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280413 porto-alegre-transporte-coletivo-onibus-01Brasil - Le Monde Diplomatique - [Pedro Henrique Tavares e Caio Venâncio] Na noite do dia 4 de abril aconteceu aquilo que foi apontado como a vitória do movimento popular. Manifestantes se reuniam em frente à prefeitura para mais um ato contra o aumento das tarifas de ônibus. Em menos de duas semanas, aquele era o 3° ato de uma série de junções que pediam o cancelamento do aumento de 7%.


O que vem acontecendo em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, já foi comparado por alguns a Primavera Árabe, Indignados da Espanha e Occupy Wall Street. Há quem chame as recentes manifestações contra ou aumento da passagem de ônibus de ‘Outono Porto-Alegrense’. Comparações à parte, analistas indicam que a indignação da população da cidade faz parte de uma tradição de discussão política presente na capital gaúcha. “Exemplos disso são o Orçamento Participativo e as disputas eleitorais dos anos 1990, que eram bastante acirradas”, analisa a professora de Ciência Política da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Márcia Dias.

Particularmente, na noite do dia 4 de abril aconteceu aquilo que foi apontado como a vitória do movimento popular. Manifestantes se reuniam em frente à prefeitura para mais um ato contra o aumento das tarifas de ônibus, que chagaram a R$3,05. Em menos de duas semanas, aquele era o terceiro ato de uma série de junções que pediam o cancelamento do aumento de 7%. “Mãos ao alto, R$3,05 é um assalto, gritavam os presentes.

Enquanto isso, o vereador Pedro Ruas corria entre o Foro Central da cidade e a Câmara Municipal. Em suas mãos, trazia a melhor notícia para aqueles que lutavam contra a elevação da tarifa acima da inflação, a decisão havia sido revogada. Ao girarem, as catracas registrariam R$ 2,85 novamente.

A prefeitura anunciou que não iria recorrer. No entanto, o presidente da Associação de Transportadores de Passageiros (ATP), Ênio dos Reis, acenou com a tomada de uma providência a nível judicial, apesar de não especificar qual seria. Ele defendeu a orientação do Tribunal de Contas do Estado, que definiu a necessidade do cálculo da tarifa a partir da frota operante e não a frota total. A auditoria do órgão, porém, estabeleceu que o valor justo da preço da passagem seria de R$2,60. A ATP comprou a briga definitivamente quando, na manifestação do dia 11 de abril, a sede da instituição foi depredada por uma pequena parcela dos presentes no manifesto.

Uma dos argumentos da associação que engloba as concessionárias de ônibus porto-alegrenses para necessidade de elevação do custo volta ao início da década de 1990. Na época, o prefeito de Porto Alegre, Olívio Dutra (PT), estatizou as empresas. A única que sempre foi pública é a Carris Porto-Alegrense. Mesmo com a posterior retomada do setor privado, as companhias chamaram a atenção para a necessidade de recuperar um prejuízo. Desde então, fazem a solicitação do preço das passagens. 

Os protestos juntaram uma média de 4 a 5 mil pessoas. No primeiro deles, em 27 de março, alguns poucos manifestantes quebraram janelas da prefeitura, além de jogar tinta no secretário de governança, Cézar Busatto. Ele denunciou a participação de partidos políticos de oposição ao governo do PDT, nos protestos. Uma das questões levantadas foi se a população estaria indignada ou a força dos movimentos estudantis e partidos políticos estava por trás dos acontecimentos.  

Nas passeatas, os manifestantes que não possuíam filiação partidária eram maioria, o que pode ser interpretado como um sinônimo de descrédito das formas tradicionais de representação política, de acordo com Márcia Dias. “Podemos caracterizar como algo pós-moderno. Também não há lideranças carismáticas que definam os próximos passos da mobilização, todos atuam em conjunto, como formigas”, compara. Nesse contexto, alguns jovens que obtiveram destaque e se propuseram a falar publicamente como representantes daqueles que protestavam seriam apenas “intérpretes do movimento”.

A cientista política, porém, chama a atenção para o uso das redes sociais como ferramenta fundamental para conscientizar e chamar a população para as ruas. “Em todas essas mobilizações as redes sociais tiveram um papel muito importante, pois acabaram chamando muita gente pra rua, que é onde o movimento ocorre de fato e ganha ainda mais força”, explica. E completa: “O índice de associativismo (percentual de pessoas envolvidas com entidades coletivas) é alto no município, o que cria uma espécie de pré-disposição para participação”, afirma.

