“Através traduz o deslocamento e talvez também o estado de espírito da nossa protagonista: dentre as decisões e caminhos que lhe aparecem, ela invariavelmente opta pela terceira via, opta pela noção do ‘atravessamento’, da transposição”. É assim que o diretor brasileiro Diogo Martins explica o nome do filme Através. Martins, Fábio Bardella e André Michiles falaram sobre o longa em entrevista a Opera Mundi.
O filme, que estreou no dia 26 de novembro, acompanha Cintia, uma jovem cubana, que viaja por seu país com um dilema: sair ou ficar em Cuba. Nesse processo, ela passa por uma série de encontros que contrastam o aspecto revolucionário e socialista de sua cultura com a entrada capitalista na ilha, decorrente da reaproximação dos EUA, iniciada em 2013.
A atuação da talentosa atriz Cintia Paredes mescla ficção com documentário, visto que ela uniu aspectos de sua vida pessoal com sua atuação, levando até seus avós a participarem do longa. Escalada para passar quase dois meses, o que incluía Natal e Ano Novo, viajando com três homens que não conhecia, carregando equipamentos e trabalhando em uma viagem que contou com caronas, percursos de trem e balsa, a atuação de Cintia não poderia ter sido mais autêntica.
A produção contou com o apoio da Ancine (Agência Nacional de Cinema) e do Icaic (Instituto Cubano de Arte e Indústria Cinematográfica), de quem recebeu autorização para filmar em Havana. Segundo Bardella, a produção passou pela capital e pelas cidades de Canassi, Matanzas, Manolito, Cienfuegos, Santa Clara, Camaguey, Bayamo, Santiago de Cuba e Uvero (Sierra Maestra).
A trajetória de Cintia é uma metáfora para a trajetória da própria Cuba e de seus cidadãos que passam por um período de dúvidas. “Estávamos bastante cientes disso ao planejar o roteiro”, contou Martins. “Todo filme, queira ou não queira, é um registro de seu tempo — não sou eu que estou inventando isso. Os personagens de hoje são decorrências do tempo em que vivemos, daquele tempo em que foi rodado o filme”.
“Cuba passa por um momento de incertezas e mudanças, é natural que as pessoas se sintam indecisas, sem saber o que vai acontecer com os rumos do país. Mudanças que implicam diretamente em suas liberdades individuais. É sempre uma busca, os cubanos estão buscando suas respostas”, explicou Bardella.
“O filme parte do pressuposto de que ela talvez vá para os Estados Unidos. São dois países que estão muito próximos tanto geográfica quanto culturalmente. Apesar dos mais de 50 anos de bloqueio imposto pelos EUA, os cubanos continuam tendo uma cultura que bebe muito desse país que é uma espécie de irmão maior. O filme fala dessa relação a partir do olhar de uma jovem, ela é o futuro e ao mesmo tempo bebe do passado, ela é uma pessoa em busca das origens e em busca de um destino”, descreveu Michiles.
Apostando em um roteiro em aberto — produto da viagem de 45 dias dos três diretores — Através não tenta oferecer uma resposta para o dilema de Cintia e, portanto, para o de seu país, mas sim uma reflexão ampla e sincera de um período delicado da ilha caribenha.
Através, que foi produzido com um orçamento de R$ 40 mil desembolsados pelos próprios diretores, já passou pelo 10º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo, pelo 48º Festival de Brasília e fez sua estreia internacional no 41º Festival de Cinema Ibero-Americano de Huelva. Na capital paulista, ele está em cartaz no Caixa Belas Artes, Cinema Olido e Centro Cultural São Paulo.
ATRAVÉS
Diogo Martins, Fábio Bardella e André Michiles
Classificação: 16 anos
Duração: 105 min
Onde: Caixa Belas Artes, Cine Olido e Centro Cultural São Paulo.