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241013 leivaColômbia - O Diário - O ex-ministro Álvaro Leyva, protagonista dos processos de paz com as Farc desde os anos 80, diz que para assinar a paz é necessária uma constituinte e que esse grupo preferiria correr riscos sem Santos a deixar-se pressionar com um referendo que não lhe oferece garantias.


Numa semana chave para o trâmite do referendo de paz proposto pelo Governo, El Espectador falou com o ex-ministro Álvaro Leyva, que sustenta que as Farc não aceitarão nunca esse mecanismo de referendo, uma vez que incorpora algo de que o país não foi informado: atribui ao presidente Santos competências do âmbito dos três ramos do poder para el processo de paz.

O processo de paz agoniza? Ou é normal o que está a acontecer?

Nem está agonizando nem é normal. Está num momento difícil, porque não estamos apenas num processo de paz, mas no meio de outros ingredientes: eleições e reeleição de Santos.

Todos os problemas que há decorrem da necessidade do presidente Santos de fazer-se reeleger?

Há insistências do Governo na mesa que são necessidades dele mesmo, mas que não são requisitos para se atingir a paz. ¿Quais? O referendo. El Governo quer amarrá-lo a uma data eleitoral, quando o ponto nem sequer está sendo abordado na agenda. Quer dizer: por um lado o Governo insistiu em que não se saísse da agenda e em que os pontos devem ser abordados exactamente nos termos em que foram incluídos nela. A referendação, que não pode ser confundida com o referendo, é o ponto seis e neste momento está a ser fechado o ponto dois. Se fazem o referendo e se baralha a agenda depois de dizer que é imodificável, é porque o Governo se deparou com uma necessidade alheia ao próprio processo para chegar à paz.

O referendo é um tema que tenha vindo a ser tratado na mesa?

É um tema extramesa no sentido em que não devia ultrapassar nem se podia dizer nada sobre ele, entre outras razões porque se estaria a antecipar o ponto correspondente da agenda.

Foi apenas o Governo quem ultrapassou a agenda?

O Governo queixa-se muito de coisas que eles (as Farc) fazem sair, como quando falaram das interrupções que não estão na agenda, mas se ocorre uma eles falam do assunto. Isso leva a que o Governo tenha que dizer que as Farc estão a sair da agenda. Embora Santos tenha dito que nada do que se diga por fora da mesa é válido, quem mais fala por fora da mesa é ele. É como se dissesse ao público que muitas das coisas que diz não valem. Há pressas que levam a tropeços.

As interrupções debilitaram o governo. Convém às Farc um Santos debilitado perante a opinião pública?
Aqui houve uma coisa a que toda a gente não ligou. Um amigo do Governo disse-me há oito dias: se tivéssemos abordado a questão na altura devida não estaríamos metidos nisto. E é o adiamento do calendário eleitoral. Não o da presidência, mas de todos.

Adiamento ao qual Piedad Córdoba deu apoio.
Ela não entendeu bem a proposta. Piedad, que é uma pessoa que admiro apesar de não estar em contacto com ela, realiza um trabalho que aplaudo e respeito, mas às vezes diz coisas a destempo. Era necessário que isso tivesse saído da mesa, não era para ser apresentado desta forma, porque assim foi morto à nascença. Estaríamos numa situação completamente diferente se tivesse sido bem feito.

Porque queriam as Farc adiar o calendário eleitoral?

Olhe, interpreto essa proposta de forma benévola para o Governo, significava que queriam fazer a paz com Santos. Porque se não estivessem a procurar a paz com ele, não teriam feito essa proposta. Creio que eles prefeririam correr riscos sem Santos, do que ver-se metidos na engrenagem de um referendo para o qual não existem as garantias que se estão a procurar. Há uma deficiência de análise política enorme no Governo. Seria uma vergonha que dentro de um mês tivessem que dizer que referendo não, porque para ele são necessárias duas partes.

As Farc aceitarão el referendo?

Não, não o vão aceitar. Mas não porque seja eu a dizê-lo. O referendo tem que incluir uns ingredientes que para eles são fundamentais, como o Quadro Jurídico para a Paz. Propõem-lhes um quadro jurídico que nem sequer está desenvolvido legalmente. Um quadro que requer uma lei estatutária e conhecimento do Tribunal Constitucional. Pedem-lhes que se metam num referendo sem saber a que vai conduzir.

Isso quer dizer que as Farc não têm a intenção de assinar acordos antes das eleições?

No há compromisso de data, aqui foi colocado um prazo que coincide com a necessidade de quem quer reeleger-se. Quando foi acordada a agenda os representantes do Governo não tiveram isso em conta, ou pelo menos não fixaram nada que estabelecesse que isto decorreria até ao momento em que se aproximassem eleições. Sai uma data da cartola porque há uma necessidade eleitoral.

