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bloco-luta-utpiaBrasil - Jornalismo B - [Alexandre Haubrich] Nem anarquista, nem socialista, nem comunista: libertário. É assim que se define Rodrigo Brizola, conhecido como Briza, integrante do Bloco de Lutas pelo Transporte Público e morador do Utopia e Luta, ocupação urbana que teve início durante o Fórum Social Mundial de 2005 em um prédio do INSS e que segue até hoje, depois de conseguir financiamento da Caixa Econômica Federal.


Briza esteve na Juventude PT, mas conta que foi "convidado a sair" após enfileirar críticas à falta de autonomia dos movimentos sociais. Militou no movimento estudantil, no Movimento de Trabalhadores Desempregados e fez estágio no Movimento de Pequenos Agricultores antes de se mudar para o Utopia e Luta em busca da vida compartilhada, da coletividade e de novas possibilidades de luta. No Largo Zumbi dos Palmares, em Porto Alegre [estado do Rio Grande, sul do Brasil], Briza conversou com o Jornalismo B.

Como está hoje a atuação do Movimento de Luta pela Moradia aqui em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul e no Brasil?

Por fora das grandes organizações tem um processo de acirramento, de enfrentamento, esse descontentamento em permanecer em uma situação de moradia precária, de espaço físico limitado, lá no meio de qualquer canto, e com uma especulação imobiliária gigantesca. Porto Alegre é um caso, o que tem de prédio abandonado no Centro da cidade. A gente a partir do Utopia tem construído hoje o debate que é da Rede de Territórios Autogestionários. Essa Rede tem como objetivo construir um canal de relação entre territórios na Região Sul do Rio Grande do Sul, que é uma das regiões mais carentes, tem o apelo histórico daquela região, do charque, da carneação, dos negros daquela região, da fronteira com o Uruguai. E muito nessa pegada de como é que tu vai debater projeto, poder popular, ideologia, se as pessoas, as famílias, estão com a cabeça voltada para a sobrevivência, tendo que trabalhar, tendo que correr atrás, tendo que pensar como é que vai sustentar, como é que vai comer. Então o projeto que a gente tem debatido de moradia é nesse contexto: criar as condições de sobrevivência, trabalho, com a moradia, e a partir desse processo do trabalho de forma coletiva, de autogestão, ir construindo a disputa cultural.

Nesse sentido, como é que se articula essa rede com outros movimentos sociais da cidade e do campo?

A gente sabe que na cidade tem um período já de vinte e poucos anos de uma fragmentação forte. No campo a Via Campesina, o MST, o MAB, o MPA, uma mobilização forte mantendo viva a luta pela reforma agrária da década de 90. E na cidade a gente começa a rearticular. Na crise do PT e desse projeto esses grandes movimentos acabaram se burocratizando em relação ao projeto econômico, projeto de desenvolvimento, que o governo federal começa a se pautar por ali. Na cidade a gente começa a reconstruir esse tecido social, e com a necessidade de reconstruir o tecido social da esquerda. A esquerda precisa se reconstruir, porque esses movimentos centrais, com estrutura vertical, encontraram seu limite. Vem uma crítica já enraizada, um refuto ao autoritarismo. E nesse campo começam a se rearticular outros espaços. Tem ocupação desenvolvendo autogestão, poder popular, apoio mútuo Brasil afora, em grande quantidade.

A organização dentro do Utopia, em relação à questão da coletividade, como se dá?

É bem complicado. A gente teve vários processos de luta ali dentro, de construir uma estrutura coletiva, os trabalhos coletivos, e a gente começa a encontrar o limite do individualismo, das pessoas a partir do momento que entraram nos seus apartamentos, se individualizarem, comodismo, uma zona de conforto maior, isso a gente começa a enfrentar no projeto mas o que se manteve é a marcação de um referencial coletivo, como os espaços coletivos do prédio hoje, todos são com sustentabilidade, então tem a lavanderia, tem o corte e costura, tem serigrafia, tem uma padaria, tem uma horta hidropônica no terraço, uma estufa, tudo isso projetos do Utopia...através da sua cooperativa foi buscando ao longo dos anos, fora as atividades cultural de formação, cinema, sarau, sempre fazendo essa disputa ideológica. Os símbolos do prédio: a bandeira vermelha e preta, o próprio nome do prédio, os muros grafitados, a disposição, colocar pra fora símbolos e criar uma referência.

Como tu vês a situação dos movimentos sociais, de modo geral?

No Rio Grande do Sul é isso o que eu vinha colocando. A gente se depara de novo com os limites do projeto democrático-popular quando o PT assume. Funciona a partir de uma conciliação e de uma coalizão, e a gente tem a reorganização do processo de mobilização social, tem uma retomada das lutas de massa no Brasil, que tem a possibilidade de avançar nas reformas de base, e se depara com uma estrutura burocratizada. Os limites da democracia representativa, os limites que estão colocados dessa estrutura burguesa, esses são questionamentos que as vozes trazem. Não é vinte centavos, o preço das passagens...há um processo de corrupção sistemática no Brasil e as pessoas já perceberam. Agora tem uma novidade, que elas decidiram se mobilizar. Há um processo de insurreição, de não comodismo só com Bolsa Família, com as políticas sociais que são direitos básicos, fundamentais pra população, só que a população quer mais, e começa a cobrar mais a partir dessas conquistas, desses espaços, que são de direitos básicos, que ainda não são acessíveis a todos, tem um anseio de algo mais, de envolvimento direto, de perceber um processo de militarização através das UPPs, um processo de ocupação de espaço através das forças de repressão. É nesse sentido que a gente começa a perceber que o Brasil tá começando a viver o processo da América Latina, que alguns espaços vivenciaram. O que a gente tem hoje, com a Copa: é uma desculpa pra um grande investimento internacional de recursos, uma mudança institucional, uma adequação institucional através da nova tipificação de organizações criminosas, a possibilidade de votar lei antiterrorista...nunca teve terrorismo no Brasil, com exceção do golpe cometido pelos militares. Pra quê uma lei antiterrorismo?

