém, antes, várias versões foram apresentadas pela polícia. Primeiro disseram que ele caiu. Depois a família viu os ferimentos a bala e denunciou o assassinato. Aí a polícia disse que o disparo veio do alto do morro, mas a perícia acaba de comprovar o contrário. Esse é o modus operandi da polícia nessas favelas.

AND: Isso é fruto de um problema somente na polícia?

JT: Claro que não. O caso do Rafael Braga, por exemplo, é uma aberração jurídica. Um morador de rua, sujeito às condições mais indignas de sobrevivência, vivendo à margem da sociedade, é pego em uma manifestação com Pinho Sol que a própria perícia disse que não poderia ser usado como material inflamável. Mesmo assim, o judiciário resolve condená-lo a 5 anos e oito meses de prisão. Claro, o cara é pobre, morador de rua, negro. Mas nós trouxemos ele aqui para o escritório para que ele tivesse uma oportunidade de ter, inclusive, uma recuperação emocional. Mas ele é um cara que passou a vida vivendo de um jeito que nós não conhecemos, um jeito muito miserável de se viver. Quando ele pegou seu primeiro salário, tomou um porre, o que é completamente compreensível, e perdeu o direito de sair para trabalhar. Isso dói muito. O Estado tira a liberdade da pessoa e depois ainda tira as oportunidades da pessoa se desenvolver.

AND: E o Amarildo, o que você acha que pode ter acontecido de fato com ele?

JT: Houve na Rocinha na época uma operação chamada Operação Paz Armada. A polícia foi cumprir inúmeros mandados de prisão, busca e apreensão. Várias pessoas foram presas e levadas à delegacia. Essa operação custou uma fortuna. E não foi só a PM que participou. A Polícia Civil e a Core também participaram. A maioria dessas pessoas presas, muitas ilegalmente, depois foram soltas por falta de provas. Nenhuma arma e nenhuma quantidade de droga foi apreendida. Aí em uma reunião, o major Edson disse que a operação foi um fiasco e um policial levantou a mão e disse que sabia de um homem que conhecia o esconderijo das armas. O major mandou procurá-lo. Eles pegaram o Amarildo em uma birosca e levaram-no para a base com a certeza de que ele tinha informações. Eu acredito que ele foi torturado e espancado. Como ele tinha ataques epiléticos periódicos, provavelmente por conta de um desses surtos ele não resistiu.

AND: E para onde seu corpo pode ter sido levado?

JT: A viatura que o levou para a base saiu da Rocinha e foi parar no Cais do Porto. O policial que dirigia disse que se perdeu, mas existe uma distância de quase 20 quilômetros do Batalhão do Leblon para o Porto. Ali havia um lixão. Ele pode ter sido jogado ali e, caso essa hipótese esteja correta, nunca mais acharemos seu corpo, pois ele provavelmente foi triturado pelas máquinas de lixo. Outra hipótese é que ele tenha sido concretado na obra de construção do metrô que está ainda em andamento ao lado do 23º Batalhão da PM. Uma hipótese mais afastada é que ele tenha sido enterrado no alto da Rocinha, na antiga casa do traficante Nem, onde a polícia construiu um centro de tortura. O traficante tortura e o Estado também.

AND: Esse mesmo Estado que reinaugurou a categoria do preso político.

JT: Nós temos um processo com 23 acusados, processo que normalmente se arrastaria por décadas. Mas, nesse caso, em menos de um ano, nós teremos uma sentença condenatória. Em sã consciência, nós podemos afirmar que o Caio e o Fábio foram ao ato aquele dia para assassinar o Santiago? É evidente que não. Mas eles estão sendo acusados de um homicídio doloso triplamente qualificado. Esse julgamento é um absurdo político inimaginável. O habeas corpus que garantiu a alguns dos presos responder em liberdade tem como condição a não participação desses acusados em manifestações. Mas participar de manifestações pacificamente é um direito constitucional. Ou seja, esse tribunal é um tribunal de exceção que delibera inclusive medidas inconstitucionais.


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