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aida4Colômbia - Diário Liberdade - [Vitor Taveira] Exilada na Suíça há 17 anos, Aida Abella (foto) é candidata à presidência pela Unión Patriótica, partido criado pelas Farc que teve cerca de cinco mil militantes assassinados nos anos de 1980 e de 1990.


"Nos atiraram com uma coisa longa, não era um revólver", diz uma voz tremida. "Era uma bazuca?" pergunta a radialista. "Sim, foi terrível. Façam algo, por favor. (...) Querem nos matar porque somos da UP". Grita na rádio desesperada Aída Avella, então vereadora de Bogotá e presidente do partido de esquerda colombiano Unión Patriótica (UP). Ela acabara de escapar ilesa de um atentado contra seu carro no ano de 1996. Dias depois sairia da Colômbia para exilar-se na Suíça.

Passaram-se 17 anos, seis meses e quatro dias até Aída pisasse novamente em solo colombiano. Apenas no último mês de novembro ela voltaria a seu país para um momento emocionante: o relançamento da UP, que acabava de ser refundada. Para aumentar a emoção, o congresso do partido, com cerca de dois mil delegados, decidiu indicá-la como candidata presidencial para as eleições que acontecem em maio.

Quando desembarcou no aeroporto El Dorado, em Bogotá, dezenas de militantes a esperavam Sua primeira reação foi erguer o punho e cantar junto com os presentes o hino da UP.

Em seguida disse por que voltava depois de tantos anos. "Viemos convencidos de que vamos alcançar a paz neste país. Viemos convencidos que a luta de nossos amigos, de nossos companheiros, de nossos militantes não foi em vão!"

Mesmo com a dureza do exílio, Aída teve uma sorte que muitos de seus companheiros de partido não tiveram. Estima-se que entre meados dos anos 80 e o final dos anos 90, cerca cinco mil militantes do movimento Unión Patriótica foram assassinados, história contada no documentário "El Baile Rojo". Na lista de mortos estão prefeitos, vereadores, deputados, senadores e dois candidatos à presidência do país, Jaime Pardo Leal e Bernardo Jaramillo Ossa.

"Foram os políticos, o Estado, estiveram envolvidos militares e também empresários", denuncia Avella. "As últimas declarações dos chefes paramilitares que executaram os crimes confirma com muitos detalhes o que a UP sempre denunciou", diz ela. Embora não esteja tipificado este termo nos órgãos internacionais, muitos se referem ao extermínio da UP como um caso de "genocídio político". Depois de tantas mortes, o partido perdeu seu registro por não se apresentar nas eleições de 2001, por falta de garantias de segurança.

Sem garantias políticas, campanha pode ser feita no exílio

No exílio, Aída nunca deixou de lado a militância política nem sua pátria. "Nós vivemos na Suíça, mas nunca fomos embora da Colômbia. Sempre estivemos em contato permanente com a pátria. Tivemos a sorte de estar numa cidade internacional onde está a sede de importantes órgãos internacionais, onde pude dar continuidade ao meu trabalho político", conta ela, sempre utilizando a primeira pessoa do plural.

Morando em Genebra, Aída foi representante da Federação Sindical Mundial na ONU e também da Federação Democrática Internacional de Mulheres, nas quais trabalhou com várias causas mundiais e especialmente com temas relacionados a seu país. Vivia uma vida dupla no exílio. "Pela manhã trabalhava numa fábrica de chocolate artesanal para pagar as contas. Pela tarde saía para trabalhar pelo meu país. Era como viver em dois países. De manhã vivia na Suíça, e de tarde, na Colômbia. De manhã fazia o trabalho pelo qual me pagavam e pela tarde fazia meu trabalho político, que era voluntário", conta.

Ela considera que os anos na Suíça foram de aprendizado sobre a classe política, sobre tolerância e sobre políticas que positivas que poderiam ser adaptadas para a realidade de seu país. "A Suíça é um país capitalista desenvolvido, mas com uma profunda sensibilidade social, onde se dá a quem não tem. Ninguém fica desamparado", admira.congresso-up

Aída Avella diz que está trabalhando pelo diálogo e conclama à unidade da esquerda no país. "A esquerda está um tanto desunida e isso não será bom no momento eleitoral. Se saímos juntos numa frente podemos ganhar mais do que se nos dividimos". A dirigente da UP pretende realizar um diálogo com todos os pré-candidatos da esquerda para buscar esta convergência. O primeiro pacto foi selado com a Alianza Verde, com a qual lançará uma lista única ao Senado, embora apoiando candidatos diferentes para a presidência.

Depois de alguns dias de articulações políticas na Colômbia, Aída voltou para a Suíça. Mas regressou a seus país natal em dezembro para estar alguns meses. Ainda não sente que haja plenas garantias políticas para ficar. "Se não for possível fazer a campanha aqui podemos fazê-la desde o exterior, por toda América Latina, no Equador, por exemplo, existem muitos colombianos refugiados pela violência. É importante que saibam o que pensamos para o país", considera a dirigente.

Partido foi idealizado pelas Farc

A UP foi fundada em 1985 no marco de diálogos de paz que se realizavam entre o governo de Belisario Betancur e as Forças Armadas Revolucionarias da Colômbia (Farc) em meados dos anos 80. O partido que teve como um de seus idealizadores o comandante guerrilheiro Jacobo Arenas permitiria a incorporação dos insurgentes à vida legal e à política institucional. A UP ganhou adesão de diversos militantes sociais e até de membros de partidos tradicionais que estavam insatisfeitos.
Alguns membros das Farc chegaram a ser eleitos, mas acabaram voltando à luta armada diante do início da perseguição e assassinato massivo de membros da UP. Sobrou a sociedade civil dentro do partido, mas o massacre continuou. "Em 1986, quando participou pela primeira vez em eleições, a Unión Patriótica teve uma votação histórica para a esquerda. O país estava mudando e a UP foi vista como uma opção dentro do jogo de poder. Então decidiram que tinham que nos liquidar", conta Avella.

Para Aída, o extermínio da UP, representou a destruição de uma geração que poderia ter transformado o país. Ela assinala que apesar da Colômbia se gabar de ser a mais antiga democracia da América Latina, dentro de seu sistema democrático foram assassinadas mais pessoas que em muitas ditaduras militares. "Fizeram coisas bárbaras, inimagináveis mesmo nas ditaduras, como esquartejar gente viva com motosserras, cortar cabeças, jogar gente viva a animais famintos, ter crematórios como tinham os campos de concentração nazistas. São coisas que me dá vergonha contar, mas que são parte deste momento obscuro da história colombiana", lamenta, lembrando que enquanto isso acontecia a classe política se mantinha inerte como expectadora. Ela ressalta que se as ditaduras acabaram, os crimes na democracia colombiana continuam até hoje.

Entretanto, a dirigente se mostra otimista com os diálogos de paz que vêm sendo realizados desde o ano passado entre as Farc e o governo colombiano em Cuba. "É um momento histórico, pois a insurgência chegou a um acordo em pontos muito importantes como a questão agrária e a participação política". Ela acredita que é necessário apostar todas as fichas numa saída política e negociada para o conflito armado. "Vemos uma luz no fim do túnel da violência e queremos mantê-la acendida. Não podemos mais ter ódio, porque a geração que vem vai nos agradecer se somos capazes de construir um país distinto. Ou a história nos julgará se formos incapazes".

 Vitor Taveira é jornalista e integrante do coletivo Agenda Colômbia-Brasil.

LINK: Documentário El Baile Rojo, sobre o genocídio da Unión Patriótica.


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