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010813 maconhaUruguai - RBA - Se medida passar no Senado, país será primeiro do mundo em que o governo assumirá a produção e a distribuição da droga. Medida quer combater tráfico pela via econômica.


A Câmara dos Deputados do Uruguai aprovou na madrugada de ontem (31) por maioria estreita, 50 votos a 46, projeto de lei apresentado pela presidência no ano passado propondo a legalização e regulamentação da venda de maconha no país. O texto prevê a criação de um órgão governamental para controlar a importação, plantio, cultivo, colheita, produção, aquisição, armazenamento, comercialização e distribuição da maconha e seus derivados. Ou seja, a ideia é estatizar toda a cadeia de produção da substância, combatendo o tráfico de drogas pelo flanco que o governo do presidente José Mujica considera mais eficaz: o econômico.

Agora, o projeto segue para o Senado. Caso seja aprovado, o país vai se tornar o primeiro do mundo a adotar tal medida. Não haverá risco de que o Uruguai se transforme num destino turístico para apreciadores da maconha, pois apenas cidadãos uruguaios poderão ter acesso – e acesso restrito – à maconha estatal. Após se registrarem, os usuários poderão comprar até 40 gramas mensais nos postos de venda oficiais. Também será permitido o cultivo para consumo próprio ou em clubes de fumantes. A legislação prevê ainda a criação do Instituto Nacional de Canabis para controlar a produção e distribuição da droga, impor sanções aos infratores e formular políticas educacionais para alertar sobre os riscos do uso de maconha.

Em entrevista recente ao sociólogo Emir Sader, José Mujica, que pessoalmente é contrário ao consumo da droga, salientou que a medida tem como principal objetivo acabar com a criminalidade associada ao narcotráfico. Pronunciamentos oficiais do presidente também argumentavam nessa direção. "Hoje damos um passo enorme para transformar uma política de drogas baseada no moralismo e na hipocrisia, que tem prejudicado sobretudo os mais pobres, jovens e mulheres", comemorou Sebastián Sabini, deputado do partido governista Frente Amplio e um dos maiores defensores do projeto, em sua página no Facebook. "Para a violência e a guerra nos países do sul, a proibição é um grande negócio. Hoje, mudamos um pouco a história."

Na Câmara, o texto foi aprovado após mais de 13 horas de debate, graças aos parlamentares frenteamplistas, que conseguiram impor maioria suficiente na Casa, impedindo a oposição de bloquear a proposta. Como o governo domina o Senado, a expectativa agora é de uma aprovação fácil. Se se concretizar, a aprovação da maconha será o terceiro passo dado pelo país no sentido da ampliação dos direitos individuais de seus cidadãos. Recentemente, o Uruguai descriminalizou o aborto e legalizou o casamento entre pessoas do mesmo sexo. O país é governo pela esquerda há sete anos, primeiro com Tabaré Vázquez, que deve se candidatar novamente, e, desde 2010, com José Mujica.

Avanços

"Não sou favorável à legalização das drogas, mas entendo que continuaremos colhendo resultados muito mais negativos se mantivermos as atuais políticas de luta contra o narcotráfico. Não apenas no que se refere aos gastos públicos com segurança e combate ao crime, mas também porque esse modelo fracassou em afastar os jovens das drogas", ponderou à RBA Carlos Alejandro, dirigente do Frente Amplio, que está na capital paulista participando do 19° encontro do Foro São Paulo. "Talvez devamos pelo menos questionar o que temos feito até agora em se tratando das drogas. Com o tempo veremos se esses novos mecanismos surtirão os efeito esperados. Queremos que seja positivo e que resolva o problema."

De acordo com Daniel Esteves, outro dirigente do Frente Amplio que está em São Paulo, apesar das posições pessoais, morais ou religiosas de cada uruguaio, os debates públicos no país têm se pautado historicamente pela racionalidade. "As recentes conquistas sociais não são mérito apenas da nossa esquerda, mas também dos princípios laicos que têm sido respeitados pela maioria da população desde o começo do século passado", explica. "A laicidade tem permitido discutir esses temas com a cabeça mais aberta do que em outros países do continente, onde o peso das igrejas católicas e evangélicas é muitas vezes desmesurado. Assim, a luta política é muito mais racional do que seria se colocássemos assuntos como dogmas ou pecado no meio do debate."

De acordo com a Efe, o órgão da ONU encarregado de vigiar o cumprimento dos tratados internacionais sobre drogas demonstrou "preocupação" com a aprovação do projeto de lei que descriminaliza a produção e distribuição de maconha no Uruguai. A Junta Internacional de Fiscalização de Entorpecentes (Jife) disse em comunicado que, se a lei for aprovada definitivamente no Senado, estaria em "completa contravenção" com as disposições dos tratados internacionais sobre drogas, dos quais Uruguai é signatário. A Jife assegurou que sempre teve como objetivo manter um diálogo com as autoridades uruguaias sobre o assunto, e lamentou que o governo do Uruguai se negasse a receber a uma missão do organismo antes de apresentar o projeto de lei diante da Câmara para seu debate.

Críticas

"Estamos brincando com fogo", disse o deputado Gerardo Amarilla, membro do Partido Nacional, conservador, opositor ao projeto de lei. Ao diário El Observador, forças políticas contrárias ao projeto também denunciaram o governo de fomentar o consumo da maconha, que, preveem, deve aumentar após a aprovação da lei. Também argumentaram que a maconha é a "porta de entrada" para outras drogas, contrariando um dos maiores argumentos do governo para apresentar o projeto. Em seus pronunciamentos sobre o tema, Mujica defendeu a estatização da droga para que os usuários deixem de se expor a outras substância mais prejudiciais, como o crack, quando foram em busca da erva nas bocas de fumo.

"Você pode controlar a produção e venda, o que vai ocasionar seus próprios problemas, que terão de ser abordados", disse o deputado Julio Bango, um aliado do governo em favor da legislação. "Ou você pode ter o que você tem agora, que é o caos." De acordo com dados apresentados pela Presidência do Uruguai, cerca de um terço da população carcerária do país está atrás das grades devido a crimes relacionados ao tráfico de drogas. "A venda de maconha por parte do Estado para os consumidores registrados é algo inédito em nível mundial", disse à AFP Ivana Obradovic, que liderou o estudo de políticas públicas e sua avaliação no Observatório Francês sobre Drogas e Toxicomanias (OFDT).

Os Estados Unidos também poderão assistir hoje à aparição de novidades legislativas no que se refere à maconha. O governador do estado de Illinois, Pat Quinn, deve promulgar a legalização do uso da substância para fins medicinais. Será a vigésima unidade da federação a flexibilizar o proibicionismo. A ratificação de lei ocorrerá em cerimônia na Universidade de Chicago e os partidários do programa, que terá caráter de teste durante quatro anos, afirmam que ele será o mais rígido entre os do mesmo tipo nos Estados Unidos. "Nossa meta sempre foi proporcionar uma melhora da qualidade de vida de algumas pessoas muito doentes em Illinois", declarou o incentivador da lei, o representante democrata Lou Lang, de Skokie, entrevistado pelo jornal The Chicago Tribune.

Até agora, há modelos de legislação nos quais se permite o cultivo pessoal com fins recreativos, como no caso dos estados do Colorado e de Washington, nos Estados Unidos, da Espanha – com clubes sociais de maconha – e da Holanda, conhecida desde 1976 por seus históricos coffee shops, lojas que vendem drogas.

Com informações da Efe e Opera Mundi


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