1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 (0 Votos)

301015 vallejoChile - Blog do Sorrentino - A partir da publicação na coluna de educação no site Carta Maior e de entrevista com a Deputada Nacional pelo Partido Comunista do Chile, Camila Vallejo


Em 2011 o movimento estudantil chileno ficou conhecido pelo mundo todo diante das multidões que ocuparam as ruas denunciando a mercantilização da educação deste país. Nesse sentido, revelaram uma situação até então desconhecida fora do país. O Chile, considerado por muitos como país com status de primeiro mundo, que havia universalizado o acesso ao ensino superior, passou a ser o Chile da educação como serviço, do negócio e atrelada a estratégia neoliberal. Essa realidade foi descortinada pelos estudantes.

No Chile mais de 60% das matriculas em ensino superior são oferecidas pela rede privada e as universidades públicas recebem do Estado o equivalente a 15% do seu orçamento. O restante é completado pela cobrança de mensalidades, projetos de pesquisa e demais ferramentas encontradas pelas instituições. Esse processo foi iniciado durante ditadura de Pinochet, teve um ápice nos anos 90 e foi radicalizado pelo governo de Piñera. Assim, a luta empreendida pelos estudantes chilenos era, em 2011, e continua sendo, em 2015, pela superação do modelo de educação do período ditatorial.

As manifestações foram conduzidas pela Confederação dos Estudantes do Chile (CONFECH), um espaço de articulação das entidades locias e DCE’s com o objetivo de organizar a luta em defesa da educação. Neste processo destacaram-se as lideranças de Giorgio Jackson, Camilo Ballesteros, Karol Cariola e Camila Vallejo. Camilo foi presidente da Federação de Estudantes da Universidade de Santiago (FEUSACH), candidato a Alcalde em um distrito de Santiago e hoje é Secretário Geral de Governo, é militante do Partido Comunista do Chile. Giorgio Jackson atualmente é deputado e foi presidente da Federação de Estudantes da Universidade Católica. Karol Cariola é Secretária Geral das Juventudes Comunistas do Chile (JJCC) e Deputada Nacional. Camila Vallejo é formada em Geografia pela Universidade do Chile, militante das JJCC e foi presidenta da federação de estudantes desta universidade (FECH). Camila se tornou a principal figura pública das manifestações estudantis de 2011 sendo eleita como personalidade do ano pela revista Forbes e chegou a atingir índices de popularidade maiores aos do então presidente Sebastian Piñera. Esta luta dos estudantes chilenos possibilitou a realização de uma Jornada Continental em defesa da educação integrando diversos países em mobilizações, e passeatas.

Diante disso, a pauta da educação assumiu centralidade na disputa sobre os rumos do país. Na campanha eleitoral Bachelet assumiu a pauta dos estudantes e como presidenta apresentou o projeto de Reforma Educativa que, entre outros elementos, proíbe o lucro na educação.

Por isso, compartilhamos aqui entrevista publicada na coluna de educação no site Carta Maior com a Deputada Nacional pelo Partido Comunista do Chile, Camila Vallejo sobre os desafios da educação chilena no contexto atual.

‘A lógica do mercado prevalece na educação chilena’
Por Gustavo Gerrtner

A conhecida dirigente estudantil fala sobre as mudanças no sistema educacional do país, onde liberdade de ensino que se confunde com a liberdade de empresa

Camila Vallejo não se deixa enganar pelos indicadores econômicos. O último Informe de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas poderia situar o Chile dentro do grupo de estados com “alto desenvolvimento humano” no âmbito da educação. Mas para ela, a educação em seu país continua sendo dominada por uma lógica mercantilista, que se reflete no alto custo econômico para as famílias dos estudantes. Nos bastidores do Centro Cultural Kirchner, minutos depois de concluir sua conferência “Política, Luta e Hegemonia” – na qual falou quase sem olhar suas anotações – a ex-dirigente estudantil, hoje deputada comunista, falou com o diário argentino Página/12, sobre os obstáculos que a criação de um sistema educacional de qualidade e voltado para a maioria da população do Chile. “Quando havia vontade de mudar, não havia maioria política para levar a essas mudanças, quando conseguimos gerar maior consenso dentro do mundo político, através das pressões dos movimentos sociais, lamentavelmente, os acordos que mantêm o sistema político e sua carga ideológica falaram mais alto”, afirmou.