Tem um processo de criminalização dos movimentos sociais?

Um Estado policial. A gente vivenciou isso no Rio Grande do Sul durante o governo Yeda, um Estado policial que atacou de forma institucional, com Ministério Público, com polícia, com secretaria de Segurança, que torturaram camponeses, assassinaram o Élton, assassinaram o Jair. E a gente achava que a mudança na administração do governo acabaria com esse Estado policial, mas o Estado policial segue, e o comando da polícia com autonomia. Atrelado ainda ao Coronel Mendes, que hoje é juiz militar, isso a gente tem plena certeza desse processo de autonomia da polícia militar. E no Brasil também. A corrupção na polícia do Rio de Janeiro. A polícia do Rio de Janeiro é assassina, tortura. Olha o caso do Amarildo. A UPP, projeto de pacificação, ocupação do espaço militarmente, dentro de uma zona, contendo a população. E o que a gente começa a perceber é que começa a ter um endurecimento institucional. Os golpes, as desestabilizações hoje não são aquela coisa de botar os milicos na rua. Cria lei, cria processos de retrocesso, de conservadorismo. Isso é a maior preocupação que a gente começa a perceber, a estrutura militar das forças de repressão segue a mesma, seguem os mesmos costumes.

É possível reverter esse processo dentro dos limites da democracia representativa, dentro dos limites do sistema atual?

Ano que vem vai ser um ano importante de afirmação dessa mobilização de crítica ao sistema eleitoral, sistema de representação. Temos um desafio de avançar na organização das assembleias populares, de instigar os conselhos de bairro. A gente começa a bater nos limites e tem que desenvolver um processo de democracia direta, de ação direta, de ocupar, de começar a construir nos terrenos baldios, hortas, começar a assumir. Já que o Estado se mantém ausente ou se burocratiza nas ações, a gente começar a construir com força a reorganização dos de baixo. É nesse sentido que a gente vem pautando em Porto Alegre a necessidade de retomar o diálogo, de se rearticular.

O Bloco, aqui, chegou no limite?

Na minha opinião a gente esse ano precisa reorganizar. Se reorganizar, construir espaços de debate sobre o Estado de Exceção, construir espaços de mobilização e diálogo com as comunidades. Ano que vem, além da Copa do Mundo, da peleia que vai ter, tem eleição. E aí essa aliança ampla encontra seus limites de táticas. É um ano em que todo mundo se posiciona. A importância do Bloco nesse momento é fortalecer sua articulação pra que no ano que vem retome o processo de mobilização de rua já em janeiro, fevereiro, com o aumento das passagens que a gente sabe que vem, com a Copa do Mundo...fortalecer essa propaganda, fortalecer essa ocupação e essa desobediência civil de ocupar os espaços públicos através da arte, da cultura, do debate...fortalecer os espaços de resistência contra os despejos, como o caso da Comunidade 7 de Setembro...agora, a gente precisa perceber a correlação de forças, que hoje não tá a nossa favor. Precisamos estabelecer esse diálogo com a população. O trabalho que os vereadores e que a mídia fizeram depois da ocupação da Câmara foi um trabalho de desinformação, de manipulação do que aconteceu na ocupação da Câmara. Quem esteve presente na ocupação da Câmara percebeu oito dias de criar experiências de um modelo de democracia direta e de autogestão. E a gente vem pra rua e tem que reorganizar. A correlação de forças não tá...a tática de ação direta que se faz com 15 mil pessoas na rua não é a mesma tática de ação direita que faz com duzentas. E quando começa a ter 30, 40, 50, esse vanguardismo de estar toda semana na rua, a gente começa a ter dificuldade de conversar com a população que tá nas paradas de ônibus, que tá nos bairros. A mídia a gente já sabe qual vai ser o discurso, ela vai criminalizar, e a gente não tem que se pautar com ela, mas precisamos ver qual a nossa relação com as comunidades. Temos que reconstruir essa articulação.

Os partidos ainda têm espaço em um momento em que se aproximam as eleições?

É um desafio que eles vão ter que enfrentar agora. Estar na mobilização social, fazer luta em ano eleitoral. Nós, os grupos autônomos, o Utopia e Luta, outros coletivos, vamos estar fazendo mobilização de rua, articulação, escracho. Queremos contar com os camaradas pra seguir a organização popular e não cair na ilusão da democracia burguesa. Pode ser tática, mas mais estratégica é a organização social.

Vai ter Copa?

Não, não vai. Depende de nós. Vamos resistir, vamos desobedecer. Pra essa Copa já começou a resistência, a palavra de ordem é essa: não vai ter Copa. Se a massa levantar de novo...temos que saber se os movimentos organizados estão com condições de dialogar com essa massa. Se conseguirmos dialogar com a massa, não vai ter Copa.

 


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