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masacre curuguatyParaguai - ADITAL - [Federico Larsen] O Massacre de Curuguaty foi o desencadeador do julgamento político que, em junho de 2012, destituiu, em apenas 24 horas, o ex-presidente do Paraguai, Fernando Lugo. Em 15 de junho daquele ano, mais de 300 policiais levaram adiante o despejo das terras de Marina Kue, no Departamento de Curuguaty, que haviam sido ocupadas por cerca de 50 camponeses. Durante a operação, se desatou um intenso tiroteio, que provocou a morte de 11 lavradores e seis policiais.


Faltaram veículos, combustível e pessoal suficiente para entregar a tempo mais de 50 notificações para as testemunhas do julgamento que, nesta segunda-feira, 17 de novembro, iria ser iniciado contra os imputados pelo caso Curuguaty. Com essa impensada justificativa, o presidente do Tribunal de Sentença de Salto del Guairá, Ramón Trinidad Zelaya, explicou o adiamento do procedimento judicial para o próximo mês de junho de 2015. E assim os 16 camponeses acusados pela matança que deixou 17 mortos completarão três anos de prisão preventiva pouco antes de que sejam julgados oficialmente. Quinze deles já cumprem de forma domiciliar, enquanto que Rubén Villalba, líder dos Carperos, organização de camponeses sem terra do Paraguay, continua em reclusão na prisão de Tacumbú, Assunção.

O Massacre de Curuguaty foi o desencadeador do julgamento político que, em junho de 2012, destituiu, em apenas 24 horas, o ex-presidente do Paraguai, Fernando Lugo. Em 15 de junho daquele ano, mais de 300 policiais levaram adiante o despejo das terras de Marina Kue, no Departamento de Curuguaty, que haviam sido ocupadas por cerca de 50 camponeses. Durante a operação, se desatou um intenso tiroteio, que provocou a morte de 11 lavradores e seis policiais. A oposição ao então mandatário paraguaio culpou o governo de "promover o ódio e a violência" no país, e colocou em andamento o que já se conhece como o Golpe Parlamentar de 2012. Baseados "nos fatos que todos conhecem", como figura no veredito, os legisladores destituíram Lugo para colocar no comando seu vice, Federico Franco, do Partido Liberal Radical Autêntico, que se manteve no poder em meio a escândalos de corrupção, até as eleições que consagraram o atual presidente, o colorado Horacio Cartes, em abril de 2013.

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Os 16 acusados pelo massacre são todos camponeses sem terra. Sobre eles estão pendentes as imputações de homicídio doloso, homicídio em grau de tentativa, atentado contra a integridade física, lesão grave, associação criminosa, coação, coação grave e invasão de imóvel alheio. "Hoje, não podem sair do país nem trabalhar", explicou à agência Miradas al Sur o advogado defensor de 11 dos camponeses imputados, Vicente Morales. "Essa suspensão não nos beneficia em absoluto. Os acusados têm filhos, esposas, mães e pais, que convivem com isso todos os dias e estão em uma situação realmente difícil porque no podem dispor de recursos para sustentarem suas famílias e, agora, deverão esperar mais oito meses. A situação, agora, é caótica, diria calamitosa".

A investigação que estabeleceu as acusações esteve a cargo da polícia e do Ministério Público, já que Franco, nem bem tomou o poder, desativou a comissão independente – que contaria com a ajuda da Organização de Estados Americanos –, instaurada por Lugo para esclarecer o ocorrido. O caso foi instruído pelo promotor Jalid Rachid, filho de Blader Rachid Lichi, ex-presidente do Partido Colorado, da mesma forma que Blas Riquelme, dono da empresa Campos de Morombí, que solicitou o despejo de Marina Kue. Para formular as imputações, Rachid se baseou no testemunho de 84 policiais e nenhum camponês.

Morales denunciou: "vulnerações muito sérias ao devido processo e ao direito a defesa". Segundo o letrado, "há uma fabricação de uma suposta cena do crime, não houve o menor cuidado da cadeia de custódia, que corresponde às forças de segurança e ao Ministério Público, foram introduzidas provas de maneira ilegal, todas irregularidades legitimadas pela Justiça".