Para Vallejo, nos últimos 25 anos, os governos que sucederam a ditadura de Pinochet (1973-1990) não quiseram ou não puderam reformar o sistema educativo devido à influência da ideologia neoliberal dentro da política chilena. “Esse pensamento penetrou alguns setores da Concertação (coalizão política que governou o país entre 1990 e 2010), através do convencimento ideológico, mas também devido à rede de privilégios e benefícios gerada pela mercantilização”, comentou ela. “Muitos se tornaram administradores privados das escolas públicas, donos ou acionistas de universidades, todos são parte do negócio e isso impede uma mudança mais radical no setor”. As políticas educacionais implantadas no Chile transformaram a educação do país num enorme negócio, onde até mesmo as escolas públicas, administradas por grupos privados, fundações ou cooperativas de professores, cobram mensalidades.

Vallejo lembra que algumas das mesas de trabalho criadas no Congresso durante os governos anteriores contou com a participação de acadêmicos, políticos e também dos dirigentes estudantis, como ocorreu após a chamada “Revolução dos Pinguins” (nome dado à mobilização realizada em 2006 pelos estudantes secundaristas, conhecidos como “pinguins”, devido ao seu uniforme engravatado), mas que depois, essas deliberações eram levadas ao parlamento, onde tinham que ser negociados com a direita. “Dessa época, surgiu uma lei (em 2009, durante o primeiro governo de Michelle Bachelet) que não representava o que havia sido conversado nas mesas de trabalho. Essa foi a grande traição ao Movimento Estudantil, que ainda não esqueceu o que aconteceu”, contou a deputada, que naquele então era presidenta da Federação de Estudantes da Universidade do Chile.

O Partido Comunista chileno, ao qual Vallejo representa no Congresso, forma parte da Nova Maioria, a coalizão que governa o país. “Em algum momento, o esforço que fazemos agora para impulsar as reformas, entre elas a do sistema educacional, vai esbarrar na questão constitucional”, explicou ela. “Podemos fazer muitas coisas, mas estamos sempre sob o risco de sermos impedidos pela inconstitucionalidade, já que o que prevalece na atual Constituição (imposta durante a ditadura de Pinochet) é um conceito de liberdade de ensino que se confunde com liberdade de empresa. E para mudar a Constituição, necessitamos de um quórum muito maior que o que temos agora no parlamento”, lamentou.

Em setembro, a presidenta chilena Michelle Bachelet apresentou ao Congresso o orçamento para o ano de 2016, que, se aprovado, financiará a educação gratuita para um milhão e meio de alunos da rede pública e mais de 200 mil universitários que pertencem aos extratos socioeconômicos mais vulneráveis do país. Assim, o de Educação passaria a ser o ministério que com mais verbas do país. Vallejo reconhece avanços no projeto, mas considera que será insuficiente, devido às mudanças estruturais que as escolas necessitam, e que requerem um investimento muito maior. “Existe uma dívida histórica tão grande com a educação pública que para alcançar a qualidade que queremos é preciso investir em vários outros aspectos”, alertou.

“Precisamos inovar em investigação, desenvolvimento científico e tecnologia, criar um maior vínculo entre as instituições de educação superior e os territórios ao qual elas pertencem. Com o projeto atual de reforma educacional, estamos promovendo o fim do lucro na educação pública chilena, e eliminando a segregação nas escolas e o financiamento compartilhado entre o Estado e as famílias. Significa que nenhuma escola poderá discriminar alunos, que demos um primeiro passo para haver gratuidade no sistema educacional chileno, que vai começar nos níveis menores, e depois chegará à educação superior. Mas ainda temos poucos detalhes sobre os fundos que serão destinados à recuperação da educação pública”, opinou Vallejo, que recebeu há dois anos seu diploma de Geografia, da Universidade do Chile.

