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800px Chamber of Deputies of Brazil 2Brasil - Diário Liberdade - [Roberto Bitencourt da Silva] A crise de legitimidade do sistema representativo brasileiro é por demais evidente para me estender sobre o assunto. Vale apenas frisar o acentuado processo de erosão da credibilidade das práticas e das instituições políticas, que envolvem um contumaz desapreço dos principais partidos políticos pelas promessas de campanha e pelas suas próprias diretrizes programáticas e origens formativas. A maioria esmagadora dos organismos partidários mal disfarça sua vocação exclusivamente talhada no negocismo da transação lucrativa sobre a coisa pública.


Foto da Agência Brasil (CC BY 3.0 br) - Câmara dos e das Deputadas do Brasil.

Um fenômeno que consiste em uma importante variável da crise política em vigor. Especificamente no tocante ao PT, um longo processo de diluição de ideias e propostas de natureza esquerdista tem culminado, atualmente, no mais absoluto distanciamento do governo federal em relação a quaisquer laivos de atenção às suas pretensas bases sociais.

A indiferenciação do PT em face dos partidos liberal-conservadores torna-se a cada dia mais saliente, não deixando de dar sua cota de contribuição para a perda de legitimidade do sistema político. Antigo vetor da esperança de um país mais justo e soberano, o PT tem colaborado para desvanecê-la de vez.

Gostemos ou não, por conta da hegemonia alcançada nas últimas décadas entre as forças progressistas e esquerdistas, o anoitecer do PT compromete e desgasta a imagem de todos os setores sociais e partidários associados a uma cosmovisão de esquerda. Uma poderosa máquina midiática não deixa de operar diuturnamente com a desqualificação de movimentos sociais, sindicatos e partidos. Guardem ou não relação com o petismo.

Nesse sentido, levando em conta a experiência petista de governo desde 2003, os segmentos partidários e sociais de esquerda precisam recolher alguns ensinamentos e arregaçar as mangas, de modo a dialogar com as classes trabalhadoras, populares e médias, tendo em vista a construção de um projeto alternativo de nação.

Projeto alternativo não apenas em face do PT, como, também e obviamente, em relação ao emergente conservadorismo que tem ganhado capilaridade. No dia do Professor, alguns mestres do pensamento social e político brasileiro tem muito a nos ensinar. Vejamos algumas ideias defendidas por professores proeminentes.

A burguesia brasileira é autocrática, dependente e sócia menor do capital estrangeiro. Trata-se de uma premissa da análise desenvolvida pelo sociólogo Florestan Fernandes, em torno da matriz econômica, cultural e socialmente subalterna da formação brasileira. Fernandes identifica o caráter egoístico das classes dominantes domésticas, que perseguem exclusivamente a preservação de privilégios assentados em uma sobre-exploração das classes trabalhadoras.

Como sócia subordinada de sua congênere forânea, a burguesia interna mantém sua posição em parceria com o capital internacional, dividindo os excedentes. Em seu raio de ação e em suas perspectivas não há vez nem voz para as classes subordinadas. Democracia converte-se em palavra vazia. Desse modo, de um ponto de vista socialista e nacionalista popular, como defendido pelo professor Fernandes, não há motivos para contar com meros testas de ferro do capital estrangeiro, que apenas intermediam a espoliação do país e do povo. Igualmente, não faz sentido tecer alianças políticas com tais setores que não se interessam pelos destinos da nação.

A sociedade e a economia brasileira sofrem com determinações que não são autóctones. O poder decisório é alheio e externo. O antropólogo Darcy Ribeiro chama a atenção para o papel desempenhado pelas corporações multinacionais. Dotadas de tecnologia própria trazida de fora, pouco absorvem força de trabalho, criando ambiente favorável à superexploração do trabalho. Problema que, na concepção de Darcy, conforma um povo cuja vida não é ordenada para si, mas sujeito à condição de “proletariado externo” do imperialismo. Uma ampla marginalização social e econômica reside na experiência das sociedades dependentes e subalternas, como o Brasil.

Especialmente atuantes nos ramos industriais, as multinacionais retraem a oferta abrangente de empregos mais adensados, criando condições desfavoráveis ao incentivo à educação, por ser desnecessária uma formação escolar ampla que revele capacidade criadora e inventiva. Com efeito, os termos do acolhimento do investimento externo precisam ser radicalmente modificados no país, no mínimo pensado sob a forma de joint venture, como preconizava o presidente Getúlio Vargas e tem adotado a economia chinesa. Conceber o capital estrangeiro de maneira acrítica e irrefletida, como se tem feito, é desprezar qualquer projeção de futuro e submeter o país e o povo ao que os nacionalistas do pré-1964, como Darcy, chamavam de “bomba de sucção” das riquezas e do trabalho nacional.

Uma economia primário-exportadora pena com o intercambio desigual, mantendo o subdesenvolvimento. Uma das ideias mais conhecidas do economista Celso Furtado, contudo, esquecida pelas elites políticas brasileiras nas últimas décadas. Aquilo que hoje chamam de valor agregado aos produtos, isto é, a incorporação de conhecimento, saber e tecnologia na elaboração dos bens, consiste em diferencial nas transações comerciais, superando, e muito, o valor de troca dos bens primários. A atual crise econômica brasileira guarda, em boa medida, relação com esse estado de coisas, em função da reprimarização do setor produtivo.

Aferrar-se a circunstâncias momentaneamente favoráveis dos preços das commodities é passo seguro para uma inserção subalterna e (semi)colonial na divisão internacional do trabalho. Do mesmo modo, um bloqueio ao tema da reforma agrária. Como ensina Furtado, a superação desse perfil de inserção na economia mundial só pode ser feita por meio de uma vontade coletiva e de iniciativas políticas. Medida convergente, o desenvolvimento da educação, ciência e tecnologia demanda escolha e decisão política, como assinala o sociólogo e economista Ruy Mauro Marini. Seguramente, não é o liberalismo de botequim, divulgado pelos conglomerados de mídia, as “forças do mercado” que podem responder a tais desafios.

Necessidade de dar primazia política à capacidade organizativa e expressiva das classes trabalhadoras, populares e médias. Como destacam os estudos de Darcy Ribeiro, Florestan Fernandes e Ruy Mauro Marini, as classes sociais historicamente subordinadas e excluídas têm que participar dos processos decisórios da nação. Por extensão, para as esquerdas, ater-se a um trabalho político de natureza pedagógica e organizacional apenas voltado aos setores sindicalizados é restringir-se a um padrão de exercício político corporativo e não propriamente político, para usar os termos da formulação gramsciana. Estaria limitado à “aristocracia proletária”, como destaca o pensamento darcyniano.

Superar a afeição eleitoral e institucional, tomando como eixo estímulos à capacidade participativa desde as bases de organização popular, é um ensinamento dos grandes mestres para as esquerdas. A própria eventualidade de exercício de governo precisa contar com a participação decisiva e fiscalizadora das classes trabalhadoras. O economista Nildo Ouriques, em nossos dias, tem, oportunamente, chamado a atenção para as experiências democráticas bolivarianas, tipificadas pela dilatação da participação e do protagonismo popular.

Em um tempo marcado pelo amesquinhamento da política em múltiplos quadrantes do sistema partidário, rever os mestres do pensamento social e político brasileiro expressa não apenas um possível significado do dia do Professor, como também é exercício para as esquerdas assimilarem visões e adotarem ações convergentes com os grandes desafios do nosso país.

*Roberto Bitencourt da Silva – doutor em História (UFF), professor da FAETERJ-Rio/FAETEC e da SME-Rio.

Blog do Roberto Bittencourt.


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