As Farc podem dizer que não têm relógio, mas não seria prejudicial para eles se Santos não é reeleito?

Falei com interessados na Presidência e há um duplo discurso, um para dentro e confidencial, e outro para fora. Aqui a ideia positiva que ficou de Uribe foi a segurança democrática, então muitos dos personagens que estão na actividade política devem manter essa bandeira, porque é a altura de vir para a rua angariar votos. De tal forma que em princípio não daria crédito aos que estão hoje na arena política porque andam atrás dos votos e de subir nas sondagens.

Que proximidade tem em relação a este processo?

Sinto-me muito próximo porque não há coisa que aconteça para a qual não tenha imediatamente uma opinião.

Tem contacto com gente em Havana ou não?

Se for necessário pode procurar-se, há uns que dizem que sim, outros que dizem que não. No próximo ano cumpro 30 anos de vinculação aos processos de paz, isso leva a que possa estar a par de muitas coisas acerca das quais não necessito de conversar.

Insisto, Teve contacto com a gente de Havana?

Numa ocasião fui a Havana e disse-o, para que não ficassem a pensar que estava a conspirar. Procurei o ministro do Interior e não me quis receber, insisti no Palácio e tão-pouco me quiseram receber. Pedi uma entrevista ao irmão do presidente e foi-me concedida, marcou uma data, mas na manhã cancelaram. Procurei Angelino Garzón, Juan D. Jaramillo, não foi possível. Não podemos estar onde não nos chamem.

Queria falar com eles porque vinha de Havana de falar com quem?

Nesse momento estive com eles e aqui souberam-no. Pareceu-me ter captado uma serie de coisas úteis, mas não podemos transmitir se não querem ouvir-nos. Isso faz com que a pessoa tome medidas, mas não significa que não tenha opinião segura acerca do que está a suceder e que não tenha a capacidade suficiente para prever.

Cuando esteve em Havana falou-lhes da constituinte?

Quando há má vontade e falta objectividade sucede uma postura negativa. Eu tenho sido amigo da constituinte. Muitos dizem que as Farc são amigas da constituinte porque eu o disse. Mas não, eles são amigos da constituinte desde há muito. Vários anos atrás falei muito com eles por radiotelefone e tenho gravações de Jacobo Arenas dizendo que isto requer uma constituinte. Depois trataram de entrar na constituinte e por isso se fez Caracas para tentar que eles pudessem entrar, mas De la Calle impediu-o. Tudo de Havana foi inventado para a constituinte, então eles têm uma coisa muito forte que o Governo não quis compreender, eu posso desaparecer do mapa, pero eles vão continuar a insistir num fio histórico. Eles movem-se como se movem os cristãos, colados à história e isso o Governo sabe-o.

É assessor das Farc? 

Há muitos que acreditam nisso. Cada qual diz o que quer, essa lição aprendi-a há anos. Depois de superar aspirações e lutas de carácter pessoal, a minha única missão é a paz, acima dos interesses de partidos e pessoas, por mais valiosas que elas sejam. Isso tem todavia o seu preço, eis o que penso depois de estar quase 30 anos nas lides da reconciliação.

‘Propuseram-lhes criar um “congressinho”’

Timochenko’ ameaçou contar coisas que o Governo lhes propôs em privado. ¿O que é que não sabemos?
Sei que lhes propuseram um “congressinho”, mas ninguém sabe para quê.

Como assim um “congressinho”?

Que no referendo sejam atribuídas ao presidente competências para o desenvolvimento da agenda, para que dite decretos, leis e reformas da Constituição.

O que está a dizer é que esse referendo envolveria a criação de um “congressinho” para que a Santos sejam atribuídas umas competências e que legislativamente possa fazer o que quiser?

E todos os temas da paz! ¡Imagine-se um único senhor decidindo sobre o agro e a política! Esses temas estão incluídos no acordo de paz.

Isso foi dito às Farc pelos negociadores do Governo?
Sim. Isso que tem sido dito sotto voce tem começado a transpirar, entre outras coisas porque la carta de Timochenko o explica: um “congressinho” com um Congresso existente.

Adiada a viagem dos congressistas a Cuba

Esse “congressinho” estaria supostamente composto por quem?

Vá-se lá saber. Ver-se-á quando for dado a conhecer o que o Governo propôs às Farc sobre esse “congressinho” e sobre o que inclui o referendo.

Então, o que ‘Timochenko’ ameaça contar é o que lhes propuseram sobre o referendo e o “congressinho” ou há muitas coisas mais?

Não sei, o meu atrevimento não vai tão longe. Mas imagine-se quantas coisas não terão ali conversado.

Os congressistas têm noção da intenção desse referendo em atribuir competências extraordinárias ao presidente?

Não creio. Por isso intuo que está em suspenso a data da deslocação dos congressistas a Havana.


Fonte: El Espectador, 1 Outubro 2013


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