A reconstrução dos fatos que a acusação apresentou, efetivamente, tem sérias contradições. Segundo o promotor, os 50 camponeses teriam tendido executado uma armadilha para mais de 300 policiais armados, com a finalidade de assassinar seis integrantes da força pública. "Isso é absolutamente absurdo", assegurou Morales a respeito. "Os policiais eram mais de 300, com metralhadoras, helicópteros, escopetas e granadas. E os camponeses não eram mais do que 50, mal alimentados, doentes, com dengue e com seus filhos de um e três anos que, supostamente, estavam sendo utilizados como isca". O advogado também denunciou que, na fase de instrução, "apareceram caixas cujo conteúdo a defesa desconhecia. E isso é uma clara violação ao devido processo. Para resolver esse problema, a juíza de garantias ordenou abrir essas caixas e, graças à nossa insistência, se descobriu que as caixas eram nove e não três. Entre essas caixas com provas inominadas apareceu uma escopeta que esteve no lugar do ocorrido e o dono tinha denunciado que teria sido roubada uma semana depois do massacre. Esta e outras barbaridades foram admitidas pela juíza de garantias".

Trata-se da segunda vez que se posterga o início do julgamento. Já em junho deste ano, o mesmo tribunal tinha suspendido o julgamento para que fossem resolvidas algumas contradições relativas à propriedade da terra tomada. Marina Kue é um terreno que pertenceu à armada paraguaia de 1967 a 1999. Segundo as medições judiciais realizadas nos anos seguintes, a empresa Campos Morombí, dona dos hectares vizinhos a Marina Kue, foi apropriando-se, progressivamente, de algumas partes do que já se considerava terreno fiscal. Essas terras, em princípio, não foram incluídas dentro da tentativa de reforma agrária, que esboçou, timidamente, o governo de Lugo sobre a qual, no Paraguai, são denominadas terras mal havidas, cerca 7.800.000 hectares adjudicados de maneira fraudulenta pela ditadura de Stroessner e os seguintes governos colorados a amigos do poder.

Entre as terras mal havidas figuram 1.498 hectares entregues ao pai do promotor Rachid, em 1986, segundo o informe público elaborado pela Comissão Verdade e Justiça sobre os crimes perpetrados pela última ditadura no Paraguai. Em junho de 2012, os camponeses reclamavam a inclusão das terras de Marina Kue na reforma agrária e sua distribuição entre o campesinato, e a empresa que, no fim dos anos 1990, se apropriou delas exigiu o despejo das mesmas. "É por isso que entendemos que não temos que ir a julgamento por invasão de imóvel até que não se resolva a questão de fundo da propriedade dessas terras", apontou Morales, que também contestou a acusação de associação criminosa, por basear-se na lista de nomes de pessoas organizadas na associação de moradores Naranjaty, apontada em um caderno ao qual a defesa não teve acesso porque, segundo a promotoria, "se molhou e ficou ilegível".

No último dia 31 de outubro, Morales viajou para a abertura do 147º período de sessões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), para denunciar "as execuções que se produziram por parte das forças de segurança em Curuguaty e que, no Paraguai, a promotoria se nega a levar em conta e, até hoje, nunca investigou. Somente foram investigadas as mortes dos policiais e essa discriminação não é aceitável no direito. Tem que investigar cada morte e descartar acusações para cada parte. Aqui, nunca foi realizada uma investigação completa. Nós, já em outubro de 2012 apresentamos uma denúncia formal ante o mesmo promotor por detenções arbitrárias, torturas e desaparecimentos forçados".

O caso da ocupação de terras no Paraguai é um processo que se dá em um contexto de altíssima concentração da propriedade da terra. Segundo dados oficiais, 2,6% dos proprietários têm 85% da terra cultivável do país e por isso os defensores dos imputados creem que a Justiça se inclinará uma vez mais para o lado do poder. "Nós queremos um julgamento justo, mas sabemos que vai ser uma sentença marcada. Os camponeses têm uma condenação prévia. Vamos fazer tudo o que seja preciso fazer quanto às reclamações, apelações de inconstitucionalidade, até na Corte Interamericana de Direitos Humanos, quando tenham sido esgotados todos os requisitos das instâncias internas".

Fonte original: Mirada Sur.


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