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brasil contra dilmaBrasil - Passa Palavra - [Carlos Gonçalves] No domingo 15 de março, vi e li colegas de lutas nas redes sociais dizendo que, se tínhamos uma manifestação de direita dessa envergadura, era por culpa do PT. Seria uma decorrência quase natural de o Partido dos Trabalhadores ter dado tanta prioridade para seu próprio conceito de governabilidade, fazendo excessivas concessões e alianças com setores conservadores, e de ter sufocado o junho de 2013 nas ruas com as polícias estaduais sendo apoiadas pelo Ministério da Justiça, indicando sua contrariedade pela demanda social que então fazíamos. De tanto flertar com a direita, o PT teria obtido o que queria e o que merecia.


Foto: manifestação do dia 15.

Quero manifestar aqui, com todo o respeito às diversas formas de lutas progressistas, minha discordância. Trata-se de uma colocação incorreta e incompleta, porque desconsidera toda a capacidade de agir da direita, isto é, desse grande campo conservador que vemos atuar hoje, dos moderados aos radicais. Não entendo que 15 de março foi culpa do PT, mas sim que houve uma reação organizada, ainda que com uma demanda não uniforme, com ação através das redes sociais e com apoio intensivo da grande mídia. A última, em especial, soube inflar o movimento com grande eficácia, criando condições para que muitas pessoas desacostumadas com as ruas pudessem participar. Mas não façamos a redução complementar, igualmente incorreta, de dizer que foi tudo culpa da mídia. Houve um esforço de todas as partes, um concerto, em que a mídia semeou um terreno fértil.

Insistentemente me vem à cabeça o conceito de pretexto geral, que Marx usa para explicar um dos momentos da Revolução de 1848, especialmente para dar conta de como vários setores da sociedade se juntaram em torno de uma demanda, o sufrágio universal. Vale a pena ler:

Com o ataque ao sufrágio universal [a burguesia] dá à nova revolução um pretexto geral, e a revolução precisava de semelhante pretexto, cada pretexto especial separaria as frações da ligue revolucionária e poria em evidência as suas diferenças. O pretexto geral atordoa as classes meio revolucionárias e permite-lhes iludirem-se sobre o carácter definido da revolução futura, sobre as consequências da sua própria ação. Cada revolução precisa de uma questão de banquete. O sufrágio universal é a questão de banquete da nova revolução. (Karl Marx, As Lutas de Classe em França de 1848 a 1850)

Nos eventos que culminaram no 15 de março, não se pode dizer, evidentemente, que o pretexto geral era revolucionário. Nem mesmo contra-revolucionário, porque afinal não há revolução nenhuma em andamento. Em um nível de análise, foi socialmente conservador, ao desmerecer em intensidades variáveis as políticas sociais e suas conquistas dos últimos doze anos, mas como quase todo pretexto conservador não era confessável. Então travestiu-se de demanda ética, ao dizer que atacava antes de tudo a corrupção. Explicitamente: a corrupção associada ao PT. É essa especificidade que permitiu a congregação de tantos que se autointitularam libertários ou revoltados nos últimos dias. Se fosse um ataque genérico à corrupção, isto é, à do PT, especialmente na esfera federal, bem como à de outros partidos, nas esferas estaduais e municipais, não teria sido pretexto geral, tendo como consequência o fracasso do movimento. O pretexto geral tem poder didático, o que Marx já sabia. Ele tem também poder midiático, como nós muito bem sabemos.

Dito isso tudo, resta ver que o argumento de que a culpa é do PT esconde um outro assunto, o qual devemos discutir com urgência. Ele evidencia uma compartimentação dos movimentos progressistas em nossa atual conjuntura, em que cada setor da esquerda, ou melhor, das esquerdas, tem experimentado uma dificuldade já crônica em dialogar com os demais, dificuldade essa também demonstrada de maneira clara pelo PT. Nas últimas duas vezes em que nos unimos, agíamos sintomaticamente através de pretextos gerais: o valor da tarifa, em junho de 2013, e as eleições presidenciais, em outubro de 2014. Em ambas, obtivemos relativo sucesso, o que mostra o grande potencial de nosso campo. Porém a procura por pretextos gerais será cada vez mais difícil. Poderia ser a revolução, mas ela está fora do horizonte, bem como fora de moda. Então penso que só será possível seguir adiante se aprendermos a compartilhar conjuntos de pautas ao invés de impor pautas isoladas, fortalecendo os movimentos mutuamente, regenerando a confiança recíproca em um projeto político que se possa dizer democrático simultaneamente sob vários pontos de vista e não apenas sob óticas setoriais.

Carlos Gonçalves é Docente do programa de pós-graduação em Estudos Culturais (USP).


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