“O discurso de buscar ter o PIB e o crescimento mais alto da América Latina tem sido uma grande falácia, porque não se transformou em melhores condições de vida para a população”, sentenciou. “Os governos posteriores à ditadura consolidaram a separação entre o povo e o Estado”, analisou a deputada. “A perseguição às organizações sindicais, ao mundo da cultura, professores e estudantes gerou uma ferida social brutal, que se reflete hoje no temor que os pais têm de que os jovens participem da política”. Para a deputada, a onda de ojeriza à política foi instalada pelos meios de comunicação, e também por iniciativas impulsadas dentro do sistema educativo. Segundo ela, para reconciliar o povo e a política, é preciso aprofundar a democracia. “Não podemos restringir a participação da cidadania na política a um voto dado a cada quatro anos. O Estado deve ter instâncias locais ou comunitárias de participação política. Por outro lado, a sociedade civil deve compreender a dimensão e a importância de formar parte do Estado, de disputar os espaços políticos, e não se isolar ou dizer que `esse mundo é tão podre que é melhor não se envolver´, e perceber que pode e deve se envolver”.

Tradução: Victor Farinelli

De líder estudantil a deputada mais votada do Chile
Por Victor Farinelli

Ela hoje é uma das políticas mais conhecidas do país, mas há cinco anos atrás era somente uma dirigente estudantil sem grandes pretensões além de se formar em Geografia e passar férias em Florianópolis.

Em 2011, Camila Vallejo foi eleita presidente da Federação de Estudantes da Universidade do Chile – que apesar de ser a maior instituição de ensino superior do país, não é gratuita, pelo contrário, é uma das que possui a mensalidade mais cara. Em maio daquele mesmo ano, durante o governo de Sebastián Piñera (2010-2014, o primeiro da direita chilena após a ditadura), ela liderou as primeiras marchas estudantis contra o sistema educacional chileno e o super endividamento que ele causava às famílias. As marchas tiveram alta convocatória, e passaram a ser semanais. Uma dessas marchas, em meados de julho daquele ano, chegou a reunir 300 mil pessoas no centro de Santiago e 500 mil contando as realizadas simultaneamente nas capitais das províncias, tornando-se a maior manifestação realizada no país após a ditadura.

O movimento liderado por Vallejo instalou definitivamente a educação como o assunto prioritário no debate político chileno, o que ficou evidente dois anos depois, quando a disputa presidencial se deu entre a ex-presidente Michelle Bachelet, que buscava voltar ao Palácio de La Moneda com a promessa de uma reforma educacional com bases semelhantes às demandadas pelo Movimento Estudantil, e a líder conservadora Evelyn Matthei, cuja proposta era a de manter e reforçar o modelo mercantil de educação. Em dezembro de 2013, Bachelet foi eleita com 63% dos votos, resultado que evidenciou o apoio popular por mudanças profundas na educação.

Naquele mesmo processo eleitoral, o Movimento Estudantil levou quatro dos seus líderes para a Câmara dos Deputados, com destaque para Camila Vallejo, que foi a deputada mais votada do país e foi preponderante para que o Partido Comunista tivesse o seu melhor desempenho eleitoral desde o retorno da democracia – conseguindo seis das 120 cadeiras da Câmara.


Diário Liberdade é um projeto sem fins lucrativos, mas cuja atividade gera uns gastos fixos importantes em hosting, domínios, manutençom e programaçom. Com a tua ajuda, poderemos manter o projeto livre e fazê-lo crescer em conteúdos e funcionalidades.

Microdoaçom de 3 euro:

Doaçom de valor livre:

Última hora

Quem somos | Info legal | Publicidade | Copyleft © 2010 Diário Liberdade.

Contacto: info [arroba] diarioliberdade.org | Telf: (+34) 717714759

Desenhado por Eledian Technology

Aviso

Bem-vind@ ao Diário Liberdade!

Para poder votar os comentários, é necessário ter registro próprio no Diário Liberdade ou logar-se.

Clique em uma das opções abaixo.