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psol reformapliticaBrasil - Blog do Cesar Mangolin - [Cesar Mangolin] A votação da reforma política, a cláusula de barreira e as "esquerdas": por uma outra percepção do voto do PSOL e do PCdoB.


Charge: Joaquim Monteiro.

Causa certa surpresa a reação de militantes do PSTU e outros partidos que serão prejudicados com a reforma política, em particular com a cláusula de barreira aprovada. Chamados até de oportunistas, os deputados do PSOL, assim como os do PCdoB e do PT, figuram como traidores e responsáveis pelas agruras que serão vividas por esses partidos a partir de agora.

Eu não defendo cláusula de barreira alguma, evidentemente. Mas vale lembrar um pouco da nossa trajetória recente para podermos atribuir responsabilidades de maneira também responsável.

Lembro que defendi, logo após as tais jornadas de junho e ainda no ano passado e bem antes das eleições, que deveríamos todos dar a devida atenção para a reforma política. O argumento que usava era político, não principista: o governo acenava com a reforma política no momento de questionamento mais contundente daquelas movimentações, que não pediam exatamente isso. Mas a reforma política anunciada era uma maneira de atender a uma parcela daquele heterodoxo movimento que foi, aos poucos, se resumindo e cristalizando nos coxinhas batedores de panela. Por outro lado, era uma oportunidade para o governo realizar mudanças presentes já no programa, mas que não encontravam espaço para a saída do papel. Ora, diante desse cenário da vida real, seria necessário que partidos da esquerda, movimentos, sindicatos combativos e centrais sindicais progressistas fossem capazes de se juntar em torno de uma proposta mínima que unificasse a esquerda e servisse de instrumento de pressão sobre o Congresso e sobre o Executivo, no sentido de tentar fazer da reforma algo o mais progressista possível, visto que a possibilidade de um Congresso Nacional mais conservador que o anterior já era analisada como forte possibilidade.

Pois bem, o que ocorreu então? Os partidos da esquerda não conseguiram unir-se. Não porque não poderiam chegar num acordo mínimo, mas porque se negaram a discuti-lo. Houve iniciativas do PCdoB, de movimentos sociais, convidando representantes de todas as organizações, mas os demais partidos da esquerda negaram-se a levar a sério... Lembro de um representante de um dos pequenos partidos que se complicaram ainda mais com a cláusula de barreira aprovada agora afirmando que iria até a reunião com os demais movimentos e organizações para dizer apenas que aquilo era governismo e aquelas coisas de sempre... Lembro de ter participado de um debate acalorado numa lista da direção do partido ao qual pertencia: chamava a atenção uma lista de quase 400 movimentos, sindicatos e mandatos de parlamentares progressistas conclamando a unidade em torno de propostas progressistas para a reforma e pela construção de um movimento capaz de exercer pressão social e política...

O argumento principal que vinha de partidos como o PSTU, PCO, PSOL e PCB era que a reforma era burguesa (!), conservadora, que era uma armadilha do governo etc., etc.. No processo eleitoral, essas mesmas organizações não foram capazes de formalizar a frente de esquerda, tiveram votações irrisórias e apenas o PSOL foi capaz de eleger representação parlamentar...

Com a eleição de Eduardo Cunha para a presidência da Câmara as coisas se complicaram ainda mais... A reforma política veio, de surpresa, e segue em ritmo acelerado, sem pressões externas. A ausência de um movimento popular organizado, congregando setores progressistas e de esquerda, facilita o trabalho daqueles que tendem a piorar nosso sistema eleitoral, não fosse a combativa atuação dos deputados do PSOL, do PCdoB e do PT...

Para quem está acompanhando os debates no Congresso não paira dúvida sobre a honestidade e o combate desigual que enfrentam as citadas bancadas. Rebatem ali argumentos que vêm do senso comum mais tacanho até os discursos mais bem elaboradas por uma direita militante que assume claramente suas posições, que nadam na crista da onda conservadora que vivemos. O jogo político do parlamento burguês exige, assim como em qualquer outro espaço da vida concreta, dar passos à frente e outros tantos atrás, exige em determinados momentos saber defender e votar em algo que não é o que se quer, mas o possível diante de propostas mais conservadoras. É a correlação de forças quem determina o processo. A ausência de unidade das esquerdas, a ausência de pressão externa por uma reforma progressista dá margem de manobra mais larga aos setores mais à direita.

É esse quadro desfavorável para a esquerda que temos no Congresso. Quadro que poderia (ou não, visto que não podemos afirmar o que não ocorreu...) ser revertido, caso tivéssemos, naquele momento de tentativa de se forjar a unidade em torno do tema, contado com todas as forças progressistas e de esquerda e com o convencimento de parcela mais ampla dos trabalhadores. A radicalidade, que por vezes é apenas infantil e retórica, não permitiu isso, além, é claro, das pretensões eleitorais de alguns desses partidos.

Acusam os deputados do PSOL, em particular, de traidores, visto que poderiam ter optado pela abstenção diante do tema. Dois argumentos valem aqui para nossa reflexão. Primeiro, os quatro aguerridos deputados, que têm participado ativamente do processo, escolheram o voto diante de duas opções:essa que passou (que impede o acesso à televisão e ao fundo partidário dos partidos que não possuem representação parlamentar) e outra, que ampliava o número de deputados dessa representação, portanto, complicando ainda mais a vida dos partidos da esquerda, inclusive do PCdoB. Fora isso, a cláusula de barreira tem sido apresentada nas últimas décadas sempre com um mínimo porcentual de votação, que poderia ser ressuscitado no projeto. Votaram pela melhor proposta, embora não fosse a ideal, sem dúvida.

No segundo caso, abster-se pode parecer muito revolucionário pra muita gente, mas guarda uma armadilha perigosa: a política constante de abster-se das tomadas de decisão significa não participar da vida real e concreta. O problema é que os trabalhadores estão vivendo as relações concretas, não a lógica perversa dos que apenas aceitam lidar com a vida real no caso dela se encaixar nos seus sonhos. Isso faz com que várias dessas organizações habitem sempre um gueto estreito e sejam infelizmente cada vez mais irrelevantes politicamente. Não será a cláusula de barreira aprovada quem vai colocar esses partidos no gueto: eles já estão lá, assim como uma parte esquerdista do PSOL também desejaria que seu partido estivesse. A pureza principista, no entanto, serve apenas para que batam orgulhosos no peito os que não lidam com a vida real. Mas não gera mais nada além disso. Um bom exemplo recente de não ter o pé na realidade é a palavra de ordem "greve geral" aparecer no discurso dessas organizações e outros coletivos trotskistas menores... Pode parecer muito revolucionário defender a greve geral, mesmo que a conjuntura atual não permita chegarmos nem perto disso, o que desgasta esse instrumento revolucionário, que deveria ser utilizado (mesmo como palavra de ordem) apenas quando sua possibilidade está posta, como nos ensinava Lênin...

Numa charge (foto) que circulou pelas redes sociais há algo de curioso: o símbolo do PSTU, do PCO e do PCB estão do lado de um muro, enquanto o do PSOL está pulando o muro. A ideia ali é dizer que o PSOL está passando para o "lado de lá"... Mas, se o lado de lá para o qual vai o PSOL significa colocar os pés no chão, significa lidar com a vida real e traçar sua tática de acordo com a realidade objetiva, penso que o faz em boa hora. Minha leitura da charge é a de pular o muro da prisão à qual se confinaram voluntariamente as demais organizações. O PSOL vai cometer erros, vai fazer concessões, vai avançar... Vai passar por isso tudo porque vai atuar na vida real e concreta e poderá, sem abrir mão do horizonte estratégico, contribuir para o avanço da luta socialista no Brasil. Que saibam defender taticamente a unidade da esquerda e que se liguem cada vez mais aos trabalhadores.

Atribuir aos quatro deputados do PSOL e a todo o partido a pecha de oportunistas é apenas um expediente covarde de quem espera a realidade caber em seus sonhos. Isso pode ser poético, mas não é revolucionário.

Cesar Mangolin é sociólogo.


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