A internet foi fundamental para chamar a atenção daqueles que não possuíam vínculo com qualquer partido, entidade sindical ou estudantil. “Esses grupos, que tornaram o movimento um verdadeiro fenômeno de popularidade, também estão associados, mas não às instituições tradicionais, e sim às redes sociais. É o pessoal do Mark Zuckerberg”, completa a professora da PUCRS, fazendo uma alusão ao criador do Facebook.

Márcia também vê nelas a presença de forças ideológicas. “Interagir com outro mexe com ideologia de uma maneira ou de outra. Alienados não saem na rua pra protestar. Em última instância, gerou discussão sobre um tema, o que é bom. Foi um ganho pra democracia”, resume.

“O que é pior: quebrar um vidro ou impedir alguém de ir pra escola?”, questiona estudante

Estudante de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e militante do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), Luany Barros ressalta que, embora este ano tenha sido muito maior em 2013, a luta por um transporte público mais barato e de melhor qualidade é antiga. “O Bloco de Luta pelo Transporte Público não surgiu agora. Acredito que nesse ano o apoio foi maior porque os rodoviários já haviam feito protestos anteriores e o Tribunal de Contas do Estado (TCE) realizou o levantamento que apontava um preço menor a ser cobrado nos ônibus”, argumenta. 

Para ela, que considera um absurdo pagar R$ 3,05 “pra andar num ônibus lotado e atrasado”, a reivindicação do movimento não se encerra na revogação do aumento ou numa eventual redução da passagem para R$ 2,60. “Não é utópico pensar o passe-livre, essa discussão está cada vez mais presente entre nós”, afirma. 

Detida durante protesto na frente da Prefeitura de Porto Alegre na noite de 27 de março, Luany acredita que pichações e depredações do patrimônio público são componentes do movimento social. “As pessoas criticam algumas atitudes que tomo, eu não compactuo com outras coisas que elas fazem. Acho que são diferentes formas de se expressar. Naquele protesto, a Guarda Municipal me agrediu, me puxou pelo cabelo e me jogou no chão. Então, o que é pior: quebrar um vidro ou inviabilizar que alguém vá pra escola?”, indigna-se.

Jovem anarquista diz que polícia persegue as pessoas

Em meio à multidão que protestava, jovens que se diziam anarquistas formavam um grupo relativamente representativo que costuma assumir posturas mais radicais. Integrante da Frente Autônoma do Bloco de Luta pelo Transporte Público em Porto Alegre, um coletivo “que não é anarquista, é desvinculado de partidos políticos, mas a maioria das pessoas que participam dele são anarquistas”, uma estudante de Psicologia da PUCRS que prefere não se identificar porque “a polícia persegue as pessoas” explica a pauta do coletivo. “A curto prazo, nossa luta é pelos R$ 2,60 estabelecidos pelo TCE. Entretanto isso não vai nos tirar das ruas, pois lutamos por um transporte público 100% estatal e gratuito”, expõe.

Nos protestos, parte dos manifestantes reagia negativamente à presença de bandeiras de partidos políticos. Quanto a isso, a jovem foi lacônica. “Definimos com o Bloco de Luta pelo Transporte Público que apenas duas bandeiras por partido poderiam ser levadas. Apenas digo isso, não posso falar pelos outros”, resumiu.

Para ela, formas mais exacerbadas de se protestar são apenas respostas. “O que ocorreu foi resultado da raiva e da exploração, foi uma reação, por assim dizer. A repreensão não cabe a nós, manifestantes, cabe à polícia”, acredita. A estudante também aponta as razões daqueles que optavam por ir aos protestos com os rostos encobertos. “Há trabalhadores do município que não querem ser perseguidos, como ocorreu com uma funcionária da Carris recentemente (a funcionária foi demitida após criticar, nas redes sociais, a gestão do prefeito José Fortunati. Ela foi readmitida sob a condição de se retratar)”, justifica. Segundo ela, nada disso descaracteriza as ações como não-violentas. “O pacifismo inclui tática de resistência. Violência de verdade é o preço da passagem”, conclui.


Pedro Henrique Tavares e Caio Venâncio

Respectivamente, estudante de jornalismo da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Autor da Global Voices em Português (http://pt.globalvoicesonline.org/) eestudante de jornalismo da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e de história na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Editor do Editorial J (http://www.eusoufamecos.net/editorialj